ACÓRDÃO N.º 539/2012
Processo n.º 59/12
Plenário
Relator: Conselheiro Fernando
Ventura
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Requerente
e pedido
O
Procurador-Geral da República, nos termos do disposto nos artigos 277º, nº 1,
281º, nº 1, alínea a), nº 2,
alínea e), e 282º da Constituição da República
Portuguesa (CRP), 51º a 56º e 62º a 66º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (Lei
do Tribunal Constitucional), e 12º, nº 1, alínea c)
do Estatuto do Ministério Público, aprovado pela Lei nº 60/98, de 27 de Agosto,
vem requerer a apreciação e declaração, com força obrigatória geral:
i)
da inconstitucionalidade orgânica da norma constante do
nº 2 do artigo 8º do Regulamento do Estatuto, da Inscrição e Transferência de
Jogadores, da Federação Portuguesa de Futebol, aprovado na sua assembleia geral
extraordinária de 30 de Junho de 2007, na redação decorrente
da alteração aprovada na sua assembleia geral de 17 de Maio de 2008;
ii) da
inconstitucionalidade formal do Regulamento do Estatuto, da Inscrição e
Transferência de Jogadores, da Federação Portuguesa de Futebol.
Mais peticionou o requerente a limitação dos efeitos da
inconstitucionalidade, nos termos do artigo 282.º, n.º 4 da CRP, de
modo a que os mesmos se produzam apenas a partir da publicação da decisão a
proferir nos autos.
A
norma reputada de organicamente inconstitucional,
apresenta o seguinte teor:
Artigo 8.º
(Liberdade de transferência)
1. [...].
2. Os jogadores amadores a partir dos 14 anos, à data
da inscrição, são livres de escolher a entidade desportiva que desejarem
representar, no final de cada época, ficando as inscrições com transferências
realizadas nas cinco épocas seguidas à inscrição efectuada com 14 anos de
idade, inclusive, sujeitas ao pagamento de uma taxa de formação pelo clube ou
SAD para o qual se transfere o jogador, ao clube ou SAD no qual aquele esteve
anteriormente inscrito, segundo tabela a publicar anualmente pela Federação
Portuguesa de Futebol, caso os clubes dela não prescindam por escrito.
2. Fundamentos
do pedido
Para fundamentar o seu
pedido, o Procurador-Geral da República alegou, em síntese, o seguinte:
- A Federação Portuguesa de
Futebol é uma pessoa coletiva de direito privado, sem
fins lucrativos, dotada do estatuto de utilidade pública desportiva;
- Na sua assembleia-geral
extraordinária, de 30 de Junho de 2007, a Federação Portuguesa de Futebol
aprovou o Regulamento do Estatuto, da Inscrição e Transferência de Jogadores
(REITJ), publicado através do Comunicado Oficial n.º 003, de 3 de Julho de
2007, o qual entrou em vigor nessa data (art. 16.º). Ulteriormente,
em assembleia-geral extraordinária de 17 de Maio de 2008, a Federação
Portuguesa de Futebol aprovou alterações aos arts.
8.º, 13.º e 14.º, do dito Regulamento, o qual foi republicado na íntegra, na
sua nova versão, no anexo I ao Comunicado Oficial n.º 432, de 18 de Junho de
2008, tendo entrado em vigor nessa data (art. 16.º);
- Embora epigrafada
“Liberdade de transferência” e de principiar dispondo que os jogadores amadores
a partir dos 14 anos, à data da inscrição, são livres de escolher a entidade
desportiva que desejarem representar, no final de cada época, a norma do art. 8.º, n.º 2, do REITJ, prossegue, contudo, para criar,
unilateralmente, uma “taxa de formação, de montante a fixar de acordo com uma
tabela a publicar anualmente pela Federação Portuguesa de Futebol”, cuja
satisfação pelo clube ou SAD de destino (ressalvada a denúncia, por escrito,
entre os clubes de origem e de destino) é condição para o exercício da liberdade
de transferência, no final da época desportiva, dos “jogadores amadores”, a
partir dos 14 anos. Nesses termos, o conteúdo desta norma jurídica regulamentar
