ACÓRDÃO N.º 329/2020
Processo n.º 1147/18
3.ª Secção
Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), em que é recorrente a Autoridade Tributária e Aduaneira e recorrida A., Lda., a primeira interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, com fundamento no artigo 70.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (Lei do Tribunal Constitucional, adiante designada «LTC»), da decisão daquele Tribunal de 19 de novembro de 2018 (de fls. 3 a 20), na parte em que se decidiu que «o segmento da regra que se extrai do art. 93º, nº 5, do CIEC [Código dos Impostos Especiais de Consumo], no sentido de impor ao proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público o pagamento de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado por omissão da violação de registo no sistema eletrónico de controlo ou de faturação em nome do titular de cartão, independentemente das vendas terem sido efetuadas a pessoas com direito ao benefício fiscal e mesmo que feitas a estas, é inconstitucional por violação do princípio da tipicidade dos tipos sancionatórios inerente ao princípio do Estado de Direito democrático, do princípio ne bis in idem e, ainda, do princípio da proibição do excesso» e consequentemente recusou a aplicação da norma (cf. fls. 17-verso e 18).
2. O requerimento de interposição de recurso tem o seguinte teor (cf. fls. 23-24):
«A Diretora-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, notificada do douto acórdão arbitral, por e-mail datado de 19/11/2018, proferido no processo que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa sob o nº 58/2018-T, o qual julgou parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado por A., Lda, NIPC ……, não se conformando, estando em tempo e tendo legitimidade, vem dele interpor
RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
ao abrigo do artigo 280.º, n.º 1, alínea a) da Constituição da República Portuguesa (CRP), dos artigos 70.º, n.º 1, alínea a), 72º, nº 1, alínea b), 75º, 75.º-A e 76.º, n.º 1 da Lei n.º 28/82, de 15.11 (LTC) e do artigo 25.º, n.º 1 do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 21.01 (RJAT), o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:
1. Previamente cumpre referir que o presente recurso é apresentado junto do tribunal recorrido, porquanto, não obstante o disposto no artigo 25.º, n.º 4 do RJAT, determina-se no artigo 76.º, n.º 1 da LTC (lei de valor reforçado nos termos do artigo 212.º, n.º 3 da CRP) que o recurso para o Tribunal Constitucional deve ser interposto perante o tribunal que tiver proferido a decisão recorrida, cabendo a este apreciar a admissão do mesmo (cf. diversos acórdãos do Tribunal Constitucional, vg, n.ºs 42/2014, nº 262/2015 e nº 112/2016).
2. Posto isto, visa-se através do presente recurso, interposto nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, a fiscalização concreta da constitucionalidade da norma contida no nº 3 do artigo 95.º do Código dos Impostos Especiais sobre o Consumo (CIEC).
3. A questão da inconstitucionalidade foi suscitada oficiosamente pelo meritíssimo árbitro nos autos em referência, e foi contraditada pela então Requerida, ora Recorrente, vindo a ser decidida pelo Tribunal Arbitral, que julgou parcialmente procedente o pedido de pronúncia arbitral, considerando que a liquidação "que respeita às vendas referentes ao gasóleo colorido e marcado registadas no sistema eletrónico de controlo em nome de titulares de cartão mas faturadas a "consumidor final", bem como as vendas faturadas a titulares de cartão sem que a Requerente tenha procedido ao registo dessas vendas no sistema eletrónico de controlo” se encontra ferida de ilegalidade, com fundamento em inconstitucionalidade.
4. Com efeito, o douto acórdão arbitral proferido julgou, designadamente:
“[...] nos casos subsumíveis ao art. 93.º, nº 5, do CIEC, em que apesar da violação de obrigações formais, a venda do gasóleo colorido e marcado seja feita a quem é titular do direito à sua aquisição, o efeito positivo da norma a favor da justiça fiscal, a existir, é manifestamente inferior aos efeitos negativos.
Na verdade, ainda que numa perspetiva de prevenção, o rigorismo da norma possa contribuir para a consecução do objetivo que lhe está subjacente, compelindo os operadores à observação das formalidades e nesse medida contribuir para um ambiente de rigor, propiciador a que a venda do produto em causa seja efetuada apenas aos titulares do beneficio fiscal, nestes casos em que o evento lesivo que se pretende evitar não ocorre, o efeito positivo da norma é manifestamente inferior ao efeito negativo, pois este traduz-se no pagamento duma importância na aparência a titulo de imposto mas que, na realidade, é uma sanção punitiva, consequentemente lesiva da justiça fiscal e dos princípios materiais da tributação, excedendo claramente a margem de livre conformação do legislador.
Acresce que a sanção contraordenacional, que prossegue idênticas finalidades, será já um elemento indutor da observação das formalidades, diminuindo, por isso, o efeito da norma em causa nesta vertente.
Conclui-se, por isso, numa ponderação dos efeitos positivos e negativos da norma, face ao sub-princípio da racionalidade ou proporcionalidade em sentido estrito, que os positivos são manifestamente inferiores aos positivos pelo que, não pode deixar de se considerar violado, também, o princípio constitucional da proibição do excesso.
[…] Assim, considera-se o segmento da regra que se extrai do art. 93.º, nº 5, do CIEC, no sentido de impor ao proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público o pagamento de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gas61eo colorido e marcado por omissão da violação de registo no sistema eletrónico de controlo ou de faturação em nome do titular de cartão, independentemente das vendas terem sido efetuadas a pessoas com direito ao benefício fiscal e mesmo que feitas a estas, é inconstitucional por violação do princípio da tipicidade dos tipos sancionatórios inerente ao princípio do Estado de Direito democrático, do princípio ne bis in idem e ainda do princípio da proibição do excesso pelo que, nesta vertente, não pode deixar de ser desaplicada, nos termos do artigo 204.º da Constituição da República Portuguesa" - cfr. págs. 29, 30 e 31.
5. Contudo, salvo melhor opinião, andou mal Tribunal ao decidir assim, porquanto o nº 3 do artigo 95.º do CIEC não ofende qualquer princípio constitucional, vg, o principio da tipicidade dos tipos sancionatórios, o princípio ne bis in idem ou o princípio da proporcionalidade.
6. Por fim, requer-se que seja ordenada a remessa para o Tribunal ad quem de cópia do processo arbitral, com a consequente dispensa da apresentação de cópia do processo arbitral, prevista no nº 4 do art. 25º do RJAT.
7. Nestes termos, conclui-se, peticionando-se a admissão do presente recurso contra o acórdão arbitral proferido nos autos em epígrafe nos termos sobreditos.
