TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

794 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 2.1. Deve sublinhar-se, em primeiro lugar, que para a procedência da reclamação não basta afastar qual- quer argumento de rejeição do recurso afirmado na decisão reclamada. A reclamação será procedente apenas se não se verificarem outros motivos – mesmo que não considerados naquela decisão – que igualmente a sustentem. O objeto da reclamação não tem, pois, uma delimitação temática restrita ao fundamento invocado para não admissão do recurso no despacho contestado. Pelo contrário, estando em causa uma eventual revogação da decisão de não admitir o recurso, ela tem, forçosamente, de se alargar a todas as condições ou pressupostos de cuja verificação depende a admissibi- lidade do recurso. A apreciação da reclamação pelo Tribunal Constitucional é, pois, autónoma e dirigida a todas aquelas condições ou pressupostos. Como, a tal propósito, se escreveu no Acórdão n.º 276/88 (disponível, tal como outros adiante indica- dos, em www.tribunalconstitucional.pt ), constituindo jurisprudência estabilizada do Tribunal: “[…] [O] que de todo o modo não parece ser de excluir é a possibilidade de o Tribunal Constitucional alargar […] o objeto da reclamação, quando os autos forneçam os elementos necessários para tanto – ou então, e mais precisa- mente, a possibilidade de alargá-lo na exata medida em que os elementos constantes dos autos o consintam. Apon- tam nesse sentido […] evidentes razões de economia processual tudo conjugado com o facto de se estar perante matéria do conhecimento oficioso do Tribunal [cfr. artigo 495.º Cód. Proc. Civil (que corresponde ao artigo 578.º do CPC atual)]. E claro que, a ser pelo menos assim, a decisão da reclamação, no caso de deferimento, fará caso julgado, não apenas quanto ao fundamento ou fundamentos de rejeição do recurso invocados no despacho reclamado, mas ainda quanto à verificação de todos os pressupostos de admissibilidade daquele de que o Tribunal tenha efetivamente conhecido. Nestas condições […], impõe-se na verdade averiguar se, a vista dos elementos oferecidos pelos presentes autos, ocorre algum outro fundamento, para além do já assinalado, que obste a admissibilidade do recurso neles inter- posto para este Tribunal. E impõe-se isso tanto mais, quanto, no caso, aqueles elementos são de molde a permitir uma indagação completa da verificação dos pressupostos de tal admissibilidade. […]”. A reclamação deve, pois, apreciar-se com o referido âmbito. 2.2. Cumpre notar, antes de mais, que (como justamente se aponta no parecer do Ministério Público neste Tribunal) a aplicação do CPC aos recursos interpostos para o Tribunal Constitucional é subsidiária, pelo que só será de convocar as respetivas normas em matérias que a LTC não regule. Pois bem, nos termos do artigo 70.º, n. os 2 e 3, da LTC, a prévia impugnação da decisão recorrida (mediante recurso ordinário ou, sendo caso disso, reclamação para a conferência) constitui condição aplicá- vel aos recursos interpostos ao abrigo das alíneas b) e f ) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, mas não aos recursos interpostos ao abrigo da alínea a) do mesmo número. Por outras palavras, o recurso ao abrigo da alínea a) é interposto diretamente para o Tribunal Constitucional, sem mediação dos atos impugnatórios comuns a que haja lugar (ficando suspensos os prazos para os recursos ordinários ou reclamações para a conferência, se for caso disso – artigo 75.º, n.º 1, da LTC). Assiste, pois, razão ao Ministério Público ao invocar que, no caso, o recurso para o Tribunal Constitu- cional não tinha de ser precedido de reclamação para a conferência (independentemente das razões invocadas quanto à falta de interesse em agir relativamente à reclamação para a conferência, razões essas que não rele- vam, visto que a dita condição não é aplicável). Resta, todavia, apreciar se, apesar da recusa formal de aplicação da norma contida na alínea j) do n.º 1 do artigo 4.º do Estatuto do Ministério Público, (se) o recurso tem utilidade (questão suscitada no parecer do Ministério Público neste Tribunal). Na verdade, como se pode ler no Acórdão n.º 819/14, “[…] no plano

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