TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

622 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL RR. Como se compreende, não se compadeceria com a dinâmica e celeridade dos processos judiciais assegurar a intervenção de todos e cada um dos sujeitos titulares primários da informação. Segs. Pelo que só assegurando a intervenção da CMVM (também previamente à prolação da decisão do inci- dente de quebra do segredo, conquanto tal questão não constitua objeto do recurso de inconstitucionalidade em apreciação) após a decisão que determine a quebra do segredo, permitindo o recurso da mesma, se tutelam os direitos e bens jurídicos convocados com a consagração do segredo profissional da CMVM. TT. Não tem, assim, razão o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, quando refere “afigura-se-nos que a argu- mentação da Reclamante não é válida. (…) a reserva da intimidade da vida privada que aqui releva é a que visa proteger a posição jurídica da Ré no processo, e não a da Reclamante. Esta é simplesmente um terceiro que (…) foi dispensada contra a Ré do sigilo a que estava adstrita a favor da Ré. Não é a titular do direito a que se refere a reserva, por muito que signifique que deve poder não dar a conhecer no processo os elementos” (cfr. págs. 9 e 10). UU. Só a afirmação da recorribilidade da decisão de quebra do segredo profissional, por parte da CMVM, permite tutelar os direitos e bens jurídicos convocados com a consagração do segredo profissional da CMVM. VV. O Tribunal Constitucional, em diversos arestos, tem associado o sigilo bancário à reserva da intimidade da vida privada, constitucionalmente consagrada, no artigo 26.º da CRP (cfr. Acórdão do Tribunal Constitucio- nal n.º 278/95, Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 602/05 e Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 442/07 e Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 256/02). WW. O Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão recorrido, ao não admitir o recurso interposto pela CMVM, violou o direito de acesso ao direito e à tutela jurisdicional efetiva, proferindo uma decisão judicial que impõe uma restrição ao direito à reserva da intimidade da vida privada. XX. Atendendo a que o segredo profissional da CMVM, na sua dimensão de salvaguarda de interesses de ordem individual (designadamente, do direito à reserva da intimidade da vida privada) contende com direitos fun- damentais, uma decisão judicial que determina a quebra de segredo deve ser passível de recurso. YY. Tal conclusão é igualmente suportada quando se atenta aos interesses de ordem pública e coletiva, porquanto a consagração do segredo profissional da CMVM visa assegurar a eficácia da supervisão pública da CMVM. ZZ. O Tribunal Constitucional tem salientado a tutela constitucional conferida pelo legislador constituinte aos mercados (na alínea f ) do artigo 81.º da CRP), associando-a, também, à atividade de supervisão exercida pela CMVM (Cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 360/16 e Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 85/12). AAA. Assim, considerando que o segredo profissional da CMVM visa também assegurar a eficácia da supervisão, porquanto as entidades supervisionadas devem estar “seguras de que as informações confidenciais forneci- das conservarão, em princípio, o seu caráter confidencial” (cfr. Acórdão do TJUE proferido no Processo C-140/13), deve ser garantida a intervenção da CMVM no incidente de quebra do segredo profissional a que se encontra sujeita, maxime , no que releva para os presentes autos, o recurso da decisão proferida. BBB. Na verdade, estando em causa uma exigência constitucional quanto ao funcionamento eficiente dos mercados [artigo 81.º, alínea f ) e artigo 101.º. ambos da CRP], a tutela dessa exigência constitucional deve manifestar- -se nos mesmos termos que os previstos para a tutela dos direitos, liberdades e garantias, maxime no que se refere à recorribilidade das decisões judiciais que contendam com os bens jurídicos da eficácia da supervisão, proteção dos investidores e estabilidade dos mercados financeiros. CCC. O segredo profissional da CMVM visa salvaguardar, por um lado, a reserva da intimidade da vida privada (artigo 26.º n.º 1 da CRP) quer dos supervisionados quer dos sujeitos que com aqueles se relacionem, e, por outro lado, a eficácia da supervisão do mercado dos instrumentos financeiros [artigos 81.º, alínea f ) e artigo 101.º, da CRP], exercida pela CMVM, sendo que ambas as dimensões correspondem a direitos, liberdades e garantias (o direito à reserva da intimidade da vida privada) e a bens jurídicos (a eficácia da supervisão) constitucionalmente previstos. DDD. A interpretação do n.º 2 do artigo 671.º do CPC, efetuada pelo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, na dimensão interpretativa segundo a qual a decisão do Tribunal da Relação que quebra o segredo profissional

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