TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
854 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL procedimento, para além da indiscutível vertente processual, têm natureza substantiva. Tal natureza deter- mina, no domínio da aplicação da lei no tempo, a sujeição das respetivas normas ao princípio da aplicação retroativa do regime jurídico mais favorável ao agente da infração (n.º 2 do artigo 3.º do RGCO). Significa isto que não pode ser aplicada lei sobre prescrição mais gravosa do que a vigente à data da prática dos fac- tos, bem como deve ser aplicado retroativamente o regime prescricional que eventualmente se mostre mais favorável. Ora, na determinação do regime mais favorável deve proceder-se à aplicação do regime legal, no seu todo, que vigorava à data da prática das infrações, por comparação com os regimes que lhe sucederam até à data em que é proferida a decisão sancionatória. Ou seja, aplica-se a lei antiga e a seguir a lei nova, uma e outra integralmente, comprando-se os resultados. Nos autos, esta operação tem que ser efetuada relativamente a cada uma das infra- ções imputadas aos arguidos, uma vez que o momento da «prática da contraordenação», que constitui o termo a quo do prazo da prescrição do procedimento (artigo 5.º da RGCO), não é o mesmo nas três contraordenações. Por força do disposto no artigo 27.º, n.º 1, alínea a), do RGCO, em conjugação com o artigo 29.º da Lei n.º 19/2003 – que fixa a coima máxima em 10 e 5 vezes o valor do IAS, conforme se trate de partidos políticos ou dos respetivos dirigentes, o que perfaz € 167 688 ou € 83 844 – o prazo normal de prescrição do procedimento é em todas as infrações de cinco anos. Porém, enquanto a data da consumação das infrações aos deveres de organização contabilística, estabe- lecidos no artigo 12.º da Lei n.º 19/2003, corresponde ao termo final do prazo de entrega das contas parti- dárias – o previsto no n.º 1 do artigo 26.º desta Lei, que corresponde a 31 de maio de cada ano –, a violação do n.º 2 do artigo 7.º da mesma Lei – não existência de conta bancária específica para os donativos durante parte do ano – consuma-se com o dia da prática do último depósito em conta não específica do partido. Na verdade, em caso de infração continuada ao dever de depósito em conta específica, por aplicação da alínea b) do n.º 2 do artigo 119.º do Código Penal, ex vi artigo 32.º do RGCO, para efeitos da contagem do prazo de prescrição do procedimento, releva o último ato. Impõe-se, pois, conhecer da prescrição do procedimento contraordenacional em função do regime con- cretamente mais favorável, autonomizando a infração ao disposto no n.º 2 do artigo 7.º das violações ao regime contabilístico previsto no artigo 12.º da Lei n.º 19/2003. 9.2. Está demonstrado que nas contas anuais de 2012 o PAN registou donativos pecuniários que foram depositados na conta bancária geral e não na conta específica de donativos, contrariando assim o regime dos donativos singulares previsto no artigo 7.º da Lei n.º 19/2003. Os depósitos de donativos na conta geral ocorreram de forma continuada entre fevereiro e julho, sendo o último depósito efetuado em 6 de julho de 2012 (cfr. n.º 6.4 dos factos provados). Como se referiu, para efeitos de contagem do prazo de prescrição do procedimento contraordenacional, a violação do dever de depósito dos donativos em conta específica consumou-se com a prática do último depósito. Para além das causas interruptivas e suspensivas previstas no RGCO, a lei vigente à data da consumação desta contraordenação – Lei Orgânica n.º 2/2005, na sua versão originária – previa no artigo 22.º uma causa especial de suspensão: «a prescrição do procedimento pelas contraordenações previstas na Lei n.º 19/2003, de 20 de junho, e na presente lei suspende-se, para além dos casos previstos na lei, até à emissão do parecer a que se referem, consoante os casos, os artigos 28.º, 31.º, 39.º e 42.º». Ou seja, o tempo decorrido enquanto a causa suspensiva se mantiver não se conta para a prescrição; mas o tempo decorrido antes que a causa surja é contado, juntando-se ao tempo que correr depois de cessada. Tratando-se da responsabilidade contraordenacional por violação das regras de financiamento dos par- tidos políticos, o «parecer» a que se refere aquela norma é o que está previsto no artigo 31.º da Lei Orgânica n.º 2/2005, e que deve ser emitido no prazo de 20 dias após o decurso do prazo de 30 dias para os partidos políticos se pronunciarem sobre o «relatório» que ECFP elabora no prazo de seis meses a contar da data da receção das contas (artigos 30.º, n. os 4 e 5, da Lei Orgânica n.º 2/2005). Significa isto que o prazo de pres- crição permanece suspenso por seis meses e cinquenta dias, após a entrega das contas. Como as contas foram
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