Termos em que, a Recorrente, por estar em tempo e ter legitimidade, requer a admissão do presente recurso, ope legis artigo 70.º, n.º 1, alínea a), artigo 72º, nº 1, alínea b), artigo 75.º, artigo 75.º-A e artigo 76.º, n.º 1, todos da LTC, e do artigo 25.º, n.º 1 do RJAT, com subida imediata do mesmo, com efeito suspensivo, seguindo-se os ulteriores termos até final.»
3. O recurso foi admitido pelo CAAD (cf. fl. 25- verso) e as partes foram notificadas para produzir alegações (cf. fl. 28).
3.1 A recorrente alegou, apresentado as seguintes conclusões (cf. fl. 40):
«D – CONCLUSÃO
D.1 – Da hipotética, mas inexistente violação do princípio constitucional da tipicidade de tipos sancionatórios, do princípio ne bis in idem e, ainda, do princípio da proibição do excesso
49. Resultando do acima exposto que o nº 5 do artº 93.º do CIEC não pode se entendido como uma norma sancionatória, mas sim como uma norma de incidência tributária que determina a reposição da tributação-regra perante a inobservância de requisitos legais (e materiais) essenciais de um regime de tributação privilegiado, não se vislumbra qualquer violação do princípio constitucional da tipicidade de tipos sancionatórios, do princípio ne bis in idem, nem do princípio da proibição do excesso.
50. Na verdade, as medidas implementadas procuram buscar um máximo de eficácia quanto ao objetivo a atingir, com o mínimo de lesão para outros interesses públicos, tratando-se, assim, de uma opção legítima, legal e constitucional do legislador tributário.
51. Concluindo e finalizando, daquilo que vem ante expendido é axiomático que toda a argumentação arvorada pela Requerente, ora recorrida, e, bem assim, na Decisão arbitral que ora se recorre, ao querer assacar uma qualquer desconformidade – inexistente – do segmento da norma do nº 5 do artº 93.º do CIEC com a Lei Fundamental, não tem qualquer arrimo.
Nestes termos, e nos mais de Direito que mui doutamente este Tribunal Constitucional suprirá, deve o presente recurso ser julgado procedente, nos termos ora alegados, com todas as consequências legais.»
3.2. A recorrida apresentou contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos (cf. fls. 73-75):
« CONCLUSÕES:
1. Todo o Gasóleo Colorido Marcado foi vendido a titulares do cartão de microcircuito.
2. Todo o Gasóleo Colorido Marcado foi vendido a titulares do benefício fiscal.
3. Todo o Gasóleo Colorido Marcado foi faturado, por vezes com indicação de NIF, por vezes a Consumidor Final.
4. Todos os abastecimentos de Gasóleo Colorido Marcado foram devidamente registados no TPA/POS, sendo de relevar os cerca de 370 litros que não aparecem como devidamente contabilizados no período de 4 anos.
5. O documento (ou requisito) ad substantiam é aquele que sem o qual o benefício não existe, porque não pode ser substituído por outro.
6. No caso concreto, o cartão microcircuito é um documento ad substantiam, pois sem ele não pode ser efetuada qualquer venda com redução de taxa, já o registo das vendas e a emissão da fatura nos termos referidos constituem documentos (ou requisitos) ad probationem, visto que pode ser substituído por outro meio de prova.
7. A prova documental junta pela Recorrida não veio impugnada pela Recorrente, podendo dela se extrair o seu integral teor probatório, nomeadamente no que toca à amostragem de abastecimentos e registos de venda de gasóleo colorido marcado no posto da Recorrida, em vários dias de vários anos diferentes.
8. A Recorrida não é devedora de qualquer imposto, podendo sim ser sujeita a procedimento contraordenacional por não cumprimento de formalidades, ao abrigo do RGIT.
9. Se assim não for, a AT corre o risco de violação do principio “ne bis in idem”, uma vez que com a sua atuação a Recorrida irá ser punida pela norma constante do artigo 109.º, n.º 2, alínea p), do RGIT, pelo que, considerando-se a norma prevista no artigo 93.º, n.º 5, do CIEC, como uma norma sancionatória, não poderemos ter duas sanções sobre o mesmo facto, sob pena de violação de um dos princípios basilares do nosso complexo normativo.
10. Em suma, apesar da Recorrida não ter cumprido alguns dos formalismos de controlo de benefício, não há dúvidas que todas, note-se, todas as vendas aqui em causa foram efetuadas a pessoas que na realidade preenchiam os requisitos para aplicação da taxa reduzida, pelo que, não poderá a AT liquidar qualquer imposto à Recorrida, pois sabe que nenhum imposto é devido, cumprindo assim o princípio da capacidade contributiva.
11. O disposto no artigo 93.º, n.º 5 do CIEC, na sua conjugação com o princípio da proibição do excesso, nomeadamente, no que diz respeito ao princípio da necessidade e da proporcionalidade (em sentido estrito), não tem conformidade Constitucional, não podendo ser aplicado no caso concreto.
Pelo exposto, nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser julgado improcedente o recurso e confirmada a decisão proferida em sede de 1.ª instância assim se fazendo JUSTIÇA!»
4. Tendo cessado funções como Conselheira do Tribunal Constitucional a primitiva titular do processo, foram os autos redistribuídos (cf. fl. 77).
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
5. Impõe-se, antes de mais, delimitar com maior precisão o objeto do presente recurso.
Na formulação adotada pelo tribunal recorrido, foi recusada a aplicação aos autos do artigo 93.º, n.º 5, do Código dos Impostos Especiais de Consumo (adiante designado «CIEC»), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, quando interpretado «no sentido de impor ao proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público o pagamento de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado por omissão da violação de registo no sistema eletrónico de controlo ou de faturação em nome do titular de cartão, independentemente das vendas terem sido efetuadas a pessoas com direito ao benefício fiscal e mesmo que feitas a estas (…).»
O artigo 93.º do CIEC, na redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, determinava o seguinte:
«Artigo 93.º
Taxas reduzidas
1 - São tributados com taxas reduzidas o gasóleo, o gasóleo de aquecimento e o petróleo coloridos e marcados com os aditivos definidos por portaria do membro do Governo responsável pela área das finanças.
2 - O petróleo colorido e marcado só pode ser utilizado no aquecimento, iluminação e nos usos previstos no n.º 3.
(…)
5 - O gasóleo colorido e marcado só pode ser adquirido pelos titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos referidos no n.º 3, sendo responsável pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades que venderem e que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo, bem como em relação às quantidades para as quais não sejam emitidas as correspondentes faturas em nome do titular de cartão.
6 - A venda, a aquisição ou o consumo dos produtos referidos no n.º 1 com violação do disposto nos n.os 2 a 5 estão sujeitos às sanções previstas no Regime Geral das Infrações Tributárias e em legislação especial.
