TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 93.º Volume \ 2015
413 acórdão n.º 363/15 X – Nesse plano institucional em que se considera o sistema judiciário como um todo orgânico, contra- riamente ao que se deve fazer no plano processual, a dissociação entre o ato judicante – a decisão – e os seus efeitos – o respetivo conteúdo –, embora possível, não é necessária e, frequentemente, não será conveniente; isto é: pode haver razões de peso que justifiquem a modelação do direito à indemnização sempre que este interfira com a lógica de organização e funcionamento do próprio sistema judiciário, e são tais razões que também podem justificar a solução do artigo 13.º, n.º 2, do RCEEP quando cotejada com os parâmetros constitucionais da igualdade ou da tutela jurisdicional efetiva. XI – A segurança jurídica, associada às decisões judiciais transitadas em julgado, e a autoridade das decisões dos tribunais superiores, inerente à estrutura hierarquizada do sistema judiciário constituem bens constitucionais reconhecidos; por outro lado, é ainda uma lógica sistémica que explica que o recurso jurisdicional não seja nem universal nem ilimitado, ou que os tribunais se organizem de acordo com certos critérios de especialização, sendo precisamente estas considerações que estão na base da ideia de que permitir que um ato judicial «consolidado» – porque não impugnável ou não impugnado tempestivamente – possa vir a ser ulteriormente «desautorizado», mesmo que para os efeitos limitados de reconhecimento de um erro judiciário, por outro tribunal – porventura até de diferente espécie ou pertencente a uma ordem diversa de jurisdição, ou inclusivamente da mesma espécie, mas de grau inferior – constitui um ilogismo institucional. XII – Tendo em conta o amplo espaço de conformação legislativa quanto à definição do âmbito e dos pres- supostos da responsabilidade do Estado reconhecido pelo artigo 22.º da Constituição, em especial, no que se refere à responsabilidade do Estado por erro judiciário, esta interfere com a própria con- figuração e modo de funcionamento do sistema judiciário, tal como prefigurados na Constituição, ampliando desse modo ainda mais o campo de intervenção do legislador ordinário; assim, a norma sob apreciação, limitando-se a estabelecer que o erro judiciário relevante seja previamente reconhecido pela jurisdição competente, o mesmo é dizer, que o reexercício da função jurisdicional coenvolvido na reapreciação da decisão judicial danosa se faça com respeito pelas competências e hierarquia próprias do sistema judiciário e de acordo com o seu específico modo de funcionamento, não está a interferir com qualquer âmbito de proteção constitucionalmente pré-definido (muito menos a invadi-lo); e, por isso mesmo, também não se pode dizer que essa norma revista a natureza de uma lei harmonizadora destinada a resolver um qualquer conflito de bens jurídicos fundamentais ou de uma lei restritiva de um direito fundamental. XIII – Em rigor, a norma do artigo 13.º, n.º 2, RCEEP concorre, juntamente com a do n.º 1 do mesmo artigo, para a configuração do conteúdo do direito de indemnização emergente da responsabilidade do Estado por erro judiciário do Estado, sendo, nessa exata medida, uma lei conformadora ou cons- titutiva que não elimina o direito à indemnização por erro judiciário, limitando-se a acomodar no regime respetivo, as exigências correspondentes à estrutura e ao modo de funcionamento do sistema judiciário constitucionalmente consagrado, inexistindo, por conseguinte, qualquer evidência de des- respeito pelo conteúdo essencial do referido direito. XIV– Se à partida, e de modo constitucionalmente legítimo, o direito à indemnização em causa é delimita- do negativamente em função da possibilidade legal de reapreciação judicial pelo tribunal competente antes do trânsito em julgado da decisão tida como danosa, também não se coloca qualquer problema de acesso ao direito, pois este último, enquanto direito-garantia, pressupõe um direito material, que, no caso, inexiste; finalmente, as referidas exigências orgânico-funcionais relacionadas com o sistema judiciário explicam satisfatoriamente a solução legal, afastando a ideia de que a mesma seja arbitrária.
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