TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

65 acórdão n.º 123/21 remissão introduzida no n.º 3 do artigo 134.º e no n.º 3 do artigo 135.º deve ter-se por feita para todo o conjunto, articulado e complexo, de condições materiais, procedimentais e formais estabelecidas no Decreto n.º 109/XIV. Torna-se, assim, claro que a não punibilidade das condutas tipificadas nos artigos 134.º e 135.º do Código Penal não prescinde da verificação de todas essas condições, no momento e pela forma estabele- cidos para a respetiva comprovação, tal como a responsabilidade disciplinar só pode ser excluída, nos termos do artigo 21.º do mesmo Decreto, quando seja possível demonstrar o cumprimento de «todas as condições e deveres estabelecidos na presente lei». A argumentação é válida também no que respeita ao novo n.º 2 do artigo 139.º do Código Penal, que determina a não punibilidade da conduta «de acordo com o n.º 3 do artigo 135.º». Seja enquanto pressuposto de exclusão da tipicidade da conduta, com base no seu diferenciado signifi- cado social, seja enquanto condição da eficácia do consentimento, no plano da exclusão da ilicitude, a carac- terização da situação clínica daquele que formula o pedido de antecipação de morte medicamente assistida constitui um dos requisitos de que depende o afastamento da responsabilidade criminal, que de outra forma impenderia sobre os profissionais de saúde intervenientes no procedimento. Até porque o consentimento exigido é um consentimento qualificado – não apenas por assumir neces- sariamente a forma de um pedido sério e livre, mas porque sujeito ele próprio a exigências intensificadas de esclarecimento e de reiteração –, tais requisitos encontram-se sujeitos a um procedimento formal de averi- guação, que culmina no parecer da CVA. Com efeito, e como se referiu já, a verificação dos pressupostos materiais essenciais de não punibili- dade da conduta (os elementos da previsão da norma), estabelecidos no n.º 1 do artigo 2.º depende de um procedimento complexo (artigos 3.º a 7.º), vertido no RCE, em que deve figurar o acervo documental – o processo administrativo – de suporte de todas as etapas procedimentais relevantes (cfr. o artigo 15.º) e que contém, entre outros elementos, a expressão escrita e reiterada da vontade da pessoa; as pronúncias emitidas pelos intervenientes no procedimento quanto ao cumprimento dos requisitos estabelecidos no n.º 1 do artigo 2.º, incluindo o parecer emitido pela CVA a que se refere o artigo 7.º do Decreto n.º 109/XIV; e ainda a declaração escrita quanto ao dia, hora, local e método a utilizar para a concretização da decisão do requerente (cfr. o artigo 8.º, n. os 1 e 3). Por sua vez, os artigos 9.º, 12.º e 17.º, n.º 2, estabelecem condições adicionais que devem ser observadas no momento da administração dos fármacos letais – entre as quais res- salta, pela sua relevância, a confirmação da vontade do doente na presença de testemunhas, a que se refere o n.º 2 do artigo 9.º. Uma vez emitido parecer favorável pela CVA, a exclusão da responsabilidade criminal dos profissio- nais de saúde que diretamente intervenham no momento da concretização da decisão do doente passará a depender exclusivamente da observância das normas que regulam a conduta que produz ativa e diretamente a morte do paciente – caso do homicídio a pedido da vítima – ou que auxilia o paciente a produzi-la por ato seu – caso da ajuda ao suicídio. Tais normas encontram-se previstas nos artigos 8.º, 9.º, 12.º e 17.º, n.º 2, do Decreto. Assim, na primeira situação, a responsabilidade penal será afastada se o ato que provoca a morte for praticado por profissional de saúde e consistir na administração de fármacos letais no dia, hora e local pre- viamente combinados entre o doente e o médico orientador, desde que: o primeiro, depois de esclarecido pelo segundo sobre os métodos disponíveis para a antecipação da sua morte, tenha optado, através de escrito datado e assinado pelo próprio, pela heteroadministração das referidas substâncias; imediatamente antes de esta se ter iniciado, o primeiro tenha confirmado junto do segundo a vontade de antecipar a sua morte, na presença de, pelo menos, uma testemunha; e a administração dos fármacos letais tenha sido realizada pelo médico orientador ou com o mesmo presente. Já na segunda hipótese, a ajuda ao suicídio não será punível se levada a cabo por profissional de saúde através da disponibilização de fármacos letais no dia, hora e local previamente combinados entre o doente e o médico orientador, desde que: o primeiro, depois de esclarecido pelo segundo sobre os métodos disponí- veis para a antecipação da sua morte, tenha optado, através de escrito datado e assinado pelo próprio, pela

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