(…)»
Confrontada esta disposição com a decisão recorrida, mostra-se possível delimitar de modo mais claro e preciso o objeto do recurso para o fazer coincidir com os critérios normativos cuja aplicação foi efetivamente recusada nos autos, de modo a assegurar a plena utilidade processual da decisão a proferir por este Tribunal.
Assim, deve desde já esclarecer-se que é possível discernir dois segmentos normativos retirados do n.º 5 do artigo 93.º do CIEC, cuja aplicação foi recusada pelo tribunal a quo, designadamente:
i) a interpretação segundo a qual pode ser exigido o pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, ao proprietário ou ao responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a portador de cartão eletrónico para as quais não sejam emitidas as correspondentes faturas em nome do titular do cartão; e
ii) a interpretação segundo a qual pode ser exigido o pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, ao proprietário ou ao responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a titular de cartão eletrónico que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo.
Quanto a esta segunda dimensão normativa, é de precisar que deve entender-se a referência feita pelo tribunal a quo a «pessoas com direito ao benefício fiscal» como referência feita a «titulares de cartão eletrónico» porquanto - atenta a factualidade dada como provada nos autos (cf. fls. 6-verso a 11-verso) - estava em causa a venda de quantidades para as quais foram emitidas faturas em nome de titulares de cartão eletrónico, que não foram registadas no sistema de controlo através desses cartões. Esta é, pois, a formulação que mais estritamente corresponde à ratio da decisão recorrida, em que se conclui que «[e]m consequência da desaplicação na norma em causa, nos segmentos identificados, a liquidação em causa carece de base legal, no que respeita às correções referentes ao gasóleo colorido e marcado cujas vendas foram registadas em nome de titulares de cartão mas faturadas a “consumidor final”, bem como as vendas faturadas a titulares de cartão sem que tenha a Requerente procedido ao registo dessas vendas no sistema eletrónico de controlo» (realce acrescentado – cf. o n.º 23 da decisão recorrida, a fls. 18).
Não obstante, ambas as dimensões normativas aqui identificadas foram objeto de apreciação conjunta na decisão recorrida, tendo o tribunal entendido, em síntese, que a exigência do pagamento do imposto ao proprietário ou responsável pelo posto «é uma consequência jurídica emergente deste incumprimento, independentemente da existência de qualquer prejuízo para a receita tributária» que «não se destina a repor a situação que existiria sem a prática do facto ilícito, nem a colocar o lesado numa situação equivalente à que ocorreria sem a violação legal, mas punitiva (…), como reação normativa ao incumprimento das formalidades previstas para a comercialização do produto.»
Como tal, tratar-se-ia de uma sanção «que extravasa o numerus clausus de tipos sancionatórios previstos na Constituição, violando, assim, o princípio do Estado de direito democrático» e que ofende o «princípio ne bis in idem uma vez que (…) a não observância das formalidades em causa já se encontra sujeita à punição como contraordenação, acrescendo que ambas as sanções protegem o mesmo bem jurídico.» E, por último, que atentas as finalidades que se visariam atingir com a punição da inobservância das formalidades prescritas no artigo 93.º, n.º 5, do CIEC, concluiu o tribunal que «numa ponderação dos efeitos positivos e negativos da norma, face ao sub-princípio da racionalidade ou proporcionalidade em sentido estrito (…) os positivos são manifestamente inferiores aos [negativos] pelo que, não pode deixar de se considerar violado, também, o princípio constitucional da proibição do excesso. (cf. fls. 14-verso a 18).
Vejamos.
6. A primeira das supra enunciadas dimensões normativas, cuja aplicação foi recusada no caso dos autos, é idêntica à norma recentemente apreciada por este Tribunal no Acórdão n.º 130/2020, em que foi julgado inconstitucional «por violação dos artigos 18.º, n.º 2 e 61.º, n.º 1, da Constituição, o segmento normativo do n.º 5 do artigo 93.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo, na redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, que determina ser responsável pelo pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a portador de cartão eletrónico», fundamentalmente, pelas seguintes razões (cf. II, 8 e segs.):
«8. Os impostos especiais de consumo são impostos indiretos harmonizados pelo direito da União Europeia que se destinam, quer a prosseguir objetivos extrafiscais, pela forma como influenciam o comportamento dos consumidores, quer a arrecadar receitas fiscais com custos de administração reduzidos. Entre esses tributos, destaca-se o Imposto sobre os Produtos Petrolíferos e Energéticos (referido adiante pela sigla «ISP»), cuja disciplina se encontra nos artigos 88.º e seguintes do CIEC, não apenas por ser uma fonte de receita fiscal significativa, como pela necessidade sentida pelo legislador de prevenir comportamentos ilegais e abusivos dos seus destinatários.
Ora, é através do regime de venda de gasóleo colorido e marcado que, como se afirma na Portaria n.º 361-A/2008, «são concretizadas parte substancial das isenções e das reduções de taxa do imposto sobre os produtos petrolíferos e energéticos (ISP)». Trata-se de um «produto de venda condicionada», que só pode ser vendido em postos de abastecimento autorizados «aos beneficiários de uma isenção ou redução de taxa de ISP que sejam titulares de cartões de microcircuito (…) através dos quais são registadas todas as transações de gasóleo colorido e marcado no sistema informático gerido pela Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS)» (artigos 3.º e 5.º da Portaria).
Ao Estado incumbe receber, manter e verificar esses registos (artigos 9.º e 15.º), bem como emitir os cartões de microcircuito a conceder aos beneficiários do regime fiscal privilegiado, nos termos previstos na Portaria n.º 117-A/2008. A emissão dos cartões é precedida de uma verificação pela Administração dos pressupostos de concessão do benefício, sendo certo que, nos termos do artigo 6.º da Portaria n.º 117-A/2008, os cartões «são pessoais e intransmissíveis, sendo os respetivos titulares responsáveis pela sua regular utilização». Os detentores dos cartões encontram-se ainda obrigados a comunicar qualquer situação de extravio ou anomalia, bem como a devolver o cartão no prazo de cinco dias úteis caso cessem os pressupostos de atribuição do benefício fiscal (artigo 8.º da Portaria).
Aos proprietários ou responsáveis pela exploração dos postos de abastecimento autorizados é imposto o dever de controlar o cumprimento dos requisitos de concessão dos benefícios fiscais no momento da aquisição, podendo estes ser responsabilizados «pelo pagamento do montante de imposto resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado». Na redação original, dada pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, o n.º 5 do artigo 93.º do CIEC associava esta consequência apenas à venda que não fosse efetuada a titular de cartão de microcircuito e registada no sistema informático próprio. A obrigação de emitir fatura em nome do titular do cartão já constava, todavia, do artigo 8.º da Portaria n.º 361-A/2008 (v., a propósito, o Acórdão n.º 176/2010), e foi introduzida, pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro, no n.º 5 do artigo 93.º do CIEC, como pressuposto da mesma responsabilidade. Por fim, a Lei n.º 114/2017, de 29 de dezembro, substituiu a exigência de emissão de fatura em nome do titular do cartão pela identificação fiscal do titular do cartão, mantendo inalterada a consequência do incumprimento dessa obrigação.
