TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

640 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL proporcionalidade da medida, tendo em vista a realização dos fins por ela prosseguidos e a prevalência do interesse preponderante. Desta forma, o incidente da quebra de segredo contempla uma dupla apreciação: i) a apreciação prévia no tribunal de primeira instância sobre a necessidade da quebra do dever de sigilo diante da verificação da legitimidade da escusa; e ii) a apreciação subsequente, pelo tribunal superior, diante dos interesses em con- fronto, sobre a justificação para ordenar o levantamento do segredo, designadamente a imprescindibilidade da informação para a administração da justiça. A resolução das duas questões foi intencionalmente separada pelo legislador que reservou ao tribunal superior, um tribunal especialmente qualificado em razão da hierarquia, o juízo sobre a prevalência entre os interesses em conflito. A estrutura do incidente em dois graus, sendo o tribunal superior a instância que decide a quebra do segredo introduz uma solução funcionalmente adequada aos fins do processo, a que não são alheias também razões de celeridade na prossecução da justiça – que representam um interesse público de especial relevância. Neste sentido, não procede a acusação de que este regime impõe uma limitação processual desproporcional no acesso aos tribunais, na medida em que a sua estrutura em dois graus permite prosseguir as finalidades que fundamentariam o recurso, neste contexto. Nem tão-pouco é discriminatório ou arbitrário, pois o regime aplica-se de uma forma generalizada e tem uma fundamentação racional que o justifica. Conclui-se, portanto, que o artigo 20.º, n.º 1, da Constituição não impõe o reconhecimento do direito ao recurso da decisão que quebra o segredo profissional. por parte do obrigado ao sigilo. Resta, pois, concluir. III - Decisão Termos em que se decide: a) Não julgar inconstitucional a interpretação normativa resultante do artigo 671.º, n.º 2, do CPC, segundo a qual não é admissível recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça da decisão proferida pelo Tribunal da Relação, no âmbito do incidente sobre a quebra do sigilo profissional, ao abrigo do artigo 135.º do CPP, interposto pelo obrigado ao sigilo. b) Negar provimento ao recurso, conformando a decisão recorrida. Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades deconta, ponderados os critérios estabelecidos no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro (cfr. artigo 6.º, n.º 1, do mesmo diploma). Lisboa, 6 de abril de 2021. – Maria de Fátima Mata-Mouros – José João Abrantes – José Teles Pereira – Pedro Machete (vencido, conforme declaração junta) – João Pedro Caupers. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencido, no essencial, pelas razões constantes da declaração junta ao Acórdão n.º 740/20. É certo que, como referido no n.º 13 do presente Acórdão, a CMVM, ora recorrente, não vê restringido ou agredido qualquer direito seu. Mas não é menos certo que os detentores de factos ou elementos sujeitos a segredo, como a CMVM, os obtêm das pessoas a que tais factos ou elementos respeitam, no pressuposto de que os mesmos se vão manter confidenciais. Esses detentores assumem, deste modo, e por força da lei, um papel (ativo) de garante quanto

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