TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
721 acórdão n.º 266/21 2.1. Como ponto de partida, importa revisitar a jurisprudência constitucional relativa às garantias em processo contraordenacional. Sobre esta matéria, pode ler-se no Acórdão n.º 141/19: “[…] 16. O enquadramento constitucional aplicável ao processo contraordenacional é […] distinto. No seu âmbito, as garantias processuais do arguido são constitucionalmente previstas no n.º 10 do artigo 32.º, que dispõe que «nos processos de contraordenação, bem como em quaisquer processos sancionatórios, são assegurados ao arguido os direitos de audiência e de defesa» (preceito introduzido pela Revisão Constitucional de 1989, como n.º 8 do mesmo artigo). Tal norma determina ser inconstitucional a aplicação de qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa defender-se das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e reque- rendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Por- tuguesa Anotada, tomo I, Coimbra: Coimbra Editora, 2005, p. 363). É esse o alcance da norma do n.º 10 do artigo 32.º da CRP, tendo sido rejeitada, no âmbito da revisão constitucional de 1997, uma proposta no sentido de se consagrar o asseguramento ao arguido, «nos processos disciplinares e demais processos sancionatórios», de «todas as garantias do processo criminal» (artigo 32.º B do Projeto de Revisão Constitucional n.º 4/VII, do PCP; cfr. o correspondente debate no Diário da Assembleia da República , II Série RC, n.º 20, de 12 de setembro de 1996, pp. 541 544, e I Série, n.º 95, de 17 de julho de 1997, pp. 3412 e 3466). Para além de gozar do referido direito de defesa constitucionalmente previsto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, como tem sido sublinhado na jurisprudência do Tribunal Constitucional, em processo de contraordenação, o arguido goza também do direito de acesso à tutela jurisdicional, genericamente consagrado no artigo 20.º da Constituição, com o consequente direito de impugnar judicialmente a decisão administrativa sancionatória (cfr., entre outros, os Acórdãos n. os 659/06, ponto 2.2., 45/08, ponto 2.2., 135/09, pontos 7. e 8.4., 299/13, ponto 5., e 373/15, ponto 2.). Com efeito, como o processo contraordenacional corre diante de entidade administrativa – i. e. fora da hierarquia juris- dicional –, o direito a impugnar uma decisão sancionatória nele proferida adquire uma relevância só compreendida dentro da tutela jurisdicional efetiva, e mais especificamente na garantia da impugnação dos atos administrativos sancionatórios perante os tribunais, consagrada no artigo 268.º, n.º 4, da Constituição. É nesse contexto, de garantia do direito de defesa previsto no artigo 32.º, n.º 10, da Constituição, e do direito de acesso à tutela jurisdicional, designadamente contra atos administrativos lesivos, consagrado nos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição, que deve ser analisada a conformidade constitucional de dado processo contraordenacional . […]” (itálicos acrescentados). No Acórdão n.º 73/12 – no qual não foi julgada inconstitucional a norma do artigo 26.º, n.º 2, da Lei da Concorrência de 2003 (aprovada pela Lei n.º 18/2003, de 11 de junho, entretanto revogada pelo artigo 99.º da Lei n.º 19/2012, de 8 de maio, que aprovou o regime atual), quando interpretada no sentido de não conferir aos demais arguidos e respetivos defensores, em processo contraordenacional, o direito a assistir e participar na audiência oral nela prevista [2] – o Tribunal salientou, designadamente: “[…] No Acórdão n.º 659/06, o Tribunal Constitucional pronunciou-se sobre o conteúdo dos direitos de audiência e defesa do arguido em processo contraordenacional, salientando o seguinte: «Com a introdução dessa norma constitucional (efetuada, pela revisão constitucional de 1989, quanto aos processos de contra ordenação, e alar- gada, pela revisão de 1997, a quaisquer processos sancionatórios) o que se pretendeu foi assegurar, nesses tipos de processos, os direitos de audiência e de defesa do arguido, direitos estes que, na versão originária da Constituição, apenas estavam expressamente assegurados aos arguidos em processos disciplinares no âmbito da função pública [2] Estabelecia esse n.º 2: “[a] audição por escrito a que se refere o número anterior pode, a solicitação das empresas ou associações de empresas arguidas, apresentada à Autoridade no prazo de cinco dias a contar da notificação, ser completada ou substituída por uma audição oral, a realizar na data fixada para o efeito pela Autoridade, a qual não pode, em todo o caso, ter lugar antes do termo do prazo inicialmente fixado para a audição por escrito.”.
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