TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

831 acórdão n.º 174/21 Além disso, as relações entre os partidos políticos e os seus associados, bem como as razões que fundamentam a existência de ilícitos disciplinares perseguidos através da disciplina partidária, são de índole totalmente diversa da que subjaz ao direito disciplinar no âmbito de relações laborais, quer estas tenham natureza pública, quer privada.» Ora, em matéria de diferenciação entre infração instantânea, infração permanente e infração conti- nuada, existe uma confluência entre os vários regimes sancionatórios, recorrendo-se de uma forma geral ao Direito Penal. 10. Na dogmática penal, tanto o carácter continuado como o carácter permanente da conduta do infra- tor implicam que só com a cessação da mesma tenha lugar o início do cômputo do prazo de prescrição do procedimento sancionatório aplicável. Para sustentar a tese do Conselho Nacional de Jurisdição do CDS-PP, seria necessário demonstrar que a infração que motivou a decisão impugnada pode ser classificada como continuada ou permanente. Todavia, encontramo-nos neste âmbito perante a impossibilidade de identificar no dispositivo da deci- são a especificação de qual o concreto dever estatutário violado pela arguida que motiva a aplicação da sanção disciplinar. Essa omissão dificulta, desde logo, a determinação da específica conduta que o Conse- lho Nacional de Jurisdição do CDS-PP considerou ser geradora da infração disciplinar. A este propósito, a decisão, citando o despacho n.º 4 do relator (que não foi junto aos autos), limita-se a referir que a «conduta da arguida foi altamente gravosa em termos de lesão do CDS-PP, tanto na vertente política, como na ver- tente económico-funcional» e que «decorre dos próprios Estatutos do CDS-PP que os cargos só podem ser exercidos por militantes» (cfr. E., v. e vi. , da decisão, fls. 13). Ora, consultando os deveres dos militantes do partido, constante do artigo 6.º dos Estatutos do CDS-PP, não é claro qual o dever aqui referido. Na alínea e) do n.º 1 do preceito enumera-se o dever de «defender a unidade e promover o fortalecimento do Partido» e na alínea b) do mesmo preceito «exercer os cargos para que foram eleitos ou designados». Neste último caso, os Estatutos parecem fazer referência ao dever de exercício de cargos partidários («para que foram eleitos ou designados» por órgãos do partido), pelo que não se vê como poderia ser aplicável no presente processo. 11. Independentemente dessa questão, a decisão refere, no dispositivo, que «a arguida Maria da Graça Amaral da Silveira, inusitada e injustificadamente, passou de deputada regional dos Açores do CDS-PP a deputada regional dos Açores como independente, tendo decidido aquela sua conduta sem qualquer concer- tação e/ou autorização de qualquer órgão do CDS-PP» (fls. 13, verso). Esta formulação permite identificar a atuação que é punida na decisão recorrida como sendo a passagem da arguida de deputada regional do grupo parlamentar do CDS-PP para independente. Não é possível identificar a imputação de uma conduta continuada – pois não existe uma pluralidade de atos singulares – nem permanente – pois não é referida qualquer omissão duradoura do cumprimento do dever estatutário alegadamente violado. A única ação que a decisão recorrida imputa à impugnante não pode deixar de ser considerada instantânea, tendo operado no momento em que a arguida «passou de deputada regional dos Açores do CDS-PP a deputada regional dos Açores como independente». Ainda assim, não é referido na decisão qual o momento em que ocorreu a referida passagem de depu- tada regional integrada no grupo parlamentar do CDS-PP a independente – a data ou datas em que se concretizou o facto constitutivo da alegada infração. Nesse âmbito, um dos elementos enviados ao Tribunal Constitucional, como anexo ao pedido de abertura de processo disciplinar contra a ora impugnante, formu- lado pelo Presidente do CDS-PP Açores, foi uma cópia da carta, datada de 14 de outubro de 2019, em que a deputada regional comunica à Presidente da Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores que deixaria de integrar o grupo parlamentar do CDS-PP, passando a exercer o seu mandato como independente a partir daquele dia (fls. 139). Assim sendo, considerando-se esta a atuação constitutiva de infração discipli- nar, o prazo prescricional teria terminado um ano depois. Nestes termos, a prescrição já teria necessariamente

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