TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
714 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 4. Com efeito, a fase organicamente administrativa realiza plenamente as finalidades do processo de contraor- denação, compreendendo uma fase de instrução obrigatória, na qual os direitos de defesa do arguido constitucio- nalmente consagrados assumem a sua plena eficácia. 5. A inquirição de testemunhas realizada a requerimento de qualquer empresa visada no processo de contraor- denação, a título de diligência complementar de prova, nos termos do disposto no artigo 25.º, n.º 1 e 3, da LdC, constitui uma diligência Instrutória de produção de prova (‘prova constituenda’), que não se confunde com a audição oral da empresa visada, prevista no artigo 26.º da LdC. 6. A inquirição de testemunhas constitui um elemento de prova que é produzido no próprio processo, após a apre- sentação das defesas pelas diversas empresas visadas – mediante pronúncia escrita ou audição oral –, numa fase em que ainda podem ser recolhidos elementos probatórios (inculpatórios ou exculpatórios) suscetíveis de provar factos alegados na nota de ilicitude ou nas correspondentes pronúncias . 7. A simples notificação a posteriori do conteúdo dos depoimentos prestados enquanto resultado das diligências de inquirição das testemunhas indicadas por outra covisada não acautela a real extensão do seu direito de defesa, nos termos do artigo 32.º, n.º 10, da CRP, tal como conformado pelos princípios do processo justo e equitativo inerentes ao Estado de Direito, consignados nos artigos 2.º e 20.º, n.º 1, da CRP, com destaque para o princípio de igualdade de armas entre acusação e defesa, porquanto é, por essa forma, negada ao visado a possibilidade de assistir e de intervir na diligência e, desse modo, exercer controlo efetivo sobre a legalidade do procedimento de produção de prova e de obter depoimentos favoráveis à defesa, mediante a realização de instâncias de contrainquirição . 8. Entende, pois, [o] recorrente que o tribunal a quo incorreu num erro de julgamento, na medida em que não concedeu prioridade metodológica à concretização do direito fundamental de defesa do arguido em processo contraordenacional, nos termos do artigo 32.º, n.º 10, da CRP, o qual se pauta por critérios de máxima efetividade e de restrição mínima, nos termos do disposto no artigo 18.º, n.º 2, da CRP. 9. Adicionalmente, considera ainda [o] recorrente que o reforço do pendor garantístico do processo de contraordenação em direito da concorrência se impõe, no plano constitucional, em virtude da gravidade das sanções suscetíveis de serem aplicadas às empresas visadas, que podem ser substancialmente superiores às molduras sancionatórias correspon- dentes aos crimes mais graves imputáveis a pessoas coletivas, em relação aos quais a ordem jurídica assegura as mais elevadas garantias de defesa. 10. Neste sentido, considera [o] recorrente que a aplicação subsidiária, no processo de contraordenação, do disposto nos artigos 289.º, n.º 2, e 348.º, n.º 4, ambos do CPP – com vista à afirmação do direito do visado de assistir e de intervir na inquirição de testemunhas requerida por outro covisado a título de diligência complementar de prova – corresponde à interpretação do regime legal que melhor se compatibiliza com a real extensão do direito de defesa do arguido em processo contraordenacional, consistindo assim na única interpretação do direito, dentre várias interpretações possíveis dentro dos parâmetros estabelecidos no artigo 9.º do Código Civil, que verdadeira- mente se encontra em conformidade com a Constituição. 11. Pelo exposto, conclui [o] recorrente que a norma constante do artigo 25.º, n.º 4 e n.º 5, da LdC, interpre- tado e aplicado no sentido perfilhado pelo tribunal a quo, segundo o qual uma empresa visada não tem o direito de assistir e de participar numa diligência de Inquirição de testemunhas, requerida por outra covisada a título de diligência complementar de prova, no decurso da Instrução na fase organicamente administrativa do processo de contraordenação, é inconstitucional, por violação do direito fundamental de defesa do arguido em processo de contraordenação, consagrado no artigo 32.º, n.º 10, da CRP, e materialmente conformado pelos princípio do processo justo e equitativo, consignados nos artigos 2.º e 20.º, n.º 1, da CRP. […]” (itálicos acrescentados). 1.2.2. O Ministério Público apresentou contra-alegações, assim concluindo: “[…] 1.ª) A questão de constitucionalidade, posta pel[o] recorrente, a resolver é esta: as normas jurídicas cons- tantes do artigo 25.º, n.º 4 e 5, do RJC, interpretadas no sentido de que uma empresa visada num processo de
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