ACÓRDÃO N.º 596/2020
Processo n.º 709/2020 (44/PP)
1.ª Secção
Relator: Conselheiro José António Teles Pereira
Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O Partido Cidadania e Democracia Cristã (PPV/CDC) pediu, em requerimento subscrito pelo Responsável-Geral do partido, a respetiva dissolução.
Para tanto, juntou uma ata da Convenção Nacional Extraordinária daquele Partido político realizada em 12/09/2020.
O pedido tem o seguinte teor:
“A Direção Política Nacional do PPV/CDC – Cidadania e Democracia Cristã, vem por este meio entregar a ata da Convenção Nacional Extraordinária ocorrida a 12 de agosto de 2020, onde foi aprovado por unanimidade a dissolução do Partido Portugal Pró Vida – Cidadania e Democracia Cristã.
Apesar de estar previsto nos estatutos partidários aceites por este tribunal a possibilidade de fusões entre partidos, o Tribunal Constitucional informou a impossibilidade de uma fusão entre partidos, neste caso entre o PPV/CDC e o CHEGA, com a fundamentação de que a figura de uma fusão entre partidos não está prevista na Lei dos Partidos Políticos (Lei Orgânica n.º 2/2003 de 22 de agosto).
Assim, a Direção Política Nacional do PPV/CDC solicitou a convocatória de uma Convenção Nacional Extraordinária onde foi apresentada e fundamentada a dissolução do PPV/CDC enquanto partido político, dando liberdade aos militantes e simpatizantes do PPV/CDC de ingressarem outros projetos políticos, referindo que neste momento o CHEGA contém uma declaração de princípios semelhante ao do PPV/CDC, tendo sido portanto aconselhada a ingressão no CHEGA aos militantes e simpatizantes do PPV/CDC, tal como a criação de um movimento associativo pró vida e família, por forma a continuar-se a trabalhar junto da sociedade civil.
Desta forma e para dar cumprimento à vontade dos militantes do PPV/CDC conforme escrutinado na Convenção Nacional Extraordinária de 12 de setembro de 2020, a Direção Política Nacional vem por este meio requerer a Dissolução do Partido Portugal Pró Vida – Cidadania e Democracia Cristã.
A Direção Política Nacional mais informa que o PPV/CDC não tem quaisquer bens nem dívidas.”
(sublinhados acrescentados)
A ata da Convenção Nacional Extraordinária do Partido realizada em 12/09/2020 tem o seguinte teor:
“Aos 12 dias do mês de setembro de 2020 pelas 15h, conforme convocatória enviada a todos os militantes do PPV/CDC, iniciou-se a Convenção Nacional Extraordinária. Dado que pelas 15h não se encontrava quórum para dar início aos trabalhos, aguardou-se até às 15:30 – hora em que [se] deu início formal à Convenção Nacional com todos os presentes (lista de presenças em anexo) com a seguinte ordem de trabalhos:
1 – Deliberar sobre a proposta de integração total do Projeto Político do PPV/CDC no Partido Político CHEGA;
2 – Discussão sobre o futuro do PPV/CDC face aos desafios que se apresentam ao partido.
Uma vez que da mesa eleita da Convenção Nacional só se encontrava presente o Fernando Miguel Urbano, nomeou-se entre os presentes mais duas pessoas por forma dirigir-se os trabalhos, ficando a mesa da Convenção Nacional com a seguinte constituição:
• Fernando Miguel Vidal Urbano — Presidente
• Rafael Fernando Rodrigues dos Santos — Primeiro Secretário
• João Pedro Brito — Segundo Secretário
Assim, o Miguel Urbano como Presidente eleito da Mesa da Convenção Nacional, presidiu à mesa da convenção nacional, onde deu início aos trabalhos.
