ACÓRDÃO N.º 19/2021
Processo n.º 1080/2020
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro
Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério Público e B., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele Tribunal, de 13 de novembro de 2019.
2. Pela Decisão Sumária n.º 729/2020, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:
«5. O recorrente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional a título «subsidiário» da reclamação contra a decisão de não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Não é inteiramente claro se aquele recurso – fundado nas alíneas b e f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – é interposto do despacho de não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, proferido em 2 de novembro de 2020, ou do despacho da Vice-Presidente desse Tribunal que indefere a reclamação apresentada contra aquele.
Não se justifica, em todo o caso, convidar o recorrente a esclarecer a dúvida, porque é certo que, em qualquer dos casos, o recurso é inadmissível. É inadmissível se for interposto da decisão de 2 de novembro de 2020, na medida em que, como dispõe o n.º 2 do artigo 70.º da LTC, «os recursos previstos nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de decisões que não admitam recurso ordinário (…)», sendo evidente que a decisão em causa não é definitiva, visto ter sido objeto de reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça. E é inadmissível se for interposto da decisão proferida pela Vice-Presidente daquele Tribunal, em 26 de novembro de 2020, pela meridiana razão de que tal decisão ainda não tinha sido proferida no momento em que o recurso foi interposto, sendo por isso manifestamente intempestiva. Com efeito, o recurso para o Tribunal Constitucional é interposto de decisões definitivas dos demais tribunais, não de decisões hipotéticas; o tempo próprio para se recorrer inicia-se após ter sido proferida a decisão desfavorável, não quando esta constitui apenas uma hipótese.
6. Vale a pena referir ainda que o objeto do recurso é inidóneo.
Segundo o disposto nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e nas diversas alíneas do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, o recurso para o Tribunal Constitucional tem sempre normas por objeto, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).
O recorrente impugna a «interpretação normativa perfilhada pelo Tribunal “a quo” no despacho aqui sob reclamação», alegando que «produz um resultado avesso às garantias de defesa e de recurso consagradas no artigo 32.º da CRP». Mas não chega a enunciar nenhuma norma. E ao referir no ponto 11 do seu requerimento sincrético – de reclamação do despacho de não admissão e de recurso para o Tribunal Constitucional − que a decisão viola o artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do Código de Processo Penal e determinados parâmetros constitucionais – os artigos 20.º, 32.º e 205.º da Constituição −, evidencia o propósito de sindicar, não uma norma legal, mas a própria decisão judicial de não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Ora, a legalidade e constitucionalidade desta decisão é matéria que extravasa os poderes cognitivos da jurisdição constitucional, cujos poderes de controlo incidem – como se referiu − exclusivamente sobre normas. E isto vale, quer para o recurso interposto ao abrigo da alínea b), quer para o fundado na alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Conclui-se, assim, que o recurso é inadmissível.»
3. De tal decisão vem agora o recorrente reclamar para a conferência, apresentando as seguintes razões:
«C., recorrente nos autos acima identificados, não se conformando com a douta DECISÃO SUMARIA N.º 729/2020, proferida por V. Ex.a, Ex.mo Juiz Conselheiro Relator, Dr. Gonçalo de Almeida Ribeiro, datada de 16 de Dezembro de 2020, dela vem
RECLAMAR PARA A CONFERÊNCIA
nos termos do n.º 3, do art.º 78º-A, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, requerendo “cum data vénia”, que V. Ex.a submeta o caso à Conferência, no sentido de que se venha, finalmente, a fazer a melhor Justiça.
SÃO FUNDAMENTOS:
I-INTRÓITO
1- Na verdade, face às alegações de recurso e suas conclusões (85), para o Tribunal da Relação do Porto, no qual, depois de um aturado estudo a todo o processado, tanto em sede de matéria de facto, como de Direito, nele denunciando insuficiência/ausência de prova, quanto aos imputados 04 (quatro) crimes de roubo, a par da nulidade absoluta da prova proibida, amplamente arguida, e consubstanciada nas 85 conclusões, nulidade de prova essa, a que alude o art.º 126º, n.s 1 e 2, do C.P.Penal, conjugado com o art.º 32º, n.º 6 e 34º, n.º 4, da Constituição da República Portuguesa, e que é insanável (cfr. neste sentido as anotações ao C.P.P., do Insigne Professor, Dr. Pinto de Albuquerque), o Tribunal da Relação, não obstante se ter dado ao trabalho de transcrever as conclusões do recurso do recorrente, e a decisão recorrida, com 41 fls, só em 10 (dez), escassas folhas se pronuncia, para negar provimento ao recurso, sem que antes, como é seu dever, tivesse feita uma análise profunda e se pronunciasse sobre tudo quanto foi vertido nas conclusões, o que inquina o acórdão de nulidade, arguida.