dispõe, inovatoriamente, sobre matéria de “reserva de lei”;
- Ao instituir uma “taxa de
formação”, cujo pagamento é condição para efetivar as
inscrições com a transferência, realizadas nas cinco épocas seguintes à
inscrição efetuada com 14 anos de idade pelos
“jogadores amadores” de futebol, não vinculados por “contrato de formação”, a
norma constante do art. 8.º, n.º 2, do REITJ cria
disciplina jurídica inicial para um caso não regulado na lei;
- A Constituição consagra,
no seu art. 26.º (Outros direitos pessoais), entre
outros, o “direito ao desenvolvimento da personalidade”, aqui relevante na sua
dimensão de “direito geral de liberdade”. Este “direito fundamental”,
“pessoal”, consta, no sistema da Constituição, da Parte I (Direitos e deveres
fundamentais), Título II (Direitos, liberdades e garantias), Capítulo I
(Direitos, liberdades e garantias pessoais). E, portanto, está expressamente
abrangido pela reserva relativa de competência legislativa do Parlamento,
sendo, por conseguinte, “(…) da exclusiva competência
da Assembleia da República legislar sobre [tal] matéria (…), salvo autorização
do Governo”, ou seja, apenas a Assembleia da República, ou o Governo,
habilitado com a pertinente “autorização legislativa”, poderão validamente
dispor sobre esta matéria [art. 165. º, n.º 1, al. b)
da CRP];
- A norma do art. 8.º, n.º 2, do REITJ institui uma “taxa de formação”
cujo pagamento é condição da liberdade de transferência, no final de cada época
desportiva, das “crianças” e “jovens”, praticantes amadores de futebol, sendo
certo que a lei constitucional impõe, como tarefa dos poderes públicos, a
“especial proteção” dos mesmos com vista ao seu
desenvolvimento integral e à efetivação dos seus
direitos, em particular no domínio da “educação” e da ”cultura física e do
desporto” (arts. 69.º, n.º 1, 70.º, n.º 1, al. c) e 79.º,
n.ºs 1 e 2, todos da CRP);
- Para além de inovatória, a
disciplina jurídica em apreço consubstancia “ingerência”, com “cunho
restritivo”, de uma disposição constante de regulamento autónomo, no “conteúdo
essencial” do “direito ao desenvolvimento da personalidade”, enquanto tutela da
autonomia dos indivíduos na escolha dos seus comportamentos próprios, mormente
da “liberdade de fazer”, no sentido em que impede o exercício da liberdade de
transferência, a menos que seja paga uma soma pecuniária, cujo valor é
heterónima e vinculativamente estabelecido pela Federação Portuguesa de Futebol
(art. 18.º n.º 3, da CRP);
- Por versar matéria de
competência legislativa reservada pela Constituição à Assembleia da República,
ou ao Governo, habilitado com a pertinente “autorização legislativa”, a norma
regulamentar constante do art. 8.º, n.º 2, do REITJ,
é organicamente inconstitucional [art. 26.º, n.º 1, e
art. 165.º, n.º, al. b), da CRP];
- Por preterição de
indicação expressa de lei habilitante, o REITJ padece de inconstitucionalidade
formal;
- À sombra do regime
regulamentar em causa, em vigor há mais de três anos, já se terão consumado
“transferências” de jogadores amadores e terão sido pagas as correspondentes
“taxas de formação”, pelo que o efeito retroativo da
declaração de inconstitucionalidade seria passível de provocar disrupção
jurídica, pessoal e institucional, e financeira em situações já consumadas no
âmbito do ordenamento jurídico da Federação Portuguesa de Futebol.
- Assim, para salvaguarda da
“segurança jurídica” e ressalvados os casos ainda passíveis ou pendentes de
apreciação judicial, poderão os efeitos da inconstitucionalidade ser limitados,
de modo a que os mesmos se produzam apenas retrospetivamente,
a partir da publicação da “decisão limitativa” a proferir nos autos (art. 284.º, n.º 4, da CRP).