9. A venda de gasóleo colorido e marcado em violação do disposto no n.º 5 do artigo 93.º do CIEC pode ser considerada uma venda irregular, que integra o proprietário ou responsável pelo posto de abastecimento no elenco dos sujeitos passivos do ISP, por força do disposto na alínea h) do n.º 2 do artigo 4.º do Código (v. ainda o artigo 8.º, n.º 1 e as alíneas a), b), c) e f) do n.º 1 do artigo 9.º do CIEC).
Pressupõe-se que a venda irregular dos produtos sujeitos a impostos especiais sobre o consumo beneficia o consumidor e o vendedor (v. o Acórdão n.º 176/2010). Assim, o legislador deixa de visar apenas o ato de consumo, para atingir também o benefício extraído da venda irregular; nesses casos, são sujeitos passivos as pessoas singulares ou coletivas que vendam ou utilizem produtos sujeitos a imposto em condições irregulares. Deste modo, a exigência ao vendedor do pagamento dos impostos que seriam devidos pressupõe uma decisão administrativa sobre a regularidade da venda de gasóleo colorido e marcado: a Administração, verificando que não se encontram reunidos os pressupostos de comercialização desse produto, anula a concessão do benefício fiscal em causa e, em consequência, exige o pagamento do imposto à taxa normal.
Esta solução encontra-se em linha com a consequência geralmente associada à caducidade ou à cessação de efeitos da concessão de benefícios fiscais (v. o artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais) e não diverge, mutatis mutandis, da solução a adotar ao abrigo do regime geral do IVA, sempre que se verifica que o comerciante errou em prejuízo do Estado na aplicação de uma taxa reduzida. Também nestes casos se impõe ao vendedor ou prestador de serviços que proceda à retificação da fatura, liquidando o imposto que deveria ter sido pago a mais − e, sempre que possível, repercutindo-o no preço cobrado ao consumidor final, de modo a assegurar a neutralidade do imposto (nos termos dos artigos 29.º, n.º 7, 36.º, n.º 6, 37.º e 78.º do Código do IVA).
Não se trata, como é bom de ver, de uma sanção: o que sucede é que a diferença dos montantes que seriam devidos pela venda de gasóleo rodoviário comum é exigida ao proprietário ou responsável pelo posto de abastecimento, sem que se preveja (pelo menos expressamente) a possibilidade (ainda que meramente teórica) de efetivar a repercussão sobre o adquirente. Trata-se do ressarcimento do prejuízo fiscal para o erário público.
10. Ora, tal como resulta do regime legal, o principal meio de demonstração da titularidade do direito ao benefício é a apresentação do cartão de microcircuito, que em princípio é pessoal e intransmissível. A exigência da apresentação do cartão assegura que são registadas no sistema informático todas as transações em nome do titular do direito ao benefício.
A recorrida alega que, «[n]as situações das vendas faturadas a “consumidor final”, não é possível estabelecer uma relação inequívoca entre a fatura e o registo informático do cartão eletrónico, pois mesmo que coincidam exatamente todos os dados da fatura com os do registo do cartão – valores, dia e hora −, mesmo assim não há forma de assegurar que aquela venda foi feita ao titular daquele cartão…» (fls. 57).
Este argumento prova de mais.
A inclusão na fatura do nome do titular do cartão não constitui uma «forma de assegurar que aquela venda foi feita ao titular daquele cartão», nem sequer constitui uma forma mais segura ou eficaz do que a mera apresentação do cartão. De facto, quem utiliza o cartão de outrem para obter o benefício, bem pode fazer constar da fatura o nome do titular do cartão. Assinale-se que a lei não exige que o vendedor verifique a identidade nominal entre o comprador e o titular do cartão, nomeadamente através da apresentação de documento de identificação ou outro meio de prova concludente.
Por conseguinte, o n.º 5 do artigo 93.º do CIEC contempla duas hipóteses de irregularidade manifestamente distintas. Na hipótese de venda a comprador que não apresenta o cartão de microcircuito, inexiste a mínima evidência de o consumidor do gasóleo colorido e marcado ser titular do direito ao benefício fiscal; assim, pode presumir-se a utilização abusiva do regime da venda do gasóleo colorido e marcado, porque não há indício algum de o comprador ser beneficiário. Na hipótese de venda a quem apresenta o referido cartão, não sendo registado na fatura o nome do respetivo titular, inexiste a mínima evidência de o portador não ser titular do direito; assim, não pode presumir-se a utilização abusiva do regime, porque a apresentação do cartão constitui o indício legal de o comprador ser beneficiário.
Neste último caso, não se pode presumir terem sido violadas as condições de acesso ao benefício fiscal, porque a emissão da fatura em nome do titular do cartão não contribui para robustecer a inferência de titularidade do benefício fiscal relativamente ao ato de apresentação do cartão. Por outras palavras, a mera emissão da fatura não contribui para «assegurar que aquela venda foi feita ao titular daquele cartão», inviabilizando o juízo de que a omissão de tal formalidade é razão suficiente para se presumir a lesão do erário público. Se é certo que a apresentação do cartão está longe de ser uma forma infalível de verificação da titularidade do benefício fiscal, não se vislumbra de que modo é que a mera emissão da fatura em nome do titular do cartão reforça a convicção na regularidade da transação.
11. Não se contesta que a emissão da fatura constitui uma obrigação destinada a facilitar o posterior controlo administrativo da regularidade das transações sobre gasóleo colorido e marcado. O que se contesta é que a omissão dessa formalidade constitui por si própria justificação para se presumir um dano fiscal que se impõe ressarcir. A responsabilidade pelo pagamento da diferença revela-se, deste modo, não como uma obrigação fiscal, mas como a sanção cominada pelo incumprimento de uma obrigação acessória; a sua natureza é sancionatória.
Ao exigir ao proprietário ou responsável legal pela exploração dos postos de combustível, em consequência do incumprimento desta obrigação, que pague o imposto que seria devido se o gasóleo colorido e marcado fosse vendido a quem razoavelmente se presume não beneficiar do direito a adquiri-lo, o legislador impõe uma ablação patrimonial que agrava os custos suportados com o exercício da atividade económica.