2- Dito isto, confrontado que foi o Tribunal de Recurso (Relação do Porto), seria mister que, tal como o recorrente, se debruçasse e analisasse - permita-se-nos, com todo o respeito e que é muito - sobre tudo quanto ali se alegou, o que, lamentavelmente, não se verificou, mantendo o acórdão proferido pela Ia Instância, assim arrumando cirurgicamente (princípio da “dupla conforme”), sem proceder a uma efetiva e ponderada análise, para a aplicação da melhor justiça, como é suposto e que o recorrente e a comunidade, exigem, pois é em nome do POVO, que o Tribunal exerce o poder.
3- De seguida, e confrontado, o Tribunal da Relação, com a interposição e motivação do recurso do recorrente, para o Supremo Tribunal de Justiça, não o admitiu, invocando a dupla conforme.
4- E, como não se podia, nem pode conformar, o recorrente, com tão injusta e apressada decisão, sem que tivesse sido precedida duma fundamentação ponderada, adequada e capaz, acreditando, ainda, pese embora, a imagem negativa que o cidadão vai tendo da Justiça Portuguesa, que o S.T.J., com mais saber, ponderação e completamente equidistante das partes envolvidas processualmente, melhor aquilatasse, dos atropelos às normas processuais, à lei e à Constituição da República Portuguesa e fizesse a exigível e expectável justiça, a que o recorrente tem direito, para ele reclamou, nos termos do art.º 405º, do C.P.Penal.
ACONTECE QUE
5- O S.T.J., na mesma senda - compreende-se, em parte - do adoptado pelo T.R.Porto, o que, como se disse, a nosso ver, e sempre com o devido respeito, não se debruçou, pormenorizadamente, como lhe é imposto sobre as alegações de recurso, julgando-as, fundamentadamente, procedentes ou improcedentes, atentos os vícios e nulidades arguidas pelo recorrente, que tinha expectativas de que “Alguém”, com outra visão, com outro saber e com outra ponderação, exigência e razoabilidade, que se exige do órgão máximo, o S.T.J., no qual a comunidade e o Povo deverão confiar, analisar, com “olhos de ver”, o seu recurso e proferisse uma justa decisão, fosse ela de absolvição e/ou condenação, mas devidamente fundamentada, material e legalmente, o que, “in casu”, não acontece, razão pela qual, o recorrente se sente clamorosamente injustiçado.
6- Assim é que, também o S.T.J., para onde o recorrente reclamou, insensível às razões e argumentos do recorrente que se considera ter sido injustiçado, porque o Tribunal “a quo”, com notório atropelo às normas processuais atinentes às garantias de defesa do arguido, ao método de proibição de prova, de valoração de prova, princípio da inocência e ao princípio “in dúbio pro reo”, também este, em Decisão Singular, proferida pelo Ex.mo Juiz Vice-Presidente do S.T.J., limitando-se a transcrever as conclusões da Reclamação (9) e, descartando-se, tal como o Tribunal da Relação, igualmente, insensível aos atropelos às normas processuais e constitucionais, no que concerne aos direitos e garantias do recorrente, e não curando, sequer, como seria suposto e se exige daquele supremo órgão de soberania, da matéria alegada e, mesmo jurisprudência que, tão denodada e extensivamente, se verteu nas conclusões de recurso interposto, o qual, bem como outras peças, instruiu aquela Reclamação, alheando-se a tudo isso, comportamento que não seria de esperar, num Estado Democrático e de Direito, como é o Português, decide, aquele STJ, em meia dúzia de palavras e de forma simplista, indeferir a reclamação.
