TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

719 acórdão n.º 266/21 Y. O que redundaria numa interpretação desconforme com a constituição conquanto é consensual que a judi- cialização da instrução está excluída do processo contraordenacional – n.º 4 do artigo 32.º da CRP (ao invés, do pretendido pel[o] recorrente) – na senda da jurisprudência do Venerando Tribunal – Acórdão 158/92 – e por isso, igualmente, afastada pelo sentido da interpretação da norma do n.º 5 do artigo 25.º da Lei da Con- corrência, assente pelo tribunal a quo – que sufragamos – por ser a única que se compagina com o âmago do regime geral das contraordenações, bem como com as garantias constitucionais do processo contraordenacio- nal, ou seja, de acordo com o disposto no n.º 10 do artigo 32.º da CRP. Z. No âmbito de processos contraordenacionais, na fase da investigação e instrução, o direito de audição e defesa é garantido pelo artigo 50.º do RGCO, no qual se prevê que não é possível aplicar uma coima, ou uma sanção acessória, sem antes se ter assegurado ao arguido a possibilidade de, num prazo razoável, se pronunciar e, por tal forma, exercer o contraditório. AA. Com efeito, o princípio do contraditório, na fase de instrução do processo de contraordenação, como corolá- rio do direito de defesa, releva no sentido de não serem admitidas provas, nem adotadas pela entidade admi- nistrativa quaisquer decisões desfavoráveis a um sujeito processual, sem que este seja ouvido sobre a matéria, em termos de lhe ser dado previamente o direito de se pronunciar sobre todos os atos ou questões que possam colidir com a sua defesa. BB. E o direito ao contraditório encontra-se efetivamente garantido pelo facto de o visado e o seu mandatário poderem ter acesso ao depoimento prestado nas referidas diligências, que é integralmente reduzido a escrito, conforme o disposto no n.º 5 do artigo 25.º da Lei da Concorrência. CC. O que, de facto, releva para efeitos de apreciação da constitucionalidade da interpretação do vertido no acór- dão é saber se a interpretação que o Tribunal a quo levou a cabo do n.º 5 do artigo 25.º da Lei da Concor- rência – e que limita a presença dos mandatários no decurso das inquirições requeridas por outros visados no processo de contraordenação: (i) põe em causa o direito ao contraditório dos visados e (ii) se a limitação em causa é adequada, necessária e proporcional à proteção de segredos de negócio de demais visadas ou entidades terceiras. DD. Salvo o devido respeito, a resposta a tais questões não pode deixar de ser negativa quanto a pôr em causa o seu direito ao contraditório e afirmativa quanto a ser uma limitação adequada, necessária e proporcional. EE. Tampouco não é procedente o argumento do alegado elevado valor das coimas (que na verdade só assim se pode, ou não, considerar na determinação do montante concreto das coimas, atendendo à situação financeira do visado) para determinar um regime mais garantistico que careceria, para a sua efetivação, do recurso, por via da aplicação subsidiária, do n.º 2 do artigo 289.º e do n.º 4 do artigo 348.º, ambos do CPP. FF. Ora, salvo o devido respeito, esta linha de defesa está votada ao insucesso porquanto, por um lado, o legislador optou por enquadrar e classificar as infrações às regras da concorrência como contraordenações e evitar a cri- minalização de certos factos, sem os subtrair completamente a uma disciplina de Direito Público, sendo, em Portugal, as sanções àquelas infrações denominadas coimas e não sanções privativas de liberdade, decorrente da menor ressonância ética e do desvalor da ação das primeiras face às segundas. GG. Por outro lado, o valor das coimas está associado, entre outros, à gravidade e à culpa na violação do bem jurídico tutelado, in casu , a defesa da concorrência [valor constitucionalmente protegido como uma das prio- ridades do Estado nos termos do disposto na alínea f ) do artigo 81.º da CRP], pelo que, só por si, as infrações à Lei da Concorrência já encerram um elevado grau de censurabilidade o que ditará coimas mais elevadas. HH. Ademais este raciocínio (levado ao absurdo) nem sequer procede quanto às garantias do processo penal, ou seja, as penas mais elevadas (correspondentes a crimes mais graves) não acolhem um processo mais garantisti- co do que as penas aplicadas/previstas para os crimes mais leves (que podem ser penas de multa) é, portanto, um falso argumento! Logo, é manifestamente improcedente. II. Por fim, sequer podem aqui proceder os juízos de apropriação dos fundamentos a contrario do Acórdão 73/12 e demais jurisprudência invocada nas suas Alegações, conforme ensaiado pel[o] recorrente, por estarem em desconformidade com determinado no acórdão do TRL e a própria jurisprudência do referido Acórdão, não

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