A norma sindicada consubstancia, deste modo, uma restrição à liberdade de iniciativa económica consagrada no n.º 1 do artigo 61.º da Constituição, a respeito da qual pode ler-se no Acórdão n.º 545/2014:
«É consensual na doutrina e na jurisprudência constitucional que o direito de livre iniciativa económica, apesar de sistematicamente inserido no Título III da Parte I, respeitante aos direitos, deveres económicos, sociais e culturais, tem uma certa dimensão de liberdade radicada na dignidade da pessoa humana que justifica a sua qualificação como direito, liberdade e garantia de natureza análoga. Essa dimensão subjetiva, que é reflexo do direito geral de personalidade na atividade de produção e distribuição de bens e serviços, expresso nos princípios da autonomia da vontade e da liberdade contratual, ainda mais se acentuou com a revisão constitucional de 1997, quando aquele direito subjetivo foi autonomizado da garantia institucional da livre iniciativa económica prevista na alínea c) do artigo 80.º.
O reconhecimento de que certas vertentes do direito de iniciativa económica privada têm analogia com os direitos, liberdades e garantias enunciados no Titulo II implica que, por força da norma do artigo 17.º da CRP, lhes sejam aplicadas as disposições constitucionais que se referem a esses direitos.
(…) Neste preceito, a Constituição deixa ao legislador uma ampla margem de liberdade na delimitação e configuração do direito de livre iniciativa económica. O direito está consagrado como um direito de defesa contra o Estado, na medida em que pode ser exercido «livremente», mas esse exercício só se pode efetuar «nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral», abrindo-se assim espaço para uma maior ou menor limitação ou restrição legal do direito fundamental. (…)
As limitações ou restrições à liberdade de empresa, nela incluída a liberdade de concorrência, devem ser justificadas à luz do princípio da proibição do excesso (n.º 2 do artigo 18.º da CRP): respeitado o “núcleo essencial” da liberdade de empresa, qualquer restrição não pode ir além do estritamente adequado ou necessário.»
Aos particulares chamados a colaborar nas tarefas de administração, gestão e controlo do respeito pelas leis fiscais são impostos encargos que condicionam, mais ou menos extensamente, o exercício da sua atividade económica − pense-se, v.g., no dever de possuir sistemas informáticos de faturação sofisticados e seguros, e nas implicações que a imposição de tal dever tem para muitos operadores económicos com volumes reduzidos de negócio. São condicionamentos que visam a finalidade legítima de promover o interesse geral na cobrança célere e rigorosa dos impostos, mas que se encontram sujeitos, como toda a medida restritiva de direitos fundamentais, ao crivo da proibição do excesso (v., a este respeito, o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 2 de junho de 2016, C-355/14 Polihim-SS, disponível em eur-lex.europa.eu). Esta exigência de proporcionalidade incide, não apenas sobre a obrigação imposta, mas sobre a sanção cominada; a proibição do excesso respeita, não apenas ao facto de o particular se encontrar adstrito ao cumprimento de uma obrigação mais ou menos onerosa, mas ao peso maior ou menor das consequências associadas ao incumprimento. Na verdade, as duas coisas são incindíveis – duas faces de uma e mesma medida submetida a escrutínio.
12. O Acórdão n.º 123/2018 resumiu nos seguintes termos o abundante acervo jurisprudencial no domínio da proibição do excesso:
«O princípio da proibição do excesso incide sobre medidas legislativas não liminarmente interditadas pela Constituição, e que prosseguem finalidades legítimas através de meios restritivos: finalidades legítimas, no sentido em que não são constitucionalmente proscritas; meios restritivos, porque implicam a ablação de direitos ou interesses fundamentais. (…) Como reconhece, há muito, a jurisprudência constitucional (v., por todos, o Acórdão n.º 187/2001), o princípio da proibição do excesso analisa-se em três subprincípios: idoneidade [ou adequação], exigibilidade [ou necessidade] e proporcionalidade [em sentido estrito ou justa medida]. O subprincípio da idoneidade determina que o meio restritivo escolhido pelo legislador não pode ser inadequado ou inepto para atingir a finalidade a que se destina; caso contrário, admitir-se-ia um sacrifício frívolo de valor constitucional. O subprincípio da exigibilidade determina que o meio escolhido pelo legislador não pode ser mais restritivo do que o indispensável para atingir a finalidade a que se destina; caso contrário, admitir-se-ia um sacrifício desnecessário de valor constitucional. Finalmente, o subprincípio da proporcionalidade determina que os fins alcançados pela medida devem, tudo visto e ponderado, justificar o emprego do meio restritivo; o contrário seria admitir soluções legislativas que importem um sacrifício líquido de valor constitucional.»
Admitindo-se – como se admitiu − que a medida sob escrutínio tem carácter restritivo e visa fins legítimos, impõe-se questionar se a opção legislativa é idónea, exigível e proporcionada.
A resposta não pode deixar de ser negativa.
Embora a exigência de identificação do titular dos adquirentes na fatura não seja evidentemente adequada a prevenir, por si só, a utilização irregular de gasóleo colorido e marcado, concede-se que seja útil para sancionar e reprimir os comportamentos abusivos, na medida em que facilita o controlo pelas autoridades dos consumos efetuados pelos titulares dos cartões. Em consequência, não pode considerar-se desadequado o sancionamento do incumprimento da obrigação.
Acontece que o incumprimento é sancionado, nos termos do RGIT, com a aplicação de uma coima que pode atingir um valor expressivo (a fixar entre os 250€ e os 165000€). Mostra-se por isso desnecessária a exigência adicional de suportar os impostos que seriam devidos se fosse efetuada venda a quem não era titular do direito ao referido benefício fiscal.
Nesse exato sentido argumentou o Tribunal de Justiça da União Europeia, no seu Acórdão de 2 de junho de 2016, C-418/14 ROZ‑ŚWIT (disponível em eur-lex.europa.eu), que respeita a matéria com inegável parentesco com a do presente recurso, desde logo por se tratar da proporcionalidade de medidas de combate à fraude e evasão fiscal em domínio de impostos especiais de consumo harmonizado pelo direito da União Europeia.
Nesse aresto, o Tribunal de Justiça foi confrontado com a questão de saber se contraria o princípio da proporcionalidade «uma regulamentação nacional nos termos da qual, por um lado, os vendedores de combustível são obrigados a submeter, no prazo estabelecido, um extrato mensal das declarações dos compradores, segundo as quais os produtos comprados se destinam a aquecimento, e, por outro, na falta de entrega de tal extrato no prazo fixado, é aplicável ao combustível vendido a taxa do imposto especial de consumo prevista para os carburantes, mesmo que se tenha constatado que não há dúvida de que esse produto se destinava a aquecimento.»