3. Resposta
do autor da norma
Notificada nos
termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da LTC, a Federação
Portuguesa de Futebol pronunciou-se no sentido de ser negado provimento à
pretensão formulada pelo Procurador-Geral da República, com os seguintes
fundamentos, igualmente em síntese:
- O requerente
insiste, sem razão ou fundamento, em aproximar, na regulação do caso vertente,
diplomas que nada têm a ver entre si e, muito menos, com a matéria que estava
sujeita a parecer. O Regulamento para a Inscrição e Transferência dos
Praticantes Amadores, na sua formulação atual, é
matéria de exclusivo âmbito desportivo, estando vinculada ao normativo legal
regulador da atividade desportiva e do respetivo sistema. Os sujeitos objeto
da regulamentação federativa em apreço não são profissionais nem está em causa
o seu direito ao trabalho, uma vez que a sua relação com a entidade promotora
desportiva (clube ou SAD) é exclusivamente desportiva, sem qualquer outro
vínculo, especialmente laboral;
- O pagamento
de taxa determinável é, ao contrário do que pretende o requerente, a garantia
de que o efetivo direito do atleta à sua integral
formação não é afetado por tal pagamento;
- O universo
desportivo, para além da federação desportiva respetiva,
é formado por entidades de direito privado que desenvolvem a sua atividade no âmbito do livre associativismo e do mercado
aberto. Tal significa que os clubes e SADs que
oferecem formação aos seus jovens atletas suportam eles próprios – em exclusivo
– os custos dessa formação. O mecanismo de compensação, ao exigir a intervenção
reguladora da federação, dotada de utilidade pública desportiva e, portanto,
dos necessários poderes de natureza pública, permite levantar limites que
possam “em qualquer caso, afetar de forma
desproporcionada, na prática, a liberdade de contratar do praticante”;
- A Federação
Portuguesa de Futebol impede, assim, que os clubes possam por sua livre
iniciativa, estabelecer as formas e os valores referentes à formação dos jovens
atletas, o que provocaria, necessariamente, uma grave limitação redutora ao
direito de livre desenvolvimento dos jovens atletas em Portugal;
- Verifica-se,
assim, a total insubsistência da tese de que o citado regulamento federativo,
na redação em causa e na parte da questão, está
ferido de inconstitucionalidade orgânica, não podendo defender-se a reserva da
competência da Assembleia da República para a fixação de regulamentação de
natureza exclusivamente desportiva, sem qualquer incidência noutras esferas
jurídicas, nomeadamente na esfera laboral;
- A prolação
do Regulamento desportivo aqui em causa emergiu de um poder regulador diverso daquele
que o requerente invoca;
- Tal poder
regulamentar fora claramente delineado pela Portaria de 12 de Junho de 1986 do
Ministro da Educação e Cultura, publicada no DR II Série, n.º 140, de
12.06.1986, a qual dispunha que “é da competência das federações desportivas
nacionais regular as transferências dos praticantes amadores das respetivas modalidades”;
- Não está,
assim, aquela norma vinculada ao dever formal de indicação da lei habilitante e
por isso ferida de inconstitucionalidade já que tal normativo teve a sua origem
em 1987, antes da entrada em vigor do atual sistema
regulador do Desporto em Portugal, isto é, antes de as federações desportivas
dotadas de utilidade pública exercerem poderes de natureza pública e, por tal
razão, deverem seguir o regime do art. 112.º, n.º 7,
da Constituição.
4. Em
momento posterior, a 6 de junho de 2012, veio a
Federação Portuguesa de Futebol dar conhecimento da aprovação de novo
Regulamento para a inscrição de jogadores, no qual “foi eliminada a disposição
normativa constante no artigo 8.º n.º 2 do Regulamento do Estatuto da Inscrição
e Transferência de Jogadores”.
5.
Elaborado o memorando a que alude o artigo 63.º, n.º 1 da LTC e fixada a
orientação do Tribunal, cumpre decidir nos termos do artigo 65.º do mesmo
diploma.
II -
FUNDAMENTAÇÃO
a) Questão prévia
6.
Cumpriria iniciar a apreciação do pedido colocado a este Tribunal pela reponderação
da questão de saber se a regulação em apreço, emanada da Federação Portuguesa
de Futebol, integra o conceito de norma, para efeitos de fiscalização da
constitucionalidade, no âmbito do artigo 277º da Constituição. Questão já
abordada por este Tribunal, mormente no Acórdão n.º 730/95.
Entende-se,
porém, colocada questão prévia que prejudica, aqui, essa discussão.
7.
Como se referiu, as normas que constituem o objeto do
presente pedido de fiscalização abstrata foram supervenientemente substituídas por outra regulação.
Subsequentemente
à apresentação do pedido, foi aprovado, em reunião da Direção da Federação Portuguesa de Futebol de 23 de Junho
de 2012, e publicado no Comunicado Oficial n.º 487, de 29 de Junho de 2012,
novo Regulamento, denominado Regulamento do Estatuto, da Categoria, da
Inscrição e Transferência dos Jogadores, da Federação Portuguesa de Futebol, o
qual, nos termos do respetivo artigo 24º, nº 1,
entrou em vigor na data da sua publicação.
