TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

772 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa , vol. XXIX (1988), pp. 9 e segs. e Ana Paula Dourado, em O princípio da legalidade fiscal: tipicidade, conceitos jurídicos indeterminados e margem de livre apreciação , pp. 50 e segs., edição de 2007, Almedina). A fidelidade a esta exigência não deixa de ter justificação no princípio dos ideais liberais “no taxation without representation”, correspondente à ideia de que, sendo o imposto um confisco da riqueza privada, a sua legitimi- dade tem de resultar duma aprovação dos representantes diretos do povo, numa lógica de autotributação, a qual permitirá a escolha de tributos bem acolhidos pelos contribuintes e, por isso, eficazes (sobre uma mais aprofundada justificação da reserva de lei fiscal, vide Ana Paula Dourado, na ob. cit. , pp. 75-84). Foi esta a opção da Constituição de 1976, que deixou de fora desta exigência as taxas (sobre esta opção, vide o Parecer da Comissão Constitucional n.º 30/81, in Pareceres da Comissão Constitucional, 17.º volume, p. 91, da edi- ção da Imprensa Nacional-Casa da Moeda, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 205/87, e Casalta Nabais, em Jurisprudência do Tribunal Constitucional em matéria fiscal , no Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra n.º 69 (1993), pp. 407-408). Os termos do texto constitucional, antes da Revisão operada em 1997, suscitavam uma representação dicotó- mica dos tributos, pelo que a doutrina e a jurisprudência procuravam equiparar os apelidados tributos parafiscais à categoria dos impostos, ou das taxas, para concluírem se a sua criação estava ou não sujeita ao princípio da reserva de lei parlamentar. No que respeita às contribuições cobradas para a cobertura das despesas de pessoas coletivas públicas não territoriais, assumia algum relevo a posição de as incluir na categoria dos impostos, exigindo que a sua previsão constasse de lei aprovada pela Assembleia da República (vide, neste sentido, Alberto Xavier, em Manual de direito fiscal , vol. I, pp. 73-75, da edição de 1974, Jorge Miranda, na ob. cit. , pp. 22-24, e o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 1239/96, relativo à taxa devida à Comissão Reguladora de Produtos Químicos e Farmacêu- ticos). Esta qualificação visava combater o objetivo da subtração destas receitas ao regime clássico da legalidade tributária e do orçamento do Estado, considerado um “perigoso aventureirismo fiscal”. Contudo, a alteração introduzida na redação da alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição (anterior alínea i) , do n.º 1, do artigo 168.º), pela Revisão Constitucional de 1997, veio obrigar a uma reformulação dos pressupostos da discussão sobre a existência de uma reserva de lei formal em matéria de contribuições cobradas para a cobertura das despesas de pessoas coletivas públicas não territoriais. Onde anteriormente o artigo 168.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição dizia que “é da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: (…) i) Criação de impostos e sistema fiscal (…)”, passou a constar que “é da exclusiva competência da Assembleia da República legis- lar sobre as seguintes matérias, salvo autorização ao Governo: (…) i) Criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas (…). Para efeitos de submissão dos diversos tipos de tributo ao princípio da reserva de lei formal a nova redação do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, autonomizou a categoria das “contribuições financeiras”, ao lado dos impostos e das taxas, como já acima se referiu. O artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , da Constituição, passou a fazer depender da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, a «criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais con- tribuições financeiras a favor do Estado». Configuram-se assim dois tipos de reserva parlamentar: um relativo aos impostos, que abrange todos os seus elementos essenciais, incluindo a incidência, a taxa, os benefícios fiscais e as garantias dos contribuintes (artigo 103.º), outro restrito ao regime geral, que é aplicável às taxas e às contribuições financeiras, e relativamente às quais apenas se exige que o parlamento legisle ou autorize o governo a legislar sobre as regras e princípios gerais e, portanto, sobre um conjunto de diretrizes orientadoras da disciplina desses tributos que possa corresponder a um regime comum. Com esta alteração deixou de fazer qualquer sentido equiparar a figura das contribuições financeiras aos impos- tos para efeitos de considerá-las sujeitas à reserva da lei parlamentar, passando o regime destas a estar equiparado aos das taxas. O princípio da legalidade, relativamente às contribuições financeiras, tal como o das taxas, apenas exige que o parlamento legisle ou autorize o governo a legislar sobre as regras e princípios gerais comuns às diferentes

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