O Tribunal começou por afirmar que, «constitui um instrumento de controlo que tem por objetivo a prevenção da evasão e da fraude fiscais a obrigação de entregar, junto das autoridades competentes, um extrato das declarações dos compradores», concluindo que a imposição de tal obrigação «não reveste um caráter manifestamente desproporcionado». Já no que diz respeito à consequência associada ao incumprimento da obrigação, entendeu que, «a aplicação automática da taxa de imposto especial de consumo prevista para os carburantes em caso de incumprimento da obrigação de entregar um extrato desse tipo viola o princípio da proporcionalidade.» Com efeito, «o facto de aplicar aos combustíveis de aquecimento em causa no processo principal a taxa de imposto especial de consumo prevista para os carburantes em razão da violação da obrigação, imposta pelo direito nacional, de apresentar um extrato das declarações dos compradores nos prazos fixados, quando se constatou que não havia dúvida de que esses produtos se destinavam a aquecimento, vai além do que é necessário para prevenir a evasão e a fraude fiscais.» O Tribunal de Justiça esclareceu ainda que, «nada impede um Estado‑Membro de prever a aplicação de uma coima pela violação de uma obrigação como a que consiste na entrega às autoridades competentes de um extrato das declarações dos compradores do combustível de aquecimento vendido.» O que o princípio da proporcionalidade proscreve é que seja aplicada a taxa normal de imposto especial sobre o consumo a situações em que nada «indica que essas vendas foram realizadas com o objetivo de beneficiar de modo fraudulento da taxa de imposto especial de consumo preferencial atribuída aos combustíveis destinados a aquecimento».
Estas considerações aderem perfeitamente ao problema de constitucionalidade que se coloca nos autos. A obrigação de o vendedor pagar a diferença entre a taxa de imposto normal e a aplicável ao gasóleo colorido e marcado, nos casos em que não é emitida fatura em nome do titular do cartão, «vai além do necessário para prevenir a fraude e evasão fiscal». A função sancionatória é plenamente assegurada no plano contraordenacional, perfilando-se a sanção adicional imposta pela norma sindicada – com a estrutura de uma norma de incidência fiscal, ainda que servindo uma finalidade sancionatória − como um corpo estranho e funcionalmente redundante.
A medida seria razoável – porventura até indispensável − caso se pudesse presumir a utilização abusiva do regime da venda do gasóleo colorido e marcado nos casos em que é registada a operação no sistema eletrónico de controlo, não sendo emitida fatura em nome do titular do cartão. Porém, essa presunção – como vimos – não tem justificação alguma, razão pela qual a responsabilidade pelo pagamento da diferença entre o imposto devido com e sem benefício fiscal não tem natureza propriamente tributária. Nada no mero facto de não ter sido emitida a fatura em nome do titular do cartão, sendo apresentado o cartão e não sendo exigida demonstração de identidade, «indica que essas vendas foram realizadas com o objetivo de beneficiar de modo fraudulento da taxa de imposto» aplicável ao gasóleo colorido e marcado.
Assim, é de concluir que a norma sindicada reprova no teste da necessidade, consubstanciando uma restrição excessiva (artigo 18.º, n.º 2) da liberdade de iniciativa económica, consagrada no artigo 61.º, n.º 1, da Constituição.»
Inexistindo qualquer especificidade que motive a alteração desta posição, e ainda que o juízo de inconstitucionalidade proferido por este Tribunal encontre respaldo em argumentos significativamente distintos dos mobilizados pelo tribunal a quo, entende-se nada haver a aduzir aos argumentos expostos no Acórdão n.º 130/2020, relativos à primeira das dimensões normativas em apreço no âmbito do presente recurso.
7. Deste aresto é possível ainda extrair algumas «coordenadas» fundamentais para a apreciação da inconstitucionalidade da segunda das dimensões normativas supramencionadas, ou seja, a que se refere à interpretação do artigo 93.º, n.º 5, do CIEC no sentido de poder ser exigido o pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, ao proprietário ou ao responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a titular de cartão eletrónico que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo.
Em primeiro lugar, importa reter que o n.º 5 do artigo 93.º do CIEC pode ser configurado como uma norma de incidência tributária quando, citando a recorrente, «determina a reposição da tributação-regra perante a inobservância de requisitos legais (e materiais) essenciais do regime de tributação privilegiado do abastecimento e comercialização de gasóleo colorido e marcado, previstos na lei com vista a assegurar que esse combustível se destina às finalidades que legalmente justificam a redução da taxa.» (cf. fl. 39).
Em segundo lugar, que não podem ser considerados requisitos legais (e materiais) essenciais, para este efeito, todas as condições de venda de gasóleo colorido e marcado que a lei imponha, apenas pelo facto de as impor e independentemente da função que desempenham ou das finalidades que através delas são prosseguidas. Na verdade, não estando em causa a inobservância de «requisitos legais (e materiais) essenciais do regime de tributação privilegiado», adequados a «assegurar que esse combustível se destina às finalidades que legalmente justificam a redução da taxa», perde sustentação a inferência de que o pagamento do imposto à taxa normal seria devido e, consequentemente, a asserção de que a exigência dirigida ao proprietário ou responsável pelo posto de abastecimento é ainda assimilável à exigência do cumprimento da obrigação principal da relação jurídica tributária. Por esse motivo, entendeu este Tribunal no Acórdão supracitado que a norma aí sindicada, «com a estrutura de uma norma de incidência fiscal, ainda que servindo uma finalidade sancionatória», se perfilaria como «um corpo estranho e funcionalmente redundante» (cf. II, 12) face ao regime contraordenacional vigente.
Em terceiro lugar, importa realçar que a exigência do pagamento do imposto que seria devido – consequente da inobservância das condições estabelecidas por cada Estado-Membro para beneficiar da isenção ou redução da taxa aplicável aos produtos petrolíferos – pode considerar-se incompatível com as exigências que decorrem do princípio da proporcionalidade, também à luz do Direito da União Europeia, sempre que nenhuma circunstância «possa deixar presumir que as operações comerciais em causa (…) tenham sido realizadas com o intuito de beneficiar fraudulenta ou abusivamente» do regime privilegiado de tributação aplicável (v. os Acórdãos do Tribunal de Justiça da União Europeia, ambos de 2 de junho de 2016, C-355/14 Polihim-SS, n.º 60, e C-418/14 ROZ‑ŚWIT, n.º 36).
É em face destas orientações que ora cumpre apreciar a exigência relativa à utilização do cartão eletrónico para registo das aquisições de gasóleo colorido e marcado no sistema eletrónico de controlo.