Embora não
contenha qualquer disposição revogatória, não pode deixar de se concluir que o novo
Regulamento do Estatuto, da Categoria, da Inscrição e Transferência de
Jogadores, da Federação Portuguesa de Futebol, revogou tacitamente o
Regulamento que o antecedeu, aprovado em assembleia geral extraordinária de 30
de Junho de 2007, e publicado através do Comunicado Oficial nº 003, de 3 de
Julho de 2007, e revisto em assembleia geral extraordinária de 17 de Maio de
2008 e publicado através do Comunicado Oficial nº 432, de 18 de Junho de 2008,
uma vez que o novo Regulamento regula toda a matéria do anterior (cfr. artigo 2º).
8.
Conforme jurisprudência constante deste Tribunal, o princípio do
pedido, decorrente do artigo 51.º, n.º 5 da LTC, veda a “convolação”
do objeto do processo e, com isso, compromete a
possibilidade de o Tribunal apreciar a constitucionalidade do novo Regulamento
do Estatuto, da Inscrição, da Categoria e Transferência de Jogadores, da
Federação Portuguesa de Futebol (cfr., entre muitos,
os Acórdãos deste Tribunal n.ºs 140/2000, 531/2000, 404/2003, 485/2003,
19/2007, 497/2007 e 31/2009, acessíveis, como os demais adiante referidos, em www.tribunalconstitucional.pt).
Acresce que,
no caso em apreço, a “convolação” sempre seria desprovida de sentido, pois, por
um lado, a norma que constava do artigo 8º, nº 2, na redação
aprovada em assembleia geral extraordinária de 17 de Maio de 2008 e publicada
através do Comunicado Oficial n.º 432, de 18 de Junho de 2008, não transitou
para o novo Regulamento e, por outro, este, no respetivo
artigo 1º, identifica expressamente, como norma habilitante, a alínea a) do nº 2 do artigo 41º do Regime Jurídico das Federações
Desportivas, aprovado pelo Decreto-Lei nº 248-B/2008, de 31 de dezembro.
9. Não
obstante, a circunstância de terem sido revogadas as normas que constituem objeto do pedido de fiscalização abstrata
sucessiva não implica necessariamente, por si só, a inutilidade do respetivo conhecimento. Uma vez que a revogação reveste, em
princípio, eficácia prospetiva (ex nunc),
enquanto, em sede de fiscalização abstrata sucessiva,
de acordo com o artigo 282.º, n.º 1 da CRP, a declaração de
inconstitucionalidade comporta, em regra, eficácia retroativa
(ex tunc), subsiste a possibilidade
de persistir interesse jurídico relevante na eliminação dos efeitos produzidos medio tempore (cfr., entre muitos, Acórdão nº
31/2009).
Porém, e como
também resulta de reiterada e constante jurisprudência deste Tribunal, não
basta que a norma revogada tenha produzido um qualquer efeito jurídico para que
se tenha por fundada a apreciação do pedido: só existirá interesse jurídico
relevante para justificar o conhecimento do mérito do pedido de fiscalização abstrata sucessiva de norma entretanto revogada quando essa
cognição, e eventual declaração de inconstitucionalidade, for indispensável
para atingir efeitos corretivos ou eliminatórios de
largo alcance, mormente quando seja conhecida a pendência de número
significativo de casos em que foram aplicadas as normas objeto
de controlo.
Como se disse no Acórdão n.º 497/97:
“Com efeito,
pode haver interesse na eliminação dos efeitos produzidos pela norma revogada
no período da sua vigência. De acordo com a jurisprudência, reiterada e
uniforme, deste Tribunal face à revogação de uma norma, manter-se-á o interesse
na declaração da sua eventual inconstitucionalidade ‘toda a vez que ela for
indispensável para eliminar efeitos produzidos pelo normativo questionado,
durante o tempo em que vigorou’ e que essa indispensabilidade seja evidente,
por se tratar da eliminação de efeitos produzidos constitucionalmente
relevantes (por todos, citem-se os Acórdãos n.ºs 804/93, 806/93, 186/94 e
57/95, publicados no Diário da República, II Série, de 31 de Março, 29 de
Janeiro, 14 de Maio de 1994 e 12 de Abril de 1995, respectivamente”.
