TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

667 acórdão n.º 178/21 Perante a diferença de valores atrás desenhada, seria necessário encontrar razões especialmente relevantes que justificassem tal drástica inversão das grandezas relativas entre os valores de custas e os valores das ações. Ora, as diferenças não encontram, certamente, explicação na natureza e objeto do processo que o TAD teve de apreciar, que, para o efeito, não apresenta particularidades dignas de nota. Também não se encontra justificação para tal resultado em razões atinentes à racionalidade do sistema. Se, por exemplo, é aceitável que, no sistema de custas nos tribunais judiciais, uma ação com o valor de € 25 fique sujeita a taxa de justiça de 1 Unidade de Conta (1.ª linha da tabela I-A anexa ao Regulamento das Custas Processuais), por não ser exigível ao legislador desdobrar os escalões ao ponto de acorrer à proporção em casos de justiça meramente “bagatelar”, é por demais evidente que os valores em causa nos presentes autos transcendem essa realidade. Basta pensar que o Regulamento Disciplinar das Competições Organizadas pela Liga Portuguesa de Futebol Profissional em vigor à data dos factos previa diversas infrações com multas com mínimos de 10 Unidades de Conta – e mesmo 2, 3 e 5 Unidades de Conta –, mesmo sem levar em linha de conta os fatores de pon- deração que as podem fazer diminuir (artigo 36.º), a que o sistema de custas poderá ter de dar adequada resposta in concreto. Pois bem, se “[…] tanto as custas dos processos judiciais como as custas dos processos arbitrais (necessá- rios) condicionam o exercício do direito de acesso aos tribunais (artigo 20.º da Constituição), categoria que, por expressa determinação constitucional, inclui os tribunais estaduais e os tribunais arbitrais (artigo 209.º, n. os 1 e 2, da mesma Lei Fundamental), cuja atividade material participa dessa teleologia garantística comum […]” e se, por esse motivo “[…] o critério de determinação do respetivo valor não pode conduzir, num e noutro caso, a montantes manifestamente desproporcionados à complexidade da causa e à utilidade que as partes dela retiram, sob pena de violação das exigências de necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido restrito também aplicáveis neste domínio normativo […]” (Acórdão n.º 543/19), então, perante a apontada desproporção, que é manifesta e intensa, não poderá deixar de se concluir que institui um condi- cionamento injustificado ao recurso à justiça arbitral desportiva. Cumpre acrescentar, por fim, que, se o valor de uma ação, a sensivelmente metade do valor das custas (sem razões que o justifiquem) não tiver a virtualidade de mostrar a desproporção do custo do acesso à jus- tiça, não se vê então que outros fatores ou elementos o poderão mostrar melhor e mais objetivamente. Tudo para concluir que se impõe – neste segundo momento de ponderação da proporcionalidade in concreto – um juízo de censura jurídico-constitucional da norma sub judice , por violação do disposto nos arti- gos 20.º, n.º 1, e 18.º, n.º 2, da Constituição (compreendidos os referidos parâmetros com o preciso sentido que lhes foi traçado no Acórdão n.º 543/19). O recurso é, pois, procedente quanto à primeira questão de inconstitucionalidade, determinando-se a remessa dos autos ao Tribunal Central Administrativo Sul, a fim de que este reforme a decisão em conformi- dade com a presente decisão sobre a questão da inconstitucionalidade (artigo 80.º, n.º 2, da LTC). 2.3. O recorrente pretende, ainda, que seja proferido um juízo no sentido da inconstitucionalidade da norma contida no “[…] artigo 2.º, n. os 1 e 5, da Portaria n.º 301/2015, de 22 de setembro, conjugado com a tabela constante do Anexo I (1.ª linha) dessa mesma Portaria, por violação do princípio da proporcionalidade (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da CRP) e do princípio da tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º, n.º 1, da CRP), no sentido de que a fixação das custas finais pela intervenção do Tribunal Arbitral do Desporto, em ações de valor inferior a € 30 000,01, é automática, não permitindo a sua conformação pelo julgador em função das especificidades do caso concreto”. Entende-se que, relativamente a esta segunda pretensão, o Tribunal não deve conhecer do objeto do recurso, não só porque é o próprio recorrente a qualificar essa pretensão como subsidiária (ponto 22. e con- clusão J. das alegações de recurso), mas principalmente porque a utilidade do recurso, vista pela sua reper- cussão no sentido da decisão recorrida, resulta plenamente alcançada com o julgamento da primeira questão, não restando ulteriores efeitos a atingir com o julgamento da segunda.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=