TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

587 acórdão n.º 175/21 interesses legalmente protegidos, ínsitos nos artigos 20.º, n. os 1 e 5, 32.º, n.º 10, 29.º, n. os 1, 3 e 4, e 268.º, n.º 4, da CRP e o direito a um processo equitativo, previsto no artigo 6.º da CEDH. 5. A leitura da norma nos termos referidos impõe uma limitação inconstitucional, ilegal e desproporcionada do direito à impugnação imediata de atos lesivos de direitos e interesses legalmente protegidos que, apesar de não terem caráter decisório, lesem direitos fundamentais. 6. Desde logo, a leitura da norma nos termos referidos é incorreta uma vez que (i) o regime recursivo constante da LdC não regula o recurso interlocutório de ato/medida adotado pela AdC na fase administrativa do processo; (ii) o regime recursivo constante da LdC não é derrogativo da aplicação do artigo 55.º do RGCO, como resulta claramente do disposto nos artigos 83.º e 13.º da LdC; (iii) a CRP impõe a salvaguarda do direito de sindicar, de forma imediata, um ato/medida lesiva de direitos e interesses legalmente protegidos, o que ficaria por acautelar se o preceito fosse lido nos termos invocados no ponto 3. 7. A LdC não é autossuficiente no que respeita aos meios de aquisição de prova, à intervenção das autoridades judiciárias, à competência instrutória da autoridade administrativa, aos meios de reação interlocutórios e ao direito de defesa durante a fase organicamente administrativa do procedimento, nomeadamente, com relevância para estes autos: (i) não regula os termos em que as diligências de busca, exame, recolha, apreensão e selagem das instalações das empresas devem ser realizadas, tendo de recorrer-se, necessariamente, aos regimes subsidiários aplicá- veis, em particular ao CPP e à Lei do Cibercrime, por via das remissões contidas nos artigos 13.º da LdC e 41.º n.º 1 do RGCO; (ii) não regula o regime das decisões interlocutórias (regime, modo de subida, prazo, modo de contagem, etc.), resultando tal insuficiência, de forma expressa, da remissão para o RGCO que é feita pelo artigo 83.º da LdC – contrariando, por conseguinte, o argumento de autossuficiência do regime contido na LdC defen- dido pelo TRL. 8. A medida administrativa em causa, levada a cabo pela AdC, e concretizada num exame de correspondência eletrónica indiscriminado e detalhado (onde se inclui a leitura e análise de mensagens de correio eletrónico, designada- mente enviadas por e recebidas de advogados da empresa, e mensagens de correio eletrónico cujo teor não tinha qualquer conexão com a matéria objeto do mandado), violou direitos e interesses legalmente protegidos, sem cobertura legal e em extravasamento do mandado do Ministério Público que o autorizava, achando-se, em consequência, violados, de forma grave e deliberada o direito ao sigilo da correspondência (artigo 34.º, n.º 4, da CRP), o direito à reserva da vida privada (artigo 26.º da CRP), e o direito de defesa subjacente ao sigilo profissional e à relação entre advogado e cliente (artigos 20.º e 32.º, n.º 10, ambos da CRP). 9. A Decisão Recorrida, ao conformar-se com uma interpretação do artigo 85.º, n.º 1, da LdC, no sentido de que não contempla qualquer possibilidade de reação contra determinados atos que lesam direitos, em especial o recurso a meios de reação previstos em direito subsidiário, traduz uma violação do princípio da tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º, n. os 1 e 5, da CRP e 6.º da CEDH). 10. De facto, existem atos que, não tendo conteúdo decisório, ofendem direitos fundamentais dos particula- res, cabendo ao ordenamento jurídico assegurar um meio de reação, como sucede com o recurso de medidas das autoridades administrativas em processo de contraordenação previsto no artigo 55.º do RGCO, ex vi dos artigos 13.º e 83.º da LdC. 11. Todo e qualquer ato ou medida de uma autoridade administrativa em processo de contraordenação, tenha ou não conteúdo decisório, deve ser passível de recurso imediato para o TCRS (no caso), conquanto lese imediatamente direitos e interesses do particular. 12. Outra leitura que não essa, faria com que o visado por atos lesivos de direitos fundamentais não tivesse forma de a eles reagir, sendo posto em causa, de um modo incompatível com um Estado de Direito, o princípio da tutela jurisdicional efetiva, em clara violação das normas constantes do artigo 20.º n. os 1 e 5 da CRP e 6.º da CEDH. 13. O artigo 85.º, n.º 1, da LdC deve, em virtude do disposto nos artigos 13.º e 83.º da LdC, ser conjugado com o artigo 55.º do RGCO, no sentido de admitir, em processo contraordenacional em matéria de direito da

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