10.
Tomando o caso em apreço, cumpre afastar a verificação de interesse jurídico
relevante, por ausência de indispensabilidade do conhecimento do pedido de
fiscalização abstrata sucessiva para corrigir ou
eliminar a aplicação de qualquer dos normativos sob controlo, em termos de
atingir alcance prático importante ou significativo.
Desde logo, em
virtude da consideração da limitação dos efeitos da declaração de
inconstitucionalidade, por razões de segurança jurídica, equidade ou interesse
público de excecional relevo, nos termos permitidos
pelo n.º 4 do artigo 282.º da CRP.
Voltando a
recorrer à síntese constante do Acórdão n.º 497/97:
“Já, porém, não
existe – neste modo de ver – interesse jurídico relevante no
conhecimento de um pedido de declaração de inconstitucionalidade, com força
obrigatória geral, de uma norma entretanto revogada, naqueles casos em que não
se vislumbre nele qualquer alcance prático, atendendo à circunstância de o
Tribunal, a declarar eventualmente a inconstitucionalidade, não dever deixar
de, por razões de segurança jurídica, equidade ou interesse público de
excepcional relevo, limitar os seus efeitos, nos termos do n.º 4 do artigo
282.º da CR, de modo a deixar incólumes os efeitos produzidos pela norma antes
da sua revogação. Em tais situações, como vem entendendo este Tribunal (e
acompanhamos de perto o citado acórdão nº 57/95), ‘em que é visível a priori que o Tribunal Constitucional iria, ele
próprio, esvaziar de qualquer sentido útil a declaração de
inconstitucionalidade que viesse eventualmente a proferir, bem se justifica
que conclua, desde logo, pela inutilidade superveniente de uma decisão de
mérito’ ”.
No caso em
apreço, depõem razões de segurança jurídica no sentido da restrição dos efeitos
de eventual declaração de inconstitucionalidade, com força obrigatória geral, ao
abrigo do nº 4 do artigo 282º da CRP, do artigo 8º, nº 2 do Regulamento do
Estatuto, da Inscrição e Transferência de Jogadores, da Federação Portuguesa de
Futebol, na versão resultante da alteração aprovada em assembleia geral
extraordinária de 17 de maio de 2008 e publicada através do Comunicado Oficial
n.º 432, de 18 de junho de 2008, bem como do próprio
Regulamento, na mesma versão, por forma a deixar incólumes as inscrições e
transferências de jogadores efetuadas no lapso
temporal da sua vigência, conforme, aliás, peticionado pelo requerente.
Nessa medida,
a apreciação do mérito do pedido mostra-se desprovida de interesse prático
adequado.
11. Por
outro lado, persiste ao dispor dos interessados a via da fiscalização concreta
da constitucionalidade, como meio idóneo e suficiente para obviar à aplicação,
no seu caso, dos preceitos questionados, não sendo aqui adequado e
proporcionado acionar a fiscalização abstrata da constitucionalidade para corrigir ou eliminar
efeitos entretanto produzidos por tais normas, durante o período da sua
vigência (cfr. Acórdãos nº 639/99, 671/99, 673/99,
45/2000, 413/2000, 531/2000, 140/2002, 19/2007, 497/2007 e 31/2009).
12. Pelo
exposto, por inexistência de interesse jurídico relevante, conclui-se pela verificação
de inutilidade superveniente, a obstar ao conhecimento do mérito do pedido
formulado.
III — Decisão
13. Nos
termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide não tomar
conhecimento do pedido de declaração de inconstitucionalidade, com força
obrigatória geral, do Regulamento do Estatuto, da Inscrição e Transferência de
Jogadores, da Federação Portuguesa de Futebol, aprovado na sua assembleia geral
extraordinária de 30 de Junho de 2007, na redação
decorrente da alteração aprovada na sua assembleia geral de 17 de maio de 2008
e, bem assim, da norma do n.º 2 do artigo 8.º do mesmo Regulamento.
Lisboa, 15 de novembro de 2012.- Fernando Vaz Ventura –
Maria Lúcia Amaral – J. Cunha Barbosa – Maria João Antunes – Carlos Fernandes
Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Maria de Fátima Mata-Mouros – João
Cura Mariano – Ana Maria Guerra Martins – Catarina Sarmento e Castro – Vítor
Gomes – Joaquim de Sousa Ribeiro.