TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

744 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL IV. 2. Questão prévia: da admissibilidade e utilidade do presente recurso 4.ª No douto despacho de 23 de abril de 2020, no que concerne à apreciação da violação do princípio da não retroatividade da lei fiscal e do princípio da tutela da confiança e da segurança jurídica, considerou-se que o pre- sente recurso carece de utilidade quanto a estas questões, por se verificar uma diferença entre o critério normativo adotado pelo Supremo Tribunal Administrativo e o critério normativo sindicado pelo recorrente; 5.ª Todavia, no entender da recorrente inexiste qualquer diferença de critérios normativos, pois desde o início do presente processo que a recorrente tem invocado que o artigo 3.º do regime da CSB, quando interpretado no sentido de a CSB incidir sobre realidades consolidadas na esfera jurídica da recorrente a 31 de dezembro de 2013 e 2014, é contrária aos princípios sob análise, tendo o Tribunal a quo concluído pela aplicação deste preceito legal; 6.ª No caso vertente estão verificados todos os pressupostos de que depende a admissibilidade do presente recurso quanto às questões suscitadas nas alíneas a) a d) do requerimento de aperfeiçoamento; 7. ª Sem prejuízo, o presente recurso é manifestamente útil, pois destina-se a analisar a dimensão material dos referidos princípios constitucionais; 8.ª O princípio da não retroatividade, consagrado no artigo 103.º, n.º 3, da CRP, do ponto de vista material, visa preservar situações e garantias geradas no passado e relativamente às quais foram criadas legítimas expetativas pelos contribuintes, como, aliás, sucede in casu ; 9.ª No caso vertente, as realidades sobre as quais incide a CSB – determinados passivos e determinados produ- tos financeiros derivados – consolidaram-se na esfera jurídica da recorrente com o encerramento do exercício do ano anterior ao da liquidação e pagamento da CSB, tendo sido esta a questão colocada junto do Tribunal a quo e sobre a qual o Tribunal se pronunciou; 10. ª No acórdão recorrido o Tribunal a quo não põe em causa a data em que o passivo e o valor nocional dos instrumentos financeiros se consolidaram na esfera jurídica da recorrente, pelo que a circunstância de o Tribunal a quo fixar um facto tributário não determina a inutilidade do presente recurso, pois o que se pretende é saber se é constitucionalmente legítima a aplicação da norma ínsita no artigo 3.º do regime jurídico da CSB a uma situação material já consolidada na esfera jurídica da recorrente e para cuja consolidação não relevou a data em que o Tri- bunal a quo ficcionou o facto tributário; 11.ª No que concerne ao princípio da tutela da confiança e da segurança jurídica, corolário do princípio de Estado de Direito Democrático, consagrado do artigo 2.º da CRP, é aplicável mutatis mutandis todo o supra exposto, razão pela qual se conclui pela utilidade do presente recurso nesta parte; 12.ª Sem prejuízo, a doutrina e jurisprudência do Tribunal Constitucional têm vindo a reconhecer que nas situações de retroatividade imprópria a questão de constitucionalidade deve ser resolvida por este princípio (cfr. acórdão n.º 128/09 e Casalta Nabais, Direito Fiscal, 3.ª Edição, Almedina, Coimbra, p. 149); 13.ª Por fim, veja-se que o Tribunal Constitucional já se pronunciou em diversas ocasiões quanto ao momento gerador do facto tributário (cfr. Acórdãos n.º 18/11, n.º 310/12, n.º 382/12, n.º 617/12, entre outros); 14.ª Pelo que se conclui pela verificação de todos os pressupostos de admissibilidade do presente recurso quanto à apreciação das questões suscitadas nas alíneas a) a d) do requerimento de aperfeiçoamento; IV. 3. Do recurso de constitucionalidade Da qualificação jurídico-tributária da contribuição sobre o setor bancário (CSB) 15.ª Para apreciação das questões de constitucionalidade, cumpre proceder à qualificação jurídico-tributária da CSB (cfr. no sentido da análise e da qualificação jurídico-tributária do tributo em sede de recurso de constitucio- nalidade, entre outros, os acórdãos n.º 539/15, de 20.10.2015 [Taxa de Segurança Alimentar Mais]; e n.º 7/19, de 08.01.2019 [Contribuição sobre o Setor Energético]); 16.ª A CSB foi criada pelo artigo 141.º da Lei n.º 55-A/2010, com a finalidade “(...) de aproximar a carga fiscal suportada pelo sector financeiro (...) e de o fazer contribuir de forma mais intensa para o esforço de consolidação das contas públicas e de prevenção de riscos sistémicos (...).” (cfr. Relatório do Orçamento do Estado para 2011. outubro de 2010), tendo a sua vigência sido sucessivamente prorrogada para os anos seguintes;

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