7- Admitindo, contudo - e só porque na alínea c), daquela Reclamação, depois de se pedir, nas alíneas a) e b), a revogação da decisão de não admissibilidade, se disse que “...caso o Ilustre Presidente do STJ, venha a entender que tais garantias e princípios constitucionais não foram violados e, consequentemente, não revogar o despacho aqui sob reclamação, o aqui Reclamante vem, desde já, requerer a V. Ex.”, nos termos e para os efeitos do artigo 280º, n,º 1, alínea b), da CRP, a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, em Secção, com os efeitos previstos no n.º 4, do artigo 78º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, com as alterações introduzidas posteriormente e que regula a Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional para ali, o remeteu “ao abrigo das alíneas b) e f), do n.º 1, do art.º 70º, da LTC, para apreciação de inconstitucionalidade do art.º 400º, n.º 1, al. f), do C.P.P. na interpretação normativa que lhe foi dada na decisão que indeferiu a reclamação, a processar nos próprios autos” (sic), com data de 26NOV.2020.
8- E rápida foi a tomada de posição do Tribunal Constitucional, pois, logo em 16DEZ.2020, profere douta Decisão Sumária, de que agora se reclama, para a Conferência.
1- Dando-se, aqui, por integralmente reproduzido, tudo o que consta do item I, para efeitos de RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA, dir-se-á, o seguinte:
2- De tudo quanto se verteu, quer no recurso do acórdão da Ia Instância, quer depois no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, posterior reclamação do despacho de não admissão de recurso e posterior reclamação para o Venerando Tribunal Constitucional – é o recorrente que, vendo-se “atropelado”, pelo próprio Tribunal nos seus direitos e garantias de defesa, constitucionalmente consagradas, que clama pelo cumprimento das normas processuais, legais e constitucionais - ter ocorrido nos autos NULIDADE ABSOLUTA E INSUPRÍVEL, e que melhor consta das alegações e conclusões do recurso interposto para o S.T.J., não admitido, designadamente, as conclusões 1a, 2a, 3a, 6a, 7a, 8a, 9a, 10a, 11a, 12a, 13a, 14a, 19a, 21a, 23a, 25a, 31a, 33a a 51a, nulidades aquelas que podem ser arguidas a todo o tempo e relativamente às quais teria que pronunciar-se, especificadamente, o que não fez, estando, ainda, os questionados acórdãos inquinados de vício de Inconstitucionalidade, conclusões que aqui se dão por integralmente reproduzidas para os legais efeitos, bem como a inconstitucionalidade das normas, dando-lhe, o Tribunal, uma interpretação não condizente com o espírito do legislador e da Constituição da República Portuguesa, no que às garantias de defesa concerne, para proferir a sua errada decisão, cuja sindicabilidade, o Tribunal de Recurso, teria que apreciar, o que também não fez, assim condenando, infundada e injustificadamente, o reclamante, por 04 (quatro) crimes de roubo que ele, decididamente, não praticou.
3- Foi, por conseguinte, e, reiteradamente, violado o princípio da inocência do arguido, o princípio “in dúbio pro reo” e o próprio princípio da “livre apreciação da prova” (art.º 127º, do C.P.P.), que exige e impõe ao julgador algumas limitações, isto é, não podendo, de forma alguma, a seu bel prazer - foi o que aconteceu “in casu”, optar, na opinião do reclamante, por uma decisão discricionária e lesiva dos seus direitos, assim violando, não só aqueles princípios, como os art.s 2o, 32º, n.s 1 e 2, da C.R.Portuguesa.
4- Por isso, EGRÉJIOS JUÍZES CONSELHEIROS, tal como se deixou alegado nas conclusões, tanto em sede de recurso para o Tribunal da Relação do Porto, como em sede de Supremo Tribunal de Justiça, extensas e amplamente demonstrativas e escalpelizadoras, no que concerne à violação do direito de defesa do recorrente, legal e constitucionalmente, garantidos pelas normas a que se aludiu e que o Tribunal “a quo”, distorcendo-as, deu interpretação diferente, devendo, consequentemente, tais normas, serem nesse sentido, julgadas inconstitucionais.
