TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

566 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL alternativas de opção, entre as quais o juiz deve escolher em seu prudente arbítrio e em atenção a certo fim geral [identificado pelos interesses mencionados no enunciado legal]” (Castro Mendes; Karl Engisch). 17.ª) Noutra perspetiva, o tribunal exerce por este meio um poder de jurisdição voluntária, de caráter material- mente administrativo, pelo que também por esta via é pertinente trazer à colação a ideia de “discricionariedade”, balizada embora pelos interesses identificados na previsão legal. 18.ª) Com efeito, a prestação do testemunho é concedida ou denegada, desde que se mostre “justificada” (termo que denota um conceito legal indeterminado, de valor) segundo “o princípio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da ver- dade, a gravidade do crime e a necessidade de proteção de bens jurídicos”. 19.ª) Por outras palavras, é uma decisão cujo conteúdo está “dependente da livre resolução do juiz”, à luz dos interesses identificados na previsão legal, como ocorre por regra nas decisões sobre diligências da instrução ( hoc sensu ), com dois corolários dignos de menção: não é recorrível (CPP, art. 400.º, n.º 1, al. b) , e, pondo termo ao incidente, remove a causa que é impedimento à prossecução dos termos do processo, promovendo assim o interesse da celeridade processual da administração da justiça penal; e, tipicamente, não produz efeito de caso julgado, pelo que ulteriormente, em função de novos circunstancialismos, será passível de reapreciação, se for o caso  pois o processo penal poderá, entretanto, ter produzido a absolvição do arguido. 20.ª) Posto isto, importa verter o anterior discurso na linguagem constitucional, nos termos do artigo 32.º, n.º 1, que consagra o princípio segundo o qual “o processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso”, considerado todavia no quadro de um conceito constitucionalmente idóneo de “lei restritiva” (art. 18.º, n. os 2 e 3). 21.ª) A primeira parte do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, proclama que “o processo criminal assegura todas as garantias de defesa”, pelo que importa recensear o conteúdo de garantia que ao arguido é oferecido pelo regime jurídico do n.º 3 do artigo 135.º do CPP. 22.ª) Quanto a este aspeto, já ficou referido que o regime jurídico do n.º 3 do artigo 135.º do CPP confere um certo número de garantias ao arguido, em matéria da decisão sobre a “quebra do segredo profissional” no processo penal, que podemos compendiar nas três seguintes. 23.ª) Por uma parte, o incidente é sempre resolvido por um tribunal que será sempre um “tribunal superior àquele onde o incidente tiver sido suscitado”, ou seja, não o tribunal onde o incidente é suscitado, como é a regra (o tribunal competente para a ação é o competente para os respetivos incidentes, regra que aliás se aplica no n.º 1 do preceito legal em causa, em matéria da legitimidade da escusa) mas um outro e superior tribunal, da relação ou o Supremo Tribunal de Justiça, e em formação colegial. 24.ª) Esta é uma garantia de defesa, orgânica, da imparcial e justa decisão do incidente. 25.ª) Por outra parte, a lei configura a controvérsia como um incidente, que não resolve sobre a sorte da causa penal, nem sobre a liberdade do arguido, mas sobre a produção de apenas um concreto e específico meio de prova, o testemunho (no caso) de um advogado em matéria ao segredo profissional, pelo que não fica prejudicada a pro- dução de todos e cada um dos demais meios de prova idóneos à defesa do arguido e que pode, só por si, dirimir a responsabilidade penal. 26.ª) Esta é uma garantia de defesa, de caráter processual. 27.ª) Finalmente, a lei configura a decisão sobre a quebra de segredo como uma instância de “discricionarie- dade judicial”, balizada pela ponderação dos interesses identificados na previsão legal. 28.ª) A “decisão de ponderação”, pelo seu caráter de “jurisdição voluntária” ou de “discricionariedade judicial”, não é definitiva e imutável, pelo que, havendo alteração de circunstâncias, nomeadamente em face da ulterior tramitação dos autos, poderá ser reapreciada a questão da quebra do segredo profissional de advogado, caso neces- sário, pois, nomeadamente, pode sobrevir a absolvição do arguido. 29.ª) Portanto, esta é uma outra garantia de defesa, de caráter processual. 30.ª) Em qualquer caso, é verdade que, no fim de contas, a interpretação normativa recorrida preclude o direito ao recurso, enquanto garantia constitucional do duplo grau de jurisdição, conferida pelo artigo 32.º, n.º 1, in fine , da Constituição (na redação que lhe foi conferida pelo artigo 15.º, da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro).

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