TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
704 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL «A multa prevista nos n. os 5 e 6 do artigo 145.º é, por conseguinte, uma contrapartida exigida pelo legislador à parte que não cumpriu um prazo processual extintivo, para poder beneficiar da «regalia» de o poder praticar fora do respetivo prazo, nada tendo a ver com as custas do processo. Efetivamente, as custas em processos cíveis compreendem apenas a «taxa de justiça (antes, imposto de justiça) e os encargos – Código das Custas Judiciais, artigo 1.º, n.º 2. A taxa de justiça é uma quantia em dinheiro cujo montante é fixado tendo em atenção o valor e/ou a natureza do processo por forma a constituir a contrapartida para o Estado da atividade processual desenvolvida e os encargos são essencialmente as despesas efetuadas durante o processo, quer as adiantadas pelo Cofre Geral dos Tribunais (hoje as despesas com o papel, franquias postais e expediente estão incluídas na taxa de justiça), quer as realizadas com a retribuição de pessoas intervenientes no processo, quer ainda aquilo que a parte vencedora tem a haver da parte vencida, a título de custas de parte e de procuradoria (artigo 65.º do Código das Custas Judiciais). Ora, a multa prevista no artigo 145.º do Código de Processo Civil não se insere em nenhum destes elementos compreendidos no conceito legal de custas judiciais. E, tanto assim é, que tal a multa é mesmo devida por entidades que estão legalmente isentas de custas (cfr. acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 15 de janeiro de 1982, in Coletânea de Jurisprudência, 1982, tomo 1.º, p. 152). Por outro lado, o benefício de assistência judiciária, de acordo com o preceituado na Base I da Lei n.º 7/70, de 9 de junho, abrange «a dispensa, total ou parcial, de preparos e do prévio pagamento de custas, e bem assim, o patrocínio oficioso». Verifica-se portanto, que não se inserindo o pagamento da multa prevista no artigo 145.º dentro do conceito legal de custas, não está também abrangido pelo benefício da assistência judiciária, pelo que a reclamante deveria pagar a multa em causa para que o seu requerimento de fls. 438 pudesse ser admitido e permanecer nos autos.» Na decisão sumária proferida no Processo n.º 905/98, posteriormente confirmada pelo Acórdão n.º 37/99, apreciando-se a conformidade com a Constituição da República Portuguesa da norma constante do artigo 145.º, n.º 6, do anterior CPC, fundamentou-se que, face ao «princípio do acesso à justiça (cfr. artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa), o legislador entendeu não inviabilizar de pronto a prática de atos processuais fora do prazo, dando às partes a possibilidade de o fazer, ainda que sujeitas – naturalmente – ao pagamento de multa», que surge como «o preço da extensão do direito de acesso à justiça, ainda que à custa do atraso na administração da mesma». Notou ainda, com relevo, que a «gradação do montante da multa (cfr. artigo 145.º, n. os 5 e 6, do Código de Processo Civil)», que tanto maior é quanto é o atraso na prática do ato, «num crescendo que, não sendo desproporcionado, antes visa responsabilizar as partes nas suas vestes de atores processuais diligentes», é «uma clara expressão normativa» da necessidade de articulação do princípio da boa administração da justiça», enquanto «princípio fundamental num Estado de direito democrático – artigos 2.º, 20.º, n. os 4 e 5, da Constituição da República Portuguesa –», e o «princípio da tutela jurisdicional efetiva». Tais considerações permitiram que ali se asseverasse que «o instituto da multa previsto no artigo 145.º, n.º 6, do Código de Processo Civil» não se configura «como uma restrição (despro- porcionada) ao direito de acesso à justiça». Mais incisivo foi o Acórdão n.º 723/98, no qual se apreciou a inconstitucionalidade do «artigo 15.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 387-B/87, de 29 de dezembro, “ao não abranger a dispensa do pagamento das multas, aplicáveis nos termos do artigo 145.º, n.º 6, do CPC», por violação do «artigo 20.º da CRP» e do «artigo 18.º, n. os 1 e 2 da CRP». Aí se afirmou que «as multas não integram o “preço” do serviço de justiça, não constituem a contrapartida da prestação de qualquer serviço público», antes têm «carácter sancionatório, são sanções processuais, de natureza pecuniária, impostas à parte que, no decurso do processo, não cumpre adequada e tempestivamente os seus deveres». Sobre a «dificuldade de acesso à justiça no caso de não paga- mento da multa devida», sustentou que «tal dificuldade não é diretamente relacionada com a falta de meios
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