5- É que, vendo-se, o reclamante, tão injustamente condenado por roubos que não praticou, foi reagindo, interpondo os respectivos recursos e arguindo nulidades insanáveis, a merecer a espectável imparcialidade e ponderação, que se exige aos Tribunais e a melhor Justiça, que não se coaduna, de forma alguma, com as questionadas decisões – não se trata de algo a que o arguido/recorrente/reclamante, não tenha direito - pois, vivendo-se, como se vive num Estado Democrático e de Direito, como é o atual Estado Português, não é lícito que ao arguido/reclamante sejam negados tais direitos.
6- Quisesse, o Venerando Tribunal da Relação do Porto, como seria suposto e lhe competia, reparar tantas ilegalidades, nulidades e atropelos do Tribunal de Ia Instância, e o clamoroso erro e distorcida interpretação dos dispositivos legais em que se estribou para condenar o arguido/recorrente, tê-lo-ia feito, bastando para o efeito, um estudo atento e ponderado das conclusões ali expendidas, o que, como é óbvio, exigia o dispêndio de muitas horas de estudo, que o seu mandatário, teve que fazer, tentando demonstrar no seu recurso, o errado que é o douto acórdão condenatório, que aquela Relação, teria que ter revogado, pois só assim, seria feita a Sã Justiça.
7- E, pese embora, se ter demonstrado que a interpretação, dada pelo Tribunal de Instância, acolhida no acórdão condenatório, é errada e distorcida, inquinando-o, “in se”, de inconstitucionalidade (art.º 32º, n.s 1 e 2, da C.R.P.), o Tribunal da Relação do Porto, manteve-o na íntegra para efeitos do princípio da “dupla conforme”, o que, de forma alguma, não é aceitável, pois não é assim se faz a Sã Justiça, a que o reclamante tem direito e a comunidade exige.
8- 8- E, não será despiciendo, dizer-se, Egrégios Juízes Conselheiros, face aos vícios, irregularidades e nulidades verificadas, ficar o reclamante, com a ideia de que, o que interessava, era a sua condenação e não o apuramento da verdade e sua defesa, pelo facto de ter, ocasionalmente, e só numa situação, sendo certo que, nas demais, os sujeitos, as circunstâncias, etc., são diferentes, e se verificarem muitas incongruências, ilogicidades, etc., e que o reclamante verteu nas suas conclusões de recurso para o S.T.J. e que aqui se respingam as seguintes:
“7 a- Na verdade, é inquestionável, existir nulidade insanável quanto aos inquéritos 500/19.9PIVNG, 501/19.7PIVNG, 502/19.5PIVNG e 188/19.7PFVNG, isto é, a patente “insuficiência de inquérito ou da instrução, por não terem sido praticados atos legalmente obrigatórios, e a omissão posterior de diligências que pudessem reporta-se essenciais para a descoberta da verdade” (cfr. art.º 120º, n.º 2, al. d), do C.P. Penal), como seja, exames periciais, prova por “reconhecimento de pessoas”, conforme se determina no art.º 147º, do C.P.Penal, prova essa que não foi feita e inquina, inexoravelmente, o processo, de NULIDADE.
8a- Tal ausência de prova, foi abundantemente arguida pelo recorrente, primeiramente, no requerimento de abertura de instrução, a fls..., onde, aliás, a prova requerida e arrolada, não foi atendida, NULIDADE INSANAVEL essa que voltou a ser arguida na contestação, designadamente, nos art.s 37º a 42º, 64º a 75º, constituindo, inclusive, os métodos de tentativa de obtenção de “prova” (?), utilizados pela entidade policial, que coagiu e impôs ao arguido, a vestir determinadas peças de roupa, “métodos proibidos de prova” (art.s 126º, n.s 1 e 2, do C.P.P e art.º 32º, n.º 8, da C.R.P.), tudo como melhor foi arguido, naquela contestação e vertido nos art.s 75º, 76º, 77º a 82º, arguição esta que, naturalmente, também foi feita constar do recurso, então e, agora, na esperança de encontrar, finalmente, em V. Ex. as, Egrégios Juízes Conselheiros, uma melhor e mais sábia interpretação das normas legais, correta aplicação do direito e decisão mais justa.
