TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
690 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Carece, por isso, de qualquer racionalidade o resultado de facto a que conduz a aplicação indistinta do factor “antiguidade na categoria”, ao caso dos oficiais de justiça titulares de curso superior adequado, consubstanciando uma diferenciação de tratamento, desprovida de fundamento razoável, em violação do princípio da igualdade no acesso à promoção na carreira, ínsito nos artigos 13.º e 47.º, n.º 2, CRP e no artigo 21.º, n.º 1, da CDFUE, sendo que inexiste, nesse caso, qualquer outra circunstância que se possa considerar como justificativa da inversão do posicionamento dos escrivães de direito em relação aos escrivães e técnicos de justiça auxiliares, potenciada pela aplicação deste critério. (...) Nestes termos – e atento o disposto nos artigos 3.º, n.º 3, 204.º, 277.º, n.º 1, da CRP e 1.º, n.º 2, do ETAF –, no caso dos escrivães de direito titulares de curso superior adequado, é de recusar a aplicação das normas do artigo 41.º, n. os 1 e 3, do EFJ, na parte relativa ao factor “A” (antiguidade na categoria), com fundamento na sua incons- titucionalidade, por violação dos princípios da igualdade e da justiça relativa no acesso à promoção na carreira, consagrados nos termos das disposições conjugadas dos artigos 13.º e 47.º, n.º 2, da CRP, repondo-se a igualdade pela desaplicação do segmento normativo “na categoria”». Importa então, tendo em mente a forma de estruturação e escalonamento global da carreira de oficial de justiça, assim como os termos em que é efetivada a sua progressão e os seus princípios retores, verificar se a referida componente da fórmula de cálculo, posta em crise, se mostra contrário à Lei Fundamental, isto é, saber se o facto de o fator antiguidade atender unicamente ao tempo de exercício na última categoria, e não a todos os anos de serviço, tanto nos casos previstos na alínea b) , como nos casos da alínea a) do n.º 1 do artigo 10.º do EFJ, permitindo que oficiais de justiça com menor antiguidade e menor experiência profissional ascendam à categoria de secretário de justiça, em detrimento de outros oficiais de justiça, ofende o princípio da igualdade no acesso à promoção na carreira na função pública. 12. Haverá, para tanto, que começar por enunciar o conteúdo e alcance do invocado parâmetro de constitucionalidade, concretização do princípio da igualdade, estruturante do Estado de direito democrático. Dispõe o n.º 2 do artigo 47.º da Constituição que «Todos os cidadãos direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso», proposição que não se limita à con- sagração universal do direito de ingressar na função pública: vincula igualmente o legislador, na modulação estatutária das várias carreiras integrantes da função pública, ao respeito por um conjunto de direitos profis- sionais, entre os quais o direito à progressão na carreira. Tal como entendem J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, «Embora a norma refira expressamente apenas o direito de acesso, o âmbito normativo abrange também o direito a ser mantido nas funções e o direito às promoções dentro da carreira» (cfr. C onstituição da República Portuguesa – Anotada, 4.ª edição, vol. I, Coimbra, 2007, p. 660). Esse tem sido também o sentido da jurisprudência constitucional. A título de exemplo, afirma-se no Acórdão n.º 562/03 que o direito à promoção na carreira integra o núcleo do direito de acesso à função pública, não sem explicitar que: «Não quer isto dizer que exista sempre um direito à progressão na carreira – ele não existirá, desde logo, a partir do momento em que o funcionário tenha atingido uma certa categoria ou tenha esgotado a progressão na carreira, bem como naqueles casos, embora excecionais, em que uma certa categoria funcional se não enquadra numa carreira. De todo o modo, o que parece indiscutível é que, aí onde esteja previsto um direito à promoção – progressão na carreira – ele se há-se configurar como um direito profissional». Para além disso, resulta dos Acórdãos n. os 157/92 e 683/99 que o direito a progredir nas carreiras exis- tentes nos quadros respetivos integra igualmente uma forma de realização pessoal através do trabalho, que a Constituição garante a todos os trabalhadores. Também no Acórdão n.º 355/99, após se reafirmar que o direito à progressão na carreira é decorrência do direito de acesso à função pública, é sublinhado que «O facto de a progressão na carreira se incluir no núcleo essencial do direito de acesso à função pública deriva da proteção que o legislador constitucional dispensa ao trabalho, em condições de estabilidade e como forma de
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=