8. Recorde-se, antes de mais, que nos termos do n.º 5 do artigo 93.º do CIEC, «o gasóleo colorido e marcado só pode ser adquirido pelos titulares do cartão eletrónico instituído para efeitos de controlo da sua afetação aos destinos referidos no n.º 3». Com efeito, estamos perante um benefício fiscal que é atribuído em função do uso que é dado ao combustível, pelo que só «[p]odem beneficiar de isenção ou da aplicação de uma taxa reduzida do imposto as pessoas singulares ou colectivas que, comprovadamente, utilizem produtos petrolíferos e energéticos sujeitos a ISP nas actividades ou nos equipamentos previstos» no n.º 3 do artigo 93.º do CIEC (cf. o artigo 2.º da Portaria n.º 117-A/2008, de 8 de fevereiro, bem como o artigo 2.º da Portaria.º 50/2020, de 27 de fevereiro, que a revogou). Assim, só podem ser titulares do direito ao benefício fiscal que o gasóleo colorido e marcado representa aqueles que, perante as entidades administrativas competentes, demonstrem deter os equipamentos autorizados a consumir gasóleo adquirido a taxa reduzida e reunir os demais pressupostos de reconhecimento do benefício fiscal que antecede a emissão do cartão eletrónico.
Todavia, em bom rigor, a Administração Tributária e Aduaneira não dispõe de meios para controlar, in loco e de modo efetivo, se o gasóleo colorido e marcado é usado nos equipamentos ou nas atividades visadas pela concessão deste benefício, já que este produto é comercializado por empresas petrolíferas com as quais é contratada a distribuição (cf. o artigo 2.º da Portaria n.º 361-A/2008, de 12 de maio). É certo que o recurso ao marcador fiscal deverá permitir, em ações de fiscalização e mediante procedimentos próprios (cf. a Portaria n.º 1509/2002, de 17 de dezembro), identificar situações de abuso e punir os infratores. Mas, se todo o controlo fosse confiado aos proprietários e responsáveis pelos postos de abastecimento, ou remetido apenas para essas ações pontuais de fiscalização, ficaria muito debilitada a prevenção da utilização abusiva deste produto e do prejuízo fiscal daí adveniente.
9. É neste contexto que a instituição do cartão eletrónico, associado ao registo das transações através dele efetuadas, assume protagonismo como principal meio de controlo administrativo da regularidade da atribuição deste benefício. Não só garante que o benefício é concedido mediante um procedimento administrativo tendente a verificar se o candidato ao benefício detém, em abstrato, as condições para beneficiar do consumo de gasóleo a taxa reduzida; como permite, a posteriori e em concreto, ir confrontando os consumos efetivamente registados com os consumos normais ou estimados associados aos equipamentos detidos ou às atividades exercidas, tal como declarados pelos beneficiários reconhecidos.
A possibilidade de beneficiar de uma redução da taxa do imposto depende, por isso e há muito, da utilização do cartão de microcircuito ou eletrónico em terminais próprios, designados «point of sale» («POS») ou terminais de pagamento automático («TPA»). Ainda na vigência do Decreto-Lei n.º 124/94, de 18 de maio, que estabelecia limites quantitativos à utilização do gasóleo agrícola (os designados plafonds - cf. o n.º 3 do artigo 1.º do diploma), este sistema foi instituído para assegurar o cumprimento daqueles limites nas vendas aos beneficiários. Sendo o gasóleo agrícola indistinguível do combustível para uso rodoviário comum, o registo no sistema de controlo era fundamental, cabendo aos responsáveis pelos postos de abastecimento assumir o pagamento do imposto à taxa normal pelas quantidades que vendessem sem proceder ao devido registo.
Com a transposição da Diretiva n.º 95/60/CE, do Conselho, de 27 de novembro, o gasóleo colorido e marcado começou a ser comercializado com isenção ou redução de taxa do imposto aplicável, tendo o n.º 3 do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 124/94 (alterado pelo Decreto-Lei n.º 15/97, de 17 de janeiro) passado a estabelecer regras apenas sobre os veículos e equipamentos em que este poderia ser utilizado (v., também, a Portaria n.º 224/97, de 2 de abril, que definiu as regras de transição do sistema de plafonds associado ao gasóleo agrícola, em vigor até 30 setembro de 1997). O Decreto-Lei n.º 15/97 manteve, não obstante, a exigência de utilização do cartão para registo no sistema de controlo, estipulando que o gasóleo colorido e marcado só poderia ser vendido aos «titulares de cartões inteligentes concedidos pelo Ministério da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas». A Portaria n.º 234/97, de 4 de abril, explicitou esta exigência (cf. o artigo 7.º - que veio a ser declarado inconstitucional pelo Acórdão n.º 176/2010), a qual foi posteriormente estendida ao controlo dos benefícios fiscais aplicáveis ao setor marítimo e fluvial (pela Portaria n.º 248/97, de 14 de abril).
Já na vigência do Código dos Impostos Especiais de Consumo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 566/99, de 22 de dezembro, a exigência da utilização de cartão de microcircuito para registo das transações passou a constar do n.º 5 do artigo 74.º do Código com a aprovação da Lei n.º 53-A/2006, de 29 de dezembro – a qual é, por sua vez, idêntica à redação do n.º 5 do artigo 93.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, na sua versão original. Por último, a Portaria n.º 117-A/2008, de 8 de fevereiro (entretanto revogada pela Portaria n.º 50/2020, de 27 de fevereiro) e a Portaria n.º 361-A/2008, de 12 de maio, vieram atualizar as regras relativas à utilização do cartão, sem se desviar dos seus propósitos originais.
Com efeito, o cartão eletrónico continua a ter as características de um cartão multibanco, emitido pela Sociedade Interbancária de Serviços (SIBS) por impulso da Direção-Geral da Agricultura e do Desenvolvimento Rural («DGADR»), com vista à sua utilização nos terminais «POS/TPA», sendo o cartão «pessoal e intransmissível» (artigo 6.º da Portaria n.º 117-A/2008). Só os detentores desses terminais é que estão autorizados a vender gasóleo colorido e marcado (v.. os artigo 3.º e 4.º da Portaria n.º 361-A/2008), devendo as vendas ser «imediatamente registadas nos terminais POS no momento em que ocorram» (artigo 6.º da mesma Portaria), mesmo quando o abastecimento deva ser feito em lugar diferente do posto (devendo recorrer-se, nesse caso, a um terminal «POS» móvel – cf. o artigo 7.º). Note-se, ainda, que estes terminais devem acusar quaisquer erros ou anomalias associados ao cartão (tais como erros na chave de autenticação introduzida pelo titular ou o decurso do prazo de validade do cartão). E a cada cartão pode continuar associado um plafond anual, calculado com base em estimativas de consumo (cf., v.g., o artigo 65.º, alínea d), da Portaria n.º 117-A/2008), que, embora tendo natureza meramente indicativa, permite detetar situações de consumo anormal, viabilizando uma ação inspetiva mais eficaz.
