TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

421 acórdão n.º 90/19 53. Em definitivo, se de acordo com o expressamente enunciado pelo legislador, o bem jurídico prote- gido no crime de corrupção ativa é violado com a promessa de entrega da vantagem indevida e não necessa- riamente com a entrega dessa vantagem, o princípio da legalidade criminal, previsto no artigo 29.º, n. os 1 e 3, da Constituição, encontra-se irremediavelmente comprometido pela adoção da interpretação normativa, desfavorável ao arguido, segundo a qual o início do prazo de prescrição do crime de corrupção ativa deve ser retardado para o momento da entrega da coisa indevida, em detrimento do início da sua contagem com a promessa de entrega. III – Decisão Nestes termos, decide-se: (i) Julgar inconstitucional, por violação do princípio da legalidade criminal, os artigos 119.º, n.º 1, e 374.º, n.º 1, ambos do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, quando interpretados no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem. e, consequentemente, (ii) Dar provimento ao recurso. Lisboa, 6 de fevereiro de 2019. – Claudio Monteiro – José Teles Pereira – Maria de Fátima Mata-Mouros (vencida nos termos da declaração junta) – João Pedro Caupers. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida. 1. O presente Acórdão julga «inconstitucional, por violação do princípio da legalidade criminal, os arti- gos 119.º, n.º 1, e 374.º, n.º 1, ambos do Código Penal, na versão posterior à entrada em vigor do Decreto- -Lei n.º 48/95, de 15 de março, quando interpretados no sentido de que o prazo de prescrição do crime de corrupção ativa é contado a partir da data em que ocorra a entrega de uma dada vantagem ao funcionário, e não a partir da data em que ocorra a promessa dessa vantagem». Discordo desta decisão, desde logo, por ela representar uma inflexão do entendimento de há muito pacífico na nossa jurisprudência, segundo o qual não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar a correção de eventuais interpretações, tidas por erróneas, efetuadas pelos tribunais comuns, com fundamento em violação do princípio da legalidade. Discordo ainda da decisão porque através dela o Tribunal Constitucional exorbitou a sua jurisdição, constitucionalmente definida. 2. Vejamos o caminho percorrido na fundamentação do Acórdão: Depois de «contextualizar a regulação normativa do crime de corrupção ativa no Código Penal portu- guês», sinalizando a opção legislativa «assente na alternatividade da conduta penalmente censurável, por se ter criminalizado (…) quer a efetiva transferência da vantagem, quer a promessa dessa vantagem» (ponto 41 do Acórdão), e de sublinhar que «o elemento literal do tipo previsto no artigo 374.º, n.º 1, do Código Penal, assenta na previsão de duas proposições ligadas por uma conjunção disjuntiva, exprimindo, nesta exata medida, uma dupla hipótese de preenchimento (der ou prometer)» (ponto 42), o Acórdão enfatiza a clareza e precisão do enunciado normativo para concluir que «[b]asta a promessa para que crime seja dado por consumado, independentemente de a ela se seguir a entrega efetiva da coisa prometida (…)» (ponto 43).

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