TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
651 acórdão n.º 178/21 capacidade contributiva do cidadão médio, desincentivando a que, apenas por via disso, se deixe de recorrer aos meios de tutela ao dispor. S. Direito cuja força normativa se intensifica quando em causa está o exercício de um poder sancionatório públi- co por parte de órgãos de natureza administrativa: a possibilidade de recorrer a um tribunal para sindicar a legalidade de uma condenação administrativa é conditio sine qua non da solvabilidade constitucional de um processo sancionatório administrativizado. T. Os Tribunais Arbitrais – independentemente da sua qualificação como voluntários ou necessários – são pers- petivados, mormente pela jurisprudência constitucional (Ac. n.º 230/86; Ac. n.º 230/13 e Ac. n.º 781/13), como verdadeiros e próprios tribunais, submetendo-os às mesmas exigências formais, orgânicas e materiais a que submetem os Tribunais do Estado. U. Sendo de aplicar às custas dos processos arbitrais necessários o essencial da parametrização constitucional que a jurisprudência constitucional tem desenvolvido em matéria de custas judiciais. V. Precisamente por isso, o acesso aos tribunais arbitrais não pode, desde logo, ser denegado por insuficiência de meios económicos; nem as custas dos processos podem atingir valores de tal forma elevados que inviabilizem, na prática, o acesso a esse serviço de justiça. W. Quer se trate ou não de um exercício privado da função jurisdicional, que o que está em causa é sempre a prestação de um serviço público de justiça, não podendo, nesta senda, sobrepor-se aos concretos interesses legalmente protegidos dos litigantes, critérios relacionados exclusivamente com o particular modo de funcionamento do Tribunal. X. É precisamente a natureza obrigatória e condicionadora deste tipo de processos arbitrais que justifica a aplicação de parâmetros de conformação material que efetivamente garantam um mínimo de proporcionalidade, obstando à conformação de soluções excessivamente onerosas (e por essa via necessariamente restritivas) e aproximando-se, o mais possível, dos valores dos custos impostos no acesso à justiça estadual. Y. Ao contrário da arbitragem voluntária, em que pode fazer sentido invocar critérios de celeridade e natureza economicista para justificar um incremento das custas processuais (face ao tribunais estaduais), no caso da arbitragem necessária, o concreto benefício que as partes retiram do serviço de justiça prestado pelo TAD – ainda que se possa entender ser, em termos de celeridade e especialização, superior ao oferecido nos tribunais administrativos comuns – é um benefício forçado (subtraído à livre vontade das partes). Z. Sendo, como tal, indiscutível que a arbitragem necessária – por não relevar da autonomia de vontade das par- tes – apresenta contornos distintos dos tribunais arbitrais voluntários, não podendo ser invocados os mesmos fundamentos justificativos nuns e noutros. AA. A circunstância de a justiça desportiva exigir um mecanismo alternativo de resolução de litígios que se coadune com as suas especificidades de celeridade e especialização, não pode assumir-se de tal maneira onerosa que resulte numa impossibilidade real de ver sindicadas as decisões sancionatórias proferidas por órgãos discipli- nares com poderes de natureza pública. BB. Sob pena, de redundar num manifesto caso de restrição constitucionalmente inadmissível do direito fun- damental à tutela jurisdicional efetiva. Contribuindo, por seu turno, para a criação e perpetuação de uma verdadeira e intolerável “«Justiça» para ricos”! CC. Considerando os postulados e as premissas fundamentadoras que sustentaram o sentido da decisão de não inconstitucionalidade recentemente tomada por este Tribunal Constitucional, também nesta 1.ª Secção, no recente Ac. n.º 543/2019, haverá necessariamente que confrontá-los com dados empíricos, retirados da expe- riência concreta da jurisdição do Tribunal Arbitral do Desporto. DD. Aliás, partir do pressuposto – como o faz este Tribunal nessa decisão – de que é razoável exigir um maior custo (inerente à prestação de um serviço rápido e especializado) porque os operadores do sistema desportivo têm condições económicas para tanto, assim se presumindo a maior capacidade económica dos litigantes, consti- tui, salvo o devido respeito, uma visão totalmente desgarrada da realidade, que subverte, de forma intolerável, os mais basilares princípios fundamentais constitucionalmente consagrados.
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