9a- E, vertia-se, naquela contestação, onde foi infirmando, por um lado, circunstancial e veementemente, os factos e por outro arguindo a nulidade absoluta, por referência ao disposto no art. º 126º, n.s 1 e 2, do C.P.Penal, em conjugação com o art. º 32º, n. º 8, da C.R.P. (cfr. art. º 88º, da contestação) – métodos proibidos de prova - dado o facto da PSP, após a detenção do arguido e já na divisão de investigação criminal, terem obrigado a vestir peças, designadamente, um lenço preto a tapar a cara e uns óculos de sol, que não lhe pertenciam, e que não envergava, aquando da sua detenção, assim, o obrigando, de igual modo, sob coação e contra a sua vontade, e ser fotografado, com as mãos atrás das costas (fotos 15, 16, 17 e 18), tudo como melhor consta de fls. 50 e 51 dos autos, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para os legais efeitos
9- O que inquina, desde logo, todo o processo de vício de Inconstitucionalidade, como se plasmou na 10a conclusão, que se transcreve:
10a- Tal expediente, utilizado pelo Núcleo de Investigação da P.S.P., nas suas próprias instalações, contra a vontade do arguido/recorrente. teve como finalidade para, depois, aquele órgão de polícia criminal, servindo-se das queixas contra “desconhecidos”, que originaram os inquéritos N.s 500/19.9PIVNG, 501/19.7PIVNG, 502/19.5PIVNG e 188/19.7PFVNG, através do método policial de presunção, de forma ilegítima e inaceitável, mas que o M.P. acolheu, mesmo sem quaisquer elementos de identificação e reconhecimento legal, darem a ideia de que o tal “desconhecido”, poderia ser aquele que detiveram, no hotel …., não mais procedendo a qualquer outra diligência, recorte nos inquéritos em causa, passando logo, a imputar, ao detido, aqueles outros factos, em frontal violação do princípio da inocência, o que não pode ser aceite no nosso Estado Democrático de Direito, assim inquinando, inquestionavelmente, todo o processo de Nulidade Absoluta e Insanável e de INCONSTITUCIONALIDADE, oportunamente arguida e que aqui, de novo, se argui, expressamente, para os legais efeitos
10- Ali se continuando e repisando, para que dúvidas não restassem, vertendo nas conclusões 12a.2 e 12a.3, o seguinte:
“7212- Nulidade absoluta insanável e inconstitucionalidade, de que enferma o acórdão recorrido, tal como o acórdão da 1aInstância, por referência ao disposto no art.º 126º, n.s 1 e 2, do C.P.Penal, em conjugação com o art.º 32º n.º 8, da C.R.P. (cfr. art.0 88º da contestação) – métodos proibidos de prova - em virtude da acusação ter como suporte, o facto da PSP, após a detenção do arguido e já na divisão de investigação criminal, terem obrigado a vestir peças, designadamente, um lenço preto a tapar a cara e uns óculos de sol, que não lhe pertenciam, e que não envergava, aquando da sua detenção, assim o obrigando ,de igual, modo, sob coação e contra a sua vontade, a ser fotografado, com as mãos atrás das costas fotos 15, 16, 17 e 18, a fl...), para assim, por presunção, lhe imputarem, sem mais, outros ilícitos, praticados por desconhecidos, e a que aludem os inquéritos n.s 500/19.9PIVNG, 501/19.7P1VNG, 502/19.5PIVNG e 188/19.7PFVNG, assim e só por isso - sem qualquer outra prova credível, designadamente, por reconhecimento – vindo a ser condenado, em pena tão severa, à luz do princípio de “livre apreciação da prova”, e das regras de experiência comum.
12”.3~ Da errada análise crítica, enquadramento e tipificação dos factos e sua subsunção ao direito, na medida em que - e sempre sem conceder - o Tribunal “a quo “, tipifica e qualifica os ilícitos, não só aquele a a que alude o inquérito principal (Inq. 75/19), e em que o arguido foi detido, como os outros 4, com “suspeito desconhecido”, e em que não sendo ninguém detido, nem sendo colhidos quaisquer dados de identificação, como crime de roubo ou tentativa de roubo, nos termos do art. º 210º, do C.Penal, quando, face aos circunstancialismos provados, em sede de audiência de julgamento - basta atentar na prova gravada e sua audição - ninguém poderá qualificar tais ilícitos como tal, em virtude de não estarem preenchidos os elementos tipo, mas tão só, e quando muito, como crime de furto simples (art. º 203º, do C. Penal).”