Dado que a Convenção Nacional Extraordinária foi solicitada pela Direção Política Nacional, o presidente da mesa deu a palavra ao Responsável-Geral, Manuel Matias por forma a este em nome da direção apresentar e fundamentar os motivos da convocatória desta Convenção Extraordinária.
Manuel Matias começou por referir que tal como afirmado na última Convenção Nacional, o PPV/CDC tem bastantes desafios pela frente. Desafio complexos, principalmente com os recursos humanos manifestamente reduzidos para enfrentar a complexidade desses desafios, simultaneamente com a exigência e eficácia que devemos ter na luta pelas causas da vida, da família, e dos princípios basilares do PPV/CDC.
Constatando-se os frutos que se têm recolhido junto das parcerias que o PPV/CDC tem feito com outras forças políticas, nomeadamente com o CHEGA, a Direção Politica Nacional tem condições de afirmar que grande parte dos objetivos políticos pretendidos com a criação do PPV/CDC, podem ter garantido a sua continuidade na agenda politica nacional e deste vez de forma mais eficaz com uma voz ativa na Assembleia da República, dado que existe um aliado de peso no CHEGA, onde na sua carta de princípios tem fortemente plasmado os princípios basilares da fundação do PPV/CDC”.
(sublinhados acrescentados)
1.1. No Tribunal Constitucional, foi proferido despacho, pelo relator, fixando ao Partido requerente o prazo de 45 dias (considerando a necessidade de convocar a Convenção Nacional) para juntar aos presentes autos nova deliberação, por um lado, respeitando o disposto no artigo 19.º dos respetivos Estatutos e, por outro, contendo de forma expressa e inequívoca a vontade de dissolução do partido, sob pena de ser proferida decisão de indeferimento do requerido.
Assentou tal despacho nos fundamentos que ora se transcrevem:
“[…]
Prevê-se no artigo 19.º (antigo artigo 18.º-A) dos Estatutos do partido requerente (fls. 188):
‘A dissolução do PPV/CDC só pode ser decidida em sessão da Convenção expressamente convocada para o efeito, tendo como único ponto da respetiva ordem de trabalhos a apreciação da proposta fundamentada de dissolução do partido, necessariamente apresentada pela Direção Política Nacional ou por uma petição do 33% dos membros validamente inscritos.’
Estabelece o artigo 17.º da Lei dos Partidos Políticos (Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto):
Artigo 17.º
Dissolução
1 – A dissolução de qualquer partido político depende de deliberação dos seus órgãos, nos termos das normas estatutárias respetivas.
2 – A deliberação de dissolução determina o destino dos bens, só podendo estes reverter para partido político ou associação de natureza política, sem fins lucrativos, e, subsidiariamente, para o Estado.
3 – A dissolução é comunicada ao Tribunal Constitucional para efeito de cancelamento do registo.
[…]
Resulta da ata da Convenção Nacional Extraordinária do partido requerente realizada em 12/09/2020 que não foi observado o disposto no artigo 19.º dos Estatutos do partido, designadamente, a sessão da Convenção não foi expressamente convocada para efeito de dissolução, nem teve como único ponto da respetiva ordem de trabalhos a apreciação da proposta fundamentada de dissolução do partido.
Acresce que da deliberação em causa teria de resultar de forma expressa e inequívoca a vontade de dissolução do partido (Acórdão n.º 199/2008). Não é o caso da declaração em causa: ‘grande parte dos objetivos políticos pretendidos com a criação do PPV/CDC, podem ter garantido a sua continuidade na agenda politica nacional e deste vez de forma mais eficaz com uma voz ativa na Assembleia da República, dado que existe um aliado de peso no CHEGA, onde na sua carta de princípios tem fortemente plasmado os princípios basilares da fundação do PPV/CDC’, que é equívoca quanto ao destino da dissolução, carecendo de contexto e interpretação [compare-se tal declaração genérica, designadamente, com ‘foi aprovada a extinção do Partido’ (Acórdão n.º 14/2013), ‘aprovada por unanimidade dos presentes a extinção do partido’ (Acórdão n.º 199/2008) e ‘aprovação, por unanimidade, do ponto um da Ordem de Trabalhos, referente à respetiva dissolução’ (Acórdão n.º 140/2008)].
