TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

652 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL EE. Transmitindo a ideia de que o critério prevalecente para o apuramento das custas processuais arbitrais decorre, na verdade, não do valor e/ou da complexidade da causa, mas da concreta capacidade económica dos poten- ciais litigantes. FF. Nesta senda, basta compulsar os dados disponíveis no site do Tribunal Arbitral do Desporto, para perceber que a larga maioria das ações de arbitragem necessária foram intentadas pelos 4 principais clubes desportivos portugueses (A., B., C. e D.) ou pelos seus agentes desportivos (dirigentes, atletas e outros colaboradores), representando um total de 57% dessas ações – verificando-se que no ano 2017, 2/3 das ações foram intenta- das pelos chamados 3 grandes (A., B. e C.). GG. E é assim, não porque a generalidade dos demais clubes e agentes desportivos não se tenham deparado com numerosas situações / condenações em que poderiam ter interesse em recorrer para o TAD, mas simplesmen- te porque não se podem dar ao luxo de arcar com o risco das exorbitantes custas do TAD. HH. Analisadas as estatísticas publicitadas no endereço de internet do Tribunal Arbitral do Desporto, resulta evi- dente e incontornável uma única conclusão: recorre para o TAD apenas e só quem, à partida, tem condições económicas para o fazer! II. Havendo, portanto, todo um larguíssimo número de clubes e de agentes desportivos – na ordem dos milhares – que, por razões de incapacidade económica, estão pura e simplesmente à margem da tutela jurisdicional “oferecida” pelo TAD. JJ. Tudo o que é claramente demonstrativo do efeito injustificadamente inibidor que a forma de apuramento do valor das custas em litígios submetidos ao TAD tem no acesso à justiça arbitral necessária. Ademais, KK. Repetindo-se invariavelmente as partes envolvidas nos litígios, o financiamento do Tribunal Arbitral do Des- porto acaba por decorrer (unicamente) da ação de algumas poucas entidades, o que obviamente compromete as condições de independência e imparcialidade em que funciona este Tribunal. LL. O que se tem concretamente verificado é uma sucessiva e sistemática nomeação dos mesmos árbitros pelas partes, pondo assim em causa a garantia de um estatuto de efetiva autonomia económico-financeira em rela- ção a todas as partes potencialmente envolvidas nos litígios que compete àquele Tribunal decidir. MM. De facto, de 2016 a 2019, há uma sistemática nomeação de 4 árbitros (num universo de várias dezenas: atualmente são 40), designadamente, dos árbitros E., F., G. e H.. NN. Se um mesmo árbitro é nomeado dezenas de vezes pela mesma parte, como efetivamente vem sucedendo, quer do lado dos demandantes quer do lado dos demandados, a remuneração a que terá direito no termo do processo constituirá um forte incentivo a decidir em função dos interesses da parte que o indicou ou que tem por hábito indicá-lo. OO. Trata-se, pois, de um sistema altamente perverso, que favorece um seguidismo decisório alinhado com as par- tes, o que representa a mais lídima denegação dos princípios da independência e da imparcialidade. Princípios esses que não poderão ser invocados para justificar o atual sistema de custas do TAD. PP. Face ao exposto, impõe-se a conclusão de que as normas conjugadamente aplicadas in casu para fixar o valor das custas finais (art. 2.º, n. os 1, 4 e 5, conjugado com a tabela constante do Anexo I (1.ª linha), da Portaria n.º 301/2015, articulado ainda com o previsto nos artigos 76.º/1/2/3 e 77.º/4/5/6 da Lei do TAD) são inconstitucionais por violação do princípio da proporcionalidade (art. 2.º da CRP) e do princípio da tutela jurisdicional efetiva (art. 20.º-1 e 268.º-4 da CRP). Sendo certo que, QQ. Apelando-se ao critério avançado pelo Tribunal Constitucional no Ac. n.º 543/2019 – “os eventuais excessos (…) devem ser sinalizados caso a caso em função do concreto valor processual da causa e do concreto valor das custas pro- cessuais cobradas” – é forçoso reconhecer que no caso aqui em sindicância, sendo os valores das custas muito superiores ao valores das ações arbitrais, o regime legal conduz a resultado tributário desproporcionado, enfermando por isso de inconstitucionalidade, fundada na violação dos princípios da proporcionalidade e da tutela jurisdicional efetiva.

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