11- E, ainda, continuando na senda da nulidade do acórdão e Inconstitucionalidade, a conclusão 52a, que se transcreve:
“52a- Por último, entende o recorrente, salvo o devido respeito, ter o douto acórdão recorrido, violado o art.0 210º, n.º 1, do C. Penal, bem com o princípio “in dúbio pro reo “ e da presunção de inocência, art.º 32º, n. º 2, da C.R. Portuguesa e, ainda, os art.s 126º e 127º, do C.P.Penal, padecendo, aquele acórdão de nulidade e inconstitucionalidade, o que aqui e agora, se argui, para os legais efeitos.”.
12- E, permita-se-nos dizer com todo o respeito, que nutrimos pelo Tribunal e seus Ilustres Juízes Conselheiros, bem se entendeu, na questionada e douta Decisão Sumária, que se pretende seja levada à Conferência para, colegialmente - é a Justiça, que o reclama - em análise e ponderação alargada, a questão suscitada melhor poder ser decidida, que o que o recorrente/reclamante pretendeu pôr em crise, foram, precisamente, e em si mesmas, as normas constantes dos art.s 127º e 400º, n,º 1, al. f), ambos do C.P.Penal, na medida em que face ao princípio da “dupla conforme”, são restringidos os direitos de defesa do recorrente, ora reclamante, consagrados no art.0 32º, da C.R.P., onde se diz, expressamente, que “O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, inchando o recurso.”, e que, naturalmente, para se tornar eficaz, terá que ser aplicável ao recurso para o S.T.J., o qual foi vedado ao recorrente.
13- Daí que, em boa verdade, e empenhados que estejam os profissionais do foro e por maioria de razão, os Ilustríssimos Juízes - estes como órgãos de Soberania e aplicadora do Direito e da Justiça, em nome do POVO e para o POVO – empenhadamente, de que, aliás, certamente está, o Ilustríssimo Juiz Conselheiro Relator, autor da decisão sumária, não é lícito que, secamente e sem mais, para descartar a presente reclamação, “não se conhecendo do recurso, por não verificação dos pressupostos de admissibilidade”, com vista a obviar analisar e ponderar, melhor, o competente recurso e dele se tomar conhecimento, se diga, no n.º 6, do item II, daquela douta Decisão “... que o objeto do recurso é inidóneo”, asserção que, de todo em todo e tido daquela forma, não é perceptível, porquanto:
14- Foi claro e preciso, o reclamante, em tudo o que verteu na sua Reclamação, que sintetizou em 10 conclusões, que aqui se dão por integralmente reproduzidas para os legais efeitos e, designadamente, as conclusões 9a e 10a, que de novo e por economia processual se transcrevem:
“9”- A questão da legalidade ou inconstitucionalidade aqui suscitada pelo Arguido/Reclamante, quanto ao recurso para o Tribunal Constitucional, visa sempre a ilegalidade ou a inconstitucionalidade de uma norma, e não a constitucionalidade ou a legalidade da decisão em apreço, ou seja, do despacho aqui sob reclamação. no âmbito deste processo.
10a- Por isso, a fixação do objeto do recurso para o Tribunal Constitucional, não se opera em função do decidido pelo Tribunal - não é a decisão que se critica - mas sim em razão das normas ou dos princípios constitucionais nela aplicados ou desaplicados, nele não entrando, por conseguinte, nem matéria de facto nem a sua subsunção nas normas infra constitucionais.” (negrito nosso).
15- É que, e como se disse, como não se conformou, o arguido/reclamante, com as anormalidades e injustiças, amplamente demonstradas, voltou a interpor para o Venerando Supremo Tribunal de Justiça, o respectivo recurso, na convicção e pressuposto de que aí, já mais desvinculado e equidistante das partes, se ordenasse ao Tribunal recorrido, o exato e escrupuloso cumprimento da lei e da Constituição da República Portuguesa, e se fizesse a Justiça, a que o ora reclamante tem direito.
16- E, então, Egrégios Juízes Conselheiros, que mais era preciso, para repor a verdade, a legalidade e as garantias constitucionais a que o arguido/recorrente, tem direito?
Boa vontade, justiça, dando-se uma “pedrada no charco”, para que situação tão anómala e grave se não repitam e para que os cidadãos, já descrentes dos Tribunais, voltem a nela terem confiança.