[…]”.
1.2. Notificado desse despacho do relator, o Partido requerente juntou cópia da ata n.º 9 da Convenção Nacional Extraordinária, aqui dada por reproduzida, sendo que esta documenta a reunião deste órgão em 17/10/2020, tendo como ponto único da ordem de trabalhos “[a] dissolução do Partido Político [Partido Cidadania e Democracia Cristã –] Portugal Pró Vida – Cidadania e Democracia Cristã [PPV/CDC]”, proposta que foi apresentada pela Direção Política Nacional e aprovada por unanimidade.
2. Nos termos do artigo 9.º, alínea f), da Lei do Tribunal Constitucional, compete a este Tribunal ordenar a extinção de partidos e de coligações de partidos, nos termos da lei.
Prevê-se no artigo 19.º (antigo artigo 18.º-A) dos Estatutos do partido requerente (fls. 188):
“[…]
A dissolução do PPV/CDC só pode ser decidida em sessão da Convenção expressamente convocada para o efeito, tendo como único ponto da respetiva ordem de trabalhos a apreciação da proposta fundamentada de dissolução do partido, necessariamente apresentada pela Direção Política Nacional ou por uma petição do 33% dos membros validamente inscritos.
[…]”.
E estabelece o artigo 17.º da Lei dos Partidos Políticos (Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de agosto):
Artigo 17.º
Dissolução
1 – A dissolução de qualquer partido político depende de deliberação dos seus órgãos, nos termos das normas estatutárias respetivas.
2 – A deliberação de dissolução determina o destino dos bens, só podendo estes reverter para partido político ou associação de natureza política, sem fins lucrativos, e, subsidiariamente, para o Estado.
3 – A dissolução é comunicada ao Tribunal Constitucional para efeito de cancelamento do registo.
2.1. Do relatado no item 1.2., supra, resulta o caráter claro e inequívoco da deliberação tomada na reunião da Convenção Nacional Extraordinária do partido requerente de 17/10/2020, que dá corpo – esta sim – a uma vontade (inequívoca) de dissolução do partido.
2.1.1. E a tal respeito, sublinha-se terem sido respeitadas as condições estatutárias para o efeito desse resultado (a extinção do Partido), designadamente as previstas no artigo 19.º dos Estatutos: a dissolução foi decidida em sessão da Convenção Nacional expressamente convocada para o efeito, tendo como único ponto da respetiva ordem de trabalhos a apreciação da proposta fundamentada de dissolução do partido, e a proposta foi apresentada pela Direção Política Nacional.
Considerando a declaração do Partido requerente no sentido de que “não tem quaisquer bens nem dívidas”, declaração essa que nenhum elemento dos autos afasta, não se mostra necessária deliberação sobre o destino de bens (artigo 17.º, n.º 2, da Lei dos Partidos Políticos).
Em suma, a vontade de extinção do partido foi validamente formada no órgão competente e respeita o disposto no artigo 17.º da Lei dos Partidos Políticos.
3. Em face do exposto, e nos termos do disposto no n.º 3 do artigo 17.º da Lei dos Partidos Políticos e no artigo 9.º, alínea f), da Lei do Tribunal Constitucional, ordena-se:
a) a anotação da dissolução do Partido Cidadania e Democracia Cristã (PPV/CDC); e
b) o cancelamento da inscrição deste no registo próprio existente neste Tribunal
Lisboa, 10 e novembro de 2020 – José Teles Pereira – João Pedro Caupers
O relator certifica o voto de conformidade ao presente Acórdão da Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros, do Conselheiro José João Abrantes e do Conselheiro Presidente Manuel da Costa Andrade
José Teles Pereira