TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

579 acórdão n.º 175/21 33. Na verdade o mero visionamento de correio eletrónico e a realização de operações técnicas de pesquisa, seleção e consulta pelos funcionários credenciados da AdC, previamente à apreensão dessa prova e a qualquer ato de conteúdo decisório, nada significam para o objeto processual da imputação, dispondo a visada sempre da possibilidade de instruir o processo com os elementos não apreendidos que considere úteis à sua defesa. 34. Por conseguinte, a alusão à compressão dos direitos de defesa da visada e à violação do art.º 32.º, n.º 10 da CRP como direito preterido pelas operações de exame e visionamento é, para nós, argumento espúrio e desgarrado de qualquer atendibilidade racional. 35. Em terceiro lugar, considerando que qualquer visada que seja objeto de diligências de busca e apreensão dispõe de meios idóneos, próprios e autónomos para sindicar a validade, legalidade e regularidade do mandado da autoridade judiciária competente, para sindicar a sequente decisão da apreensão da AdC como ato decisório ou para arguir nulidades de execução do mandado perante a autoridade competente, parece-nos claro a eventual procedência destas diferentes vias recursivas esgota a necessidade de qualquer tutela jurisdicional de potencial lesão, afetação ou compressão dos direitos fun- damentais invocados pela aqui visada/recorrente, sendo que a tutela ínsita a cada um desses meios denota uma proteção garantística efetiva, proficiente e adequada à afirmação processual desses mesmos direitos. 36. Se o que a visada pretende é atingir a validade da prova colhida no âmbito da consulta/pesquisa aos com- putadores dos seus trabalhadores e colaboradores, julgamos preclaramente que a questão apenas se pode colocar em função do objeto, limites e extensão do cumprimento do respetivo mandado de buscas e apreensão, visto que, para o que importa, tal prova foi obtida no âmbito do art.º 18.º, n.º 1 do NRJC e do ínsito dever de não obstrução do exercício dos poderes de inquirição, busca e apreensão previsto no art.º 68.º, n.º 1 al. j) do NRJC. 37. Quando muito, o problema do aproveitamento dessa prova poderia envolver considerações inerentes ao direito da visada/recorrente à não autoincriminação pois que a aquisição probatória decorreu da sua sujeição legal a diligências probatórias determinadas por autoridade judiciária. 38. De resto, o recurso interlocutório contraordenacional não configura, nem pode configurar, uma tutela jurisdicional de apreciação positiva de direitos fundamentais das visadas em processo contraordenacional, cujo escopo sirva apenas um intuito declarativo desses direitos perante uma outra parte, como a visada parece defender quando é chamada a pronunciar-se sobre a utilidade e efeito útil deste recurso por confronto com as vias recursivas e de sindicância já acionadas. 39. Com o presente objeto recursivo a visada pretende sindicar apenas a ingerência de um aparente terceiro nas suas comunicações eletrónicas, desmerecendo a circunstância dessa ingerência ocorrer por habilitação legal, no âmbito de um mandado de autoridade judiciária para investigação de práticas restritivas da concorrência e com vista à recolha de prova para demonstração dessa infração. 40. Tal interpretação bule, apodictamente, com a natureza do processo contraordenacional enquanto ação sancionatória de Direito Público. 41. Em suma, não subsiste com a interpretação proposta por nós do art.º 85.º do NRJC qualquer violação dos artigos 20.º, n.º 1 e 5, 32.º, n.º 10; 29.º, n.º 1, 3 e 4 e 268.º, n.º 4 da CRP [10] e muito menos violação do art.º 6.º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem por não estar limitado qualquer recurso de plena jurisdição de decisões condenatórias. 42. Por fim, afigura-se-nos que os argumentos inerentes à sobreposição de objetos processuais com outras ins- tâncias recursivas ou de sindicância dos atos decisórios da AdC – já acionados pela própria visada – se encontram abrangidos pela posição que acima veiculamos sobre a admissibilidade de recurso interlocutório de medidas de análise, exame e visualização efetuadas durante a execução de mandado de busca e apreensão, sendo que, portanto, a consideração do efeito útil, da inutilidade superveniente ou da identidade de objetos processuais perde atendibi- lidade por configurarem critérios de decisão despiciendos para a questão prévia da admissibilidade. 43. Todavia, a pedra de toque apresentada pela visada/recorrente para sustentar a autonomia recursiva desta impug- nação interlocutória – tais medidas extravasam o objeto do mandado – representa, para nós e com toda a parcimónia, um argumento notoriamente tautológico visto que essas medidas estão necessariamente a executar essa autorização judiciária quanto à prova digital ou eletrónica.

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