TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
706 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Portuguesa, sendo certo que, como vimos, deste normativo não resulta a obrigação de o legislador adotar medidas benévolas perante condutas processuais desviantes das regras processuais previstas na lei. • O princípio da igualdade 8. Invoca ainda o recorrente que a norma em apreciação viola o princípio da igualdade, plasmado no artigo 13.º do diploma fundamental, uma vez que «perante a mesma situação de precariedade económica» concede-se, por um lado, «apoio judiciário» e, por outro lado, condiciona-se «a utilização de meios proces- suais ao pagamento de multa». Entende o recorrente que a mesma situação de «carência económica» reclama «tratamento igual», pelo que, em cumprimento do princípio da igualdade, a par da concessão do apoio judi- ciário deve ser também reconhecida a «isenção do pagamento de multa pela prática de ato processual nos três dias úteis subsequentes ao termo do prazo». Por fim, refere o recorrente que «a desigual situação económica da parte em face da outra que dispõe de meios económicos reclama para a parte que se encontra em situação de insuficiência económica e para que esta parte não veja denegado o seu direito de acesso aos Tribunais, que lhe seja reconhecida a isenção do pagamento da multa em causa». Antes do mais, importa aqui reiterar que o pagamento da multa em causa nestes autos não resulta de um qualquer intuito do legislador de condicionar a normal utilização dos meios processuais ao dispor das partes, antes corresponde à contrapartida do uso de tais meios sem observância das regras de diligência e boa-fé proces- suais, justificada no obstáculo que tal conduta representa para o regular funcionamento do sistema de justiça. O princípio da igualdade, tal como se asseverou no Acórdão n.º 96/05 deste Tribunal, «postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais (proibindo, inversamente, o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais)». Também a respeito deste princípio, o Acórdão n.º 159/19 plasmou, com relevo para a presente apreciação, o seguinte: «Sublinhe-se ainda que, como se afirmou no Acórdão n.º 370/07, o qual seguiu, no mesmo sentido, os Acór- dãos n. os 157/88 e 187/90, “a vinculação jurídico-material do legislador ao princípio da igualdade não elimina a liberdade de conformação legislativa, pertencendo-lhe, dentro dos limites constitucionais, definir ou qualificar as situações de facto ou as relações da vida que hão de funcionar como elementos de referência a tratar igual ou desigualmente”. Continua o mesmo aresto, afirmando que “aos tribunais, na apreciação daquele princípio, não compete verdadeiramente «substituírem-se” ao legislador, ponderando a situação como se estivessem no lugar dele e impondo a sua própria ideia do que seria, no caso, a solução “razoável”, “justa” e “oportuna” (do que seria a solução ideal do caso); compete-lhes, sim “afastar aquelas soluções legais de todo o ponto insuscetíveis de se cre- denciarem racionalmente” (acórdão da Comissão Constitucional, n.º 458, Apêndice ao Diário da República , de 23 de agosto de 1983, p. 120)”. Em conclusão, ainda nas palavras do Acórdão que se vem de citar, “pode dizer-se que a caracterização de uma medida legislativa como inconstitucional, por ofensiva do princípio da igualdade, dependerá, em última análise, da ausência de fundamento material suficiente, isto é, de falta de razoabilidade e consonância com o sistema jurídico”». Dito isto, começa-se por esclarecer os termos da comparação estabelecida pelo recorrente, que não parte do confronto entre duas situações de facto distintas, isto é, não se traduz no cotejo da sua posição de carência eco- nómica com a de sujeitos processuais que dispõem de meios económicos ou, até, com a dos que beneficiam do apoio judiciário por causa dessa carência. Ao invés, o recorrente defende que, face à situação de insuficiência de meios económicos verificada quanto ao mesmo sujeito processual, o princípio da igualdade impõe ao legislador a consagração, para essa mesma situação de facto, de medidas iguais, tais como a concessão do apoio judiciário e, cumulativamente, a «isenção» do pagamento de multas processuais devidas na mesma ação, por só assim se alcançar, nas palavras do recorrente, a garantia de acesso ao direito em termos equitativos. Como vimos, a garantia do acesso ao direito e aos tribunais é, no plano legislativo ordinário, essencial- mente prosseguida pela Lei n.º 34/2004, de 29 de julho, sendo certo que o sistema de acesso ao direito e aos
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