17- Do recurso para S.T.J., onde, nova e reiteradamente, se invoca a NULIDADE e respectiva INCONSTITUCIONALIDADE, extraem-se 52 conclusões, que aqui se dão por integralmente reproduzidas, nas quais se demonstra à saciedade, os atropelos quanto às garantias e direito de defesa do arguido, consagrados na Constituição da República Portuguesa (art.0 32º), e 127º, do C.P.Penal, direitos que, ostensiva e reiteradamente, o Tribunal “a quo”, negou ao recorrente/reclamante.
18- E que, o que está e esteve sempre em causa, é a ilegalidade e violação dos direitos de defesa do recorrente, ora reclamante, constitucionalmente consagrados, sistemática e reiteradamente negados, violação essa, também, ampla e reiteradamente denunciada, perante os tribunais de recurso, e que, à mesma, não se pode alhear.
19- Tendo sido, por conseguinte, cumprido o ónus a que alude o art.º 12º, n.º 2, da LTC, nas alegações de recurso e respectivas conclusões, constituindo aquelas violações, fundamento do recurso de constitucionalidade, que o S.T.J, ciente de que estão em causa, a violação dos direitos fundamentais do recorrente, consagrados no C.P.P. e na C.R.P., preceitos esses que, não podem ser interpretados, arbitrariamente, ao bel-prazer do julgador, devendo, antes, ser interpretados e integrados de harmonia com a CEDH (art.0 6o) e art.0 16º, da C.R.P., admitiu liminarmente o recurso, remetendo os autos para esse Venerando Tribunal Constitucional.
20- Do vindo de expor, considerando, contrariamente ao entendimento do Ilustríssimo Conselheiro Relator, subscritor da Decisão Singular, posta em crise, ter o recorrente/reclamante, suscitado e alegado, no momento oportuno – e reiteradamente – a questão da inconstitucionalidade das normas constantes dos art.s 127º e 400º, n.º 1, al. f), ambos do C.P.Penal, porquanto diminuindo, substancialmente, as suas garantias de defesa, violou aqueles preceitos legais e constitucionais.
21- Por isso, tendo o recorrente/reclamante, cumprido com o ónus constante do art.012º, n.º 1, al. b) e n.º 2, da LTC, perante a decisão de V. Ex.a, Ilustríssimo Juiz Conselheiro Relator, em não conhecer do objecto do recurso, impõe-se que a decisão sumária, sob reclamação, seja remetida para Conferência, a que alude o n.º 3, do art.0 78º-A, da LTC, para ali ser apreciada a sua inconstitucionalidade.
22- CONCLUINDO: Afigura-se, pois, ao reclamante, que os seus direitos e garantias de defesa foram restringidos, na medida em que o seu recurso para o S.T.J. não foi admitido, com a subsequente violação do art.º 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, o art.0 6o, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH) bem como os art.s 127º e 400º, n.º 1, al. f), do C.P.Penal, estes últimos que deverão ser considerados inconstitucionais, tudo com os legais efeitos.
Assim é que, na modesta opinião do reclamante, e salvo o devido respeito, não assistirá razão ao Ilustre Juiz Conselheiro Relator, autor da Decisão Sumária, para que não se conheça do recurso, mas antes pelo contrário, isto é, dever-se-á conhecer do mesmo, isentando o reclamante de custas, como é de inteira Justiça.
a) Que a decisão sumária, aqui sob reclamação, seja remetida para a Conferência, a que alude o n.º 3, do art.0 78º-A, da LTC;
b) Que na referida Conferência, seja revogada a decisão sumária proferida pelo Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro Relator, dado que o requerimento apresentado pelo aqui reclamante e ali recorrente, preenchem todos os requisitos de admissibilidade de recurso de constitucionalidade, a que alude a al. b), do n.º 1, do art.0 70º, da LTC, bem como os requisitos exigíveis nos termos do n.º 2, do art.0 75º-A, da mesma LTC, deferindo-se, assim, a presente reclamação, com o que se fará
4. Respondeu o Ministério Público, nos seguintes termos:
«1º
Pela douta Decisão Sumária n.º 729/2020, não se conheceu do objeto do recurso interposto para o Tribunal Constitucional por C., ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) e f), da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC).
