Comunicado Acórdão n.º 1133/2025 - Lei da Nacionalidade
Processo n.º 1383/2025
Acórdão n.º 1133/2025
Relatora: Conselheira Dora Lucas Neto
O Plenário do Tribunal Constitucional decidiu hoje pronunciar-se pela inconstitucionalidade de quatro normas constantes do Decreto da Assembleia da República n.º 17/XVII, que altera a Lei da Nacionalidade Portuguesa, em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade.
Relativamente a três dessas normas, o Tribunal pronunciou-se por unanimidade no sentido da sua inconstitucionalidade. São elas as seguintes:
- A norma que o decreto visa introduzir no artigo 6.º, n.º 1, alínea f), da Lei da Nacionalidade, que impede, por efeito automático da lei, o acesso à cidadania portuguesa por quem haja sido condenado pela prática de crime previsto na legislação portuguesa, com pena igual ou superior a 2 (dois) anos de prisão.
Ao impedir a possibilidade de aferir em que medida uma tal condenação põe em causa o específico vínculo de integração na comunidade portuguesa, o Tribunal Constitucional decidiu, em linha com a jurisprudência anterior reiterada e uniforme, estarem violados os artigos 26.º, n.º 1, em conjugação com o 18.º, n.º 2 e 30.º, n.º 4, todos da Constituição (restrição desproporcional do direito fundamental de acesso à cidadania e violação, também, da norma constitucional que estatui «nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos»).
- A norma que o decreto visa introduzir no artigo 12.º-B, n.º 3, da Lei da Nacionalidade, que estabelece que a consolidação da nacionalidade não opera, quanto a titulares de boa-fé, nas situações de manifesta fraude.
O Tribunal Constitucional decidiu que, ao não oferecer qualquer critério de distinção entre as situações de obtenção por fraude (em que já opera a consolidação da nacionalidade) e de fraude manifesta (em que a consolidação deixa de operar), ocorre violação do princípio da determinabilidade e da reserva absoluta de lei parlamentar, que se extrai da conjugação do artigo 2.º com a alínea f) do n.º 1 do artigo 164.º da Constituição;
- A norma dos n.ºs 3 e 4 do artigo 7.º do Decreto, segundo a qual o deferimento dos pedidos de atribuição ou aquisição da nacionalidade pendentes à data da entrada em vigor das alterações à Lei da Nacionalidade depende do preenchimento dos requisitos previstos à data da apresentação do pedido e não, como sucede no regime atualmente em vigor, à data da decisão do pedido.
O Tribunal Constitucional concluiu ocorrer violação do princípio da proteção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito consagrado no artigo 2.º da Constituição, por afrontar as legítimas expectativas dos destinatários com procedimentos pendentes na aplicabilidade do regime existente na data da apresentação do pedido.
Por maioria, com um voto de vencido, decidiu o Tribunal no seguinte sentido:
- A norma que o decreto visa introduzir no artigo 9.º, n.º 1, alínea a), segunda parte, da Lei da Nacionalidade, que determina a possibilidade de cancelamento do registo da nacionalidade pela verificação de «comportamentos que, de forma concludente e ostensiva, rejeitem a adesão à comunidade nacional, suas instituições representativas e símbolos nacionais».
O Tribunal Constitucional decidiu que a inexistência de qualquer indicação sobre a tipologia ou padrão de comportamentos que possam ser suscetíveis de preencher aquele conceito impossibilita que os cidadãos possam antecipar, com um mínimo de segurança, quais os tipos de ações cuja prática pode ser motivo bastante para que, contra si, seja intentada uma ação de oposição à aquisição da nacionalidade portuguesa. Viola-se, assim, o princípio da determinabilidade e da reserva absoluta de lei parlamentar, que se extrai da conjugação do artigo 2.º com a alínea f) do n.º 1 do artigo 164.º da Constituição.
O Tribunal Constitucional decidiu não se pronunciar pela inconstitucionalidade das demais normas que integram o pedido.
Vêr Acórdão n.º 1133/25.