TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
722 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (artigo 270.º, n.º 3, correspondente ao atual artigo 269.º, n.º 3). Tal norma implica tão-só ser inconstitucional a aplicação de qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa defender-se das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade […]. Por outro lado, este Tribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado a não aplicação direta e global aos proces- sos contraordenacionais dos princípios constitucionais próprios do processo criminal , desde logo o princípio da judiciali- zação da instrução consagrado no n.º 4 do artigo 32.º (neste sentido, cfr. o Acórdão n.º 158/92). Também já se salientou, no Acórdão n.º 278/99, que « a menor ressonância ética do ilícito contraordenacional subtrai-o às mais ‘rigorosas exigências de determinação válidas para o ilícito penal’ […], o que não deixará de se refletir no âmbito do contraditório .» […]” (itálicos acrescentados). Sobre a específica questão de inconstitucionalidade que lhe cumpria apreciar (a qual apresenta evidentes pontos de contacto com a que ora nos ocupa), o Tribunal pronunciou-se nos termos seguintes: “[…] Nos presentes autos, está em causa, como se disse, a interpretação da norma do n.º 2 no sentido de não con- ferir aos demais arguidos em processo contraordenacional e respetivos defensores o direito a assistir e participar na audiência oral prevista naquela norma. As recorrentes sustentam que esta interpretação normativa viola as garantias de audiência e de defesa e o prin- cípio do contraditório (artigo 32.º, n.º 10, da Constituição); o princípio do processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4, da Constituição); e o direito do arguido ao patrocínio forense (artigos 20.º, n. os 1 e 2, e 32.º, n.º 3, da CRP). O confronto da interpretação normativa com as citadas normas e princípios constitucionais não prescinde de uma prévia compreensão do regime infraconstitucional em causa. O artigo 26.º da LdC regula a fase da instrução do procedimento contraordenacional respeitante às ‘práticas proibi- das’ sancionadas na mesma lei. O procedimento contraordenacional aqui previsto é da competência da autoridade administrativa (AdC) e inicia-se com a abertura do inquérito – na sequência de notícia sobre eventuais práticas proibidas –, no qual se pro- movem as diligências de investigação necessárias à identificação dessas práticas, findando essa fase com a decisão de arquivamento ou com a decisão de dar início à instrução (artigos 24.º e 25.º, n.º 1, da LdC). Quando se conclua haver indícios suficientes de infração às regras de concorrência, a AdC dá início à instrução do processo, através da notificação da acusação (ou nota de ilicitude) à(s) empresa(s) arguida(s) para se pronunciar(em) sobre «as acusações formuladas e as demais questões que possam interessar à decisão do processo, bem como sobre as provas produzidas, e para que requeriam as diligências complementares de prova que considerem conveniente s» (artigos 25.º e 26.º, n.º 1, da LdC). Terminada a instrução, a AdC adota, com base no relatório do serviço instrutor, uma decisão final, na qual pode (i) ordenar o arquivamento do processo; (ii) declarar a existência de uma prática restritiva da concorrência, ordenando as providências necessárias à sua cessação; (iii) aplicar coimas e demais sanções previstas na LdC; e (iv) autorizar um acordo (cfr. artigo 28.º da LdC). Resulta do exposto que, no procedimento contraordenacional regulado na LdC, a fase da instrução visa assegurar os direitos de audiência e defesa da(s) arguida(s) no caso de esta(s) não se conformar(em) com o teor da nota de ilicitude (no mesmo sentido vide Miguel Mendes Pereira, Lei da Concorrência Anotada, Coimbra, 2009, 281). Tal como o correspondente artigo 50.º do Regime Geral das Contraordenações (RGCO, aprovado pelo Decre- to-Lei n.º 433/82, de 27 de outubro, com as alterações posteriores), o n.º 1 do artigo 26.º da LdC concretiza, no âmbito de procedimento contraordenacional por prática restritiva da concorrência, nesta fase de instrução (ou seja, de audição e defesa da(s) arguida(s)), o princípio do contraditório consagrado no n.º 10 do artigo 32.º da CRP , impondo a notificação às arguidas «para que se pronunciem por escrito sobre as acusações formuladas e as demais
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