2º
Havendo dúvidas sobre se o recurso para o Tribunal Constitucional vinha interposto da decisão que na Relação do Porto não havia admitido o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça ou da decisão da Exma. Senhora Vice-Presidente daquele Supremo Tribunal que indeferira a reclamação daquela mesma decisão, apresentada ao abrigo do artigo 405.º do CPP, entendeu-se na douta Decisão Sumária:
“Não se justifica, em todo o caso, convidar o recorrente a esclarecer a dúvida, porque é certo que, em qualquer dos casos, o recurso é inadmissível. É inadmissível se for interposto da decisão de 2 de novembro de 2020, na medida em que, como dispõe o n.º 2 do artigo 70.º da LTC, «os recursos previstos nas alíneas b) e f) do número anterior apenas cabem de decisões que não admitam recurso ordinário (…)», sendo evidente que a decisão em causa não é definitiva, visto ter sido objeto de reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça. E é inadmissível se for interposto da decisão proferida pela Vice-Presidente daquele Tribunal, em 26 de novembro de 2020, pela meridiana razão de que tal decisão ainda não tinha sido proferida no momento em que o recurso foi interposto, sendo por isso manifestamente intempestiva. Com efeito, o recurso para o Tribunal Constitucional é interposto de decisões definitivas dos demais tribunais, não de decisões hipotéticas; o tempo próprio para se recorrer inicia-se após ter sido proferida a decisão desfavorável, não quando esta constitui apenas uma hipótese.”
3º
Concretamente sobre este fundamento para não conhecer do objeto do recurso, na reclamação para a conferência nada vem alegado.
4.º
Também se entendeu na douta Decisão Sumária que se estava perante um objeto inidóneo do recurso de constitucionalidade.
5.º
Quanto a esta parte da decisão, na reclamação o recorrente limita-se, em síntese, a discordar, nada adiantando de minimamente pertinente.
6.º
Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação.»
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
5. A decisão reclamada rejeitou o recurso de constitucionalidade com dois fundamentos. Em primeiro lugar, no facto de, tendo o recurso de constitucionalidade sido interposto simultaneamente com a reclamação da decisão de não admissão do recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, o mesmo ser inadmissível, ora por a decisão impugnada não ser definitiva – no caso de se tratar do despacho de não admissão de 2 de novembro de 2020 −, ora porque a decisão impugnada ainda não havia sido tomada no momento da interposição do recurso de constitucionalidade – no caso de se tratar da decisão da Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. Em segundo lugar, verificou-se que o objeto do recurso é inidóneo, sendo o propósito do recorrente sindicar uma decisão judicial e não uma norma legal que nela tenha sido aplicada.
6. Na reclamação ora apresentada, o recorrente nada diz no sentido de infirmar os fundamentos da decisão de não admissão do recurso. Praticamente tudo o que diz respeita ao mérito da questão que pretende ver apreciada pelo Tribunal Constitucional, como se o recurso de constitucionalidade tivesse sido julgado improcedente, quando o que está em causa nesta reclamação é a questão prévia da sua admissibilidade processual. Quanto a este aspeto, o recorrente limita-se a referir que visou sempre a «ilegalidade e inconstitucionalidade de uma norma», sem, contudo, enunciar qual seja a norma em causa, muito menos demonstrar a natureza normativa do objeto do recurso que efetivamente interpôs. E nada diz no sentido de resolver a ambiguidade sobre a decisão de que recorre, ou sobre o argumento de que, seja qual for tal decisão, o recurso é inadmissível, seja por precariedade da decisão impugnada, seja por intempestividade do recurso.
Assim, resta confirmar a decisão reclamada.
7. Por decair na presente reclamação, é o reclamante responsável pelo pagamento de custas, nos termos do artigo 84.º, n.º 4, segunda parte, da LTC. Ponderados os critérios referidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro, a prática do Tribunal em casos semelhantes e a moldura abstrata aplicável prevista no artigo 7.º do mesmo diploma legal, afigura-se adequado e proporcional fixar a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se:
a) Indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objeto do recurso.
b) Condenar o reclamante em custas, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 7 de janeiro de 2021 – Gonçalo de Almeida Ribeiro – Joana Fernandes Antunes – João Pedro Caupers