Para efeitos de controlo dos consumos, o registo informático das transações através dos terminais «TPA/POS», gerido pela SIBS, deve ser regularmente enviado à DGADR, entidade competente pela gestão da base de dados de gasóleo colorido e marcado e pela emissão, suspensão ou cancelamento de cartões, à qual devem ser também prontamente reportados todos os erros e anomalias detetados na utilização dos terminais (cf. os artigos 9.º e 12.º da Portaria n.º 361-A/2008). Por sua vez, cabe às empresas petrolíferas que distribuem o gasóleo colorido e marcado remeter à Direcção-Geral das Alfândegas e dos Impostos Especiais sobre o Consumo (adiante «DGAIEC») a «listagem em ficheiro informático com as vendas ou fornecimentos de gasóleo colorido e marcado aos postos de abastecimento ou a distribuidores, efectuados no mês anterior» (artigos 13.º e 14.º da mesma Portaria n.º 361-A/2008) com a devida identificação dos terminais «TPA/POS» utilizados – registo este que pode ser confrontado com as informações constantes da base de dados gerida pela DGADR (cf. o artigo 15.º da mesma Portaria).
Trata-se, em suma, de um sistema complexo, que assegura uma possibilidade de controlo a montante da regularidade da utilização do gasóleo colorido e marcado e, do mesmo passo, permite dotar a Administração Tributária e Aduaneira de vários dados – que incluem até a data e hora do consumo – indispensáveis para detetar situações anómalas e agir com vista à fiscalização e repressão oportunas da aquisição abusiva do gasóleo colorido e marcado.
10. Atenta a configuração deste sistema, entendeu este Tribunal, no Acórdão n.º 130/2020, que a aquisição de gasóleo colorido e marcado mediante a utilização de cartão eletrónico – embora não sendo um meio infalível de demonstração da titularidade do direito ao benefício fiscal – é «o principal meio de demonstração da titularidade do direito ao benefício» que «assegura que são registadas no sistema informático todas as transações em nome do titular do direito ao benefício». Foi também pressupondo a aplicação destes meios eletrónicos, que constituem afinal a «trave mestra» do sistema português de fiscalização da regular aquisição e venda de gasóleo colorido e marcado, que se concluiu que a exigência de emissão de fatura em nome do titular do cartão em nada robusteceria a «presunção de regularidade» associada à utilização do cartão eletrónico.
Porém, tal como resulta do exposto, a relevância desse meio de controlo não prescinde, nem pode prescindir, da efetiva utilização do cartão nos terminais próprios. Para fornecer o principal indício de titularidade do direito ao benefício não basta fazer o nome do titular do cartão constar de uma fatura: é preciso apresentar o cartão eletrónico e utilizá-lo no momento da aquisição, para que esta conste do registo no sistema eletrónico de controlo. Sem essa utilização, possibilita-se a venda sem a detenção do devido terminal «TPA/POS»; viabiliza-se a aquisição de gasóleo colorido e marcado por titulares de cartões, sem que seja exigida a devida autenticação e mesmo que os cartões não se encontrem válidos ou ativos; e inviabiliza-se toda e qualquer fiscalização dos consumos efetivamente realizados, que são o indício mais relevante para efeitos do controlo administrativo possível sobre os usos ou atividades, associados ao cartão eletrónico, que justificam a redução da taxa.
É, pois, forçoso concluir que estamos perante um – senão o mais relevante no ordenamento português – dos requisitos essenciais de concessão deste benefício fiscal, cuja inobservância fundamenta a reposição do regime regra de tributação e consequentemente a imposição ao proprietário ou responsável pelo posto de abastecimento de cumprir a obrigação principal da relação tributária, prestando a diferença entre os impostos que seriam devidos pela aquisição de gasóleo comum e os impostos efetivamente pagos pelo gasóleo colorido e marcado.
Como tal, não é possível acompanhar o tribunal a quo quando considera que a norma em apreço contende com o princípio ne bis in idem ou cria um tipo sancionatório extravagante e não admitido pela Constituição. E ainda que pudesse qualificar-se essa exigência, quando dirigida ao proprietário ou responsável pelo posto de abastecimento, como uma medida restritiva de direitos fundamentais, sempre seria de reconhecer que esta é adequada e necessária para assegurar a obediência aos pressupostos essenciais de regularidade da venda deste produto sem exceder a medida do razoável, porquanto a ausência de registo das transações comerciais no sistema eletrónico de controlo, que viabiliza a fiscalização de um dos aspetos fundamentais do regime de concessão do benefício, permite presumir que as operações comerciais em causa foram realizadas com o intuito de beneficiar fraudulenta ou abusivamente da aquisição e da venda de gasóleo colorido e marcado.
Em face do exposto, conclui-se que não há fundamento para julgar inconstitucional o n.º 5 do artigo 93.º do CIEC, na interpretação segundo a qual pode ser exigido o pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, ao proprietário ou ao responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a titular de cartão eletrónico que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo.
III – Decisão
11. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se:
a) Julgar inconstitucional, por violação dos artigos 18.º, n.º 2 e 61.º, n.º 1, da Constituição, o segmento normativo do n.º 5 do artigo 93.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, na redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro), que determina ser responsável pelo pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, o proprietário ou o responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a portador de cartão eletrónico para as quais não sejam emitidas as correspondentes faturas em nome do titular do cartão;
b) Não julgar inconstitucional o n.º 5 do artigo 93.º do Código dos Impostos Especiais de Consumo (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 73/2010, de 21 de junho, na redação dada pela Lei n.º 82-B/2014, de 31 de dezembro) na interpretação segundo a qual pode ser exigido o pagamento do montante de imposto, resultante da diferença entre o nível de tributação aplicável ao gasóleo rodoviário e a taxa aplicável ao gasóleo colorido e marcado, ao proprietário ou ao responsável legal pela exploração dos postos autorizados para a venda ao público, em relação às quantidades vendidas a titular de cartão eletrónico que não fiquem devidamente registadas no sistema eletrónico de controlo;
e, em consequência,
c) Conceder parcial provimento ao recurso, determinando a reforma da decisão recorrida em conformidade com o precedente juízo de não inconstitucionalidade.
Sem custas, por não serem legalmente devidas (artigo 84.º da LTC).
Lisboa, 25 de junho de 2020 – Maria José Rangel de Mesquita – Gonçalo de Almeida Ribeiro – Joana Fernandes Costa (Vencida quanto à alínea a) do dispositivo nos termos da declaração aposta ao Acórdão n.º 130/2020) João Pedro Caupers
Atesto o voto do Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro, que ficou vencido quanto à alínea a) da Decisão nos termos da Declaração aposta ao Acórdão n.º 130/2020, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março (aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de maio).
(Maria José Rangel de Mesquita)