TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

596 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (i) a circunstância de a norma cuja apreciação a A. trouxe ao Tribunal Constitucional não constituir ratio deci- dendi do Acórdão Recorrido, em preterição do disposto no artigo 70.º n.º 1 alínea b) da LTC (cfr. ponto 31 das contra-alegações); e isto porque (ii) a A. não teria, oportuna e tempestivamente, suscitado a questão de inconstitucionalidade junto do Tribunal da Relação de Lisboa, em violação do disposto no artigo 72.º n.º 2 da LTC. 8. A A.não pode concordar com a posição do Ministério Público nas suas contra-alegações, estando convicta de que o recurso interposto para esse Alto Tribunal, já admitido preliminarmente pelo Venerando Conselheiro Relator, cumpre todas as formalidades e todos os pressupostos processuais legais previstos na LTC. Vejamos porquê. II. A ratio decidendi do acórdão recorrido 9. Em primeiro lugar, a A. pretende sublinhar que a questão suscitada pelo Ministério Público não é a de que à norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada pela A. falte natureza normativa. O preenchimento desse pressu- posto é pacífico e aceite pelo Ministério Público (cfr. Ponto 36 das suas contra-alegações). 10. O que questiona o Ministério Público é que tal norma tenha constituído o fundamento decisório do Acórdão Recorrido. 11. O preenchimento do pressuposto colocado em causa pelo Ministério Público prende-se com a necessidade de assegurar a utilidade do recurso para o Tribunal Constitucional. 12. De facto, o Tribunal Constitucional tem entendido que, para que o recurso de constitucionalidade tenha efeito útil, é necessário que se tenha verificado uma efetiva aplicação, pela decisão recorrida, da norma ou interpre- tação normativa cuja constitucionalidade é sindicada. 13. É necessário, pois, que esse critério normativo tenha suportado a ratio decidendi da decisão recorrida porquanto só assim se garante que um eventual juízo de inconstitucionalidade terá a virtualidade de se repercutir naquela, determinando a sua reformulação. 14. Ora, tal só deverá ocorrer quando se possa afirmar que a norma ou interpretação normativa objeto de recurso constitua, como escreve Carlos Lopes do Rego, “fundamento jurídico determinante da solução dada ao pleito pelo tribunal a quo ”, independentemente de tal fundamento jurídico estar mais ou menos explícito na decisão. 15. Na verdade, como alerta o Autor, ao contrário do que parece vir defendido pelo Ministério Público (que também cita a obra do Autor), “O que importa decisivamente não são os termos literais ou verbais usados pela decisão recorrida – a expressa invocação, cama fundamento jurídico decidido, dos preceitos legais que constituem ‘fonte’ da norma cuja inconstitucionalidade vinha questionada pelo recorrente – mas, numa ‘visão substancial das coisas’, que a solução de direito ínsita na decisão do pleito não possa, de um ponto de vista lógico-jurídico, ter deixado de passar pela consideração das normas ou sentidos normativos – isto é, dos regimes jurídicos – indicados pelo recorrente como padecendo da alegada inconstitucionalidade”. 16. Deve, pois, na aferição da verificação deste pressuposto de recorribilidade, prevalecer uma apreciação da substância da ratio decidendi em que assenta a decisão recorrida em detrimento de uma verificação puramente for- mal do emprego (ou não) das exatas expressões literais ou verbais contidas na decisão do Tribunal a quo. 17. Ora, retomando, o objeto do recurso é apreciar a inconstitucionalidade da “norma prevista no artigo 85.º da LdC no sentido de que apenas os atos decisórios adotados pela AdC na fase administrativa do processo de contraordenação são suscetíveis de recurso, não se admitindo recurso de outros atos lesivos de direitos e interesses legalmente protegidos, nomeadamente por via da aplicação subsidiária do artigo 55.º do RGCO”. 18. Esta norma foi, indubitavelmente, aplicada como ratio decidendi do Acórdão Recorrido, uma vez que foi esta interpretação que determinou a decisão do Tribunal a quo de negar provimento ao recurso, mantendo a decisão do TCRS de não admitir o recurso interposto pela A.. 19. Desde logo, vem cristalinamente plasmada no Acórdão Recorrido a opção do Tribunal da Relação de Lisboa pela aplicação do disposto no artigo 85.º da LdC, e pela necessária desaplicação do disposto no artigo 55.º do RGCO, com

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