TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
607 acórdão n.º 175/21 si – o qual, como referido, foi sindicado autonomamente; e (iii) não existe norma expressa na LdC que admita a recorribilidade de tal medida, 96. é indiscutível a necessidade de aplicação subsidiária do disposto no artigo 55.º do RGCO por expressa remissão do artigo 83.º da LdC, desaplicando o artigo 85.º do mesmo diploma. 97. Outra interpretação que não esta levará a admitir-se que direitos e interesses legal e constitucionalmente protegidos fiquem desprovidos de toda e qualquer proteção apenas e só pela existência de uma lacuna que o sistema jurídico tem de colmatar. […] 100. Outra leitura permitiria que o sistema jurídico convivesse com uma brecha no direito de acesso aos tribunais e na tutela jurisdicional efetiva, sem qualquer respaldo na letra da lei e no espírito do legislador, como supra melhor descrito. […]” (itálicos acrescentados). Analisadas as razões da recorrente, é de concluir que esta não produziu argumentação convincente no sentido de demonstrar em que medida carece de – e a Constituição lhe garante – uma via de tutela que acresça às demais enunciadas (e das quais, aliás, fez uso). 2.3.1. Antes de mais, deve sublinhar-se que está em causa uma norma processual que rege sobre a recor- ribilidade das decisões. A sua conformidade à Constituição há de decorrer da compatibilidade com os artigos 20.º e 268.º, n.º 4. Mas já não são parâmetros relevantes para este juízo: (a) as normas constitucionais que regem os direitos alegadamente afetados (artigos 34.º e 26.º da Constituição), precisamente porque não está em causa saber que atos lesivos podem ou não ser praticados, mas apenas se certo meio de reação está ou não ao dispor da entidade visada; nem (b) o artigo 32.º, n.º 10 (pelas razões que já se deixaram expressas no item 2.2., supra ); nem, manifestamente, (c) as regras sobre a aplicação da lei criminal previstas no artigo 29.º, porque a elas é alheia a questão da recorribilidade. Dos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição decorrem, como vimos ( item 2.2., supra ; Acórdão n.º 141/19), direitos de ação (no sentido de levar determinada pretensão ao conhecimento de um órgão jurisdicional), ao processo (no sentido da abertura de um processo após a apresentação da pretensão, com o consequente dever de o órgão jurisdicional sobre ela se pronunciar), a uma decisão judicial sem dilações indevidas, a um processo justo baseado nos princípios da prioridade e da sumariedade, no caso daqueles direitos cujo exercício pode ser aniquilado pela falta de medidas de defesa expeditas, e, por fim, a ver con- formado o processo impugnatório “[…] de tal modo que seja idóneo a apreciar a pretensão de invalidade (ou de inexistência jurídica) incidente sobre as decisões dos órgãos da Administração (ou dotados de poderes materialmente administrativos) que, ao abrigo de normas de direito público, visem produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta […]” (Acórdão n.º 329/13). Vejamos, pois, se pode estar em causa uma afetação relevante de qualquer das referidas garantias. 2.3.2. Importa notar que os recursos constituem, pela sua natureza, pedidos de reapreciação de decisões. Quando referido a decisões dos tribunais, o recurso é um “[…] pedido de reponderação sobre certa deci- são judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer. O fim do recurso é a substituição da decisão impugnada por uma outra mais favorável ao recorrente” [João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa, Direito Processual Civil (obra em preparação), §50.º, I., 1., 1.2., itálico acrescentado]. E, quando referido à impugnação de decisões administrativas, também não prescinde do elemento decisório, que o caracteriza. Um ato, em si mesmo considerado, não pode ser reapreciado, embora possa ser apreciada, em decisões, a sua validade ou eficácia, podendo dessas decisões caber recurso. Coisa diversa é reagir diretamente, junto dos tribunais, perante determinado ato ou situação de facto, o que não constitui um recurso, mas sim, por regra, um pedido de providência, de que constituem exemplo os
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=