TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
565 acórdão n.º 163/21 diploma legal, viola as “garantias de defesa, incluindo o recurso, no processo criminal” consagradas no artigo 32.º (Garantias de processo criminal), n.º 1, da Constituição? 2.ª) A interpretação normativa impugnada é um adquirido do juízo de constitucionalidade - sem embargo, neste recurso tem que valer a premissa “a decisão do Tribunal da Relação de Évora foi proferida em 1.ª instância”, pois é logicamente necessária para apreciar o argumento da irrecorribilidade (em qualquer caso, nos autos de pro- cesso penal apenas esse tribunal superior proferiu decisão sobre a “quebra do segredo profissional”). 3.ª) Quanto ao n.º 3 do artigo 135.º, do CPP, o procedimento de “prestação de testemunho com quebra do segredo profissional”, é expressamente designado, e pode ser caracterizado, como um “incidente” (ou “questão incidental”, hoc sensu ) do processo penal (artigo 135.º, n. os 1 a 3). 4.ª) Depois, a lei consagra no dito preceito uma regra de competência material e funcional (que não hierár- quica) para dirimir o incidente: o tribunal superior àquele onde o incidente tiver sido suscitado, ou, no caso de o incidente ter sido suscitado perante o Supremo Tribunal de Justiça, o pleno das secções criminais (n.º 3) [suscitado, que não resolvido]. 5.ª) Ao invés do que é o princípio geral do processo - “o tribunal competente para a ação é também competente para conhecer dos incidentes que nela se suscitem - para dirimir este incidente é competente: invariavelmente um tribunal; que não é o tribunal em causa mas antes “o tribunal superior”, seja superior (tribunal da relação) ou supremo (Supremo Tribunal de Justiça), e sempre em formação colegial (n.º 3). 6.ª) O critério da decisão vem estabelecido expressamente na lei, com esta fórmula: “justificada, segundo o princí- pio da prevalência do interesse preponderante, nomeadamente tendo em conta a imprescindibilidade do depoimento para a descoberta da verdade, a gravidade do crime e a necessidade de proteção de bens jurídicos” (n.º 3). 7.ª) Finalmente, “a decisão (…) do tribunal é tomada ouvido o organismo representativo da profissão relacio- nada com o segredo profissional em causa” (n.º 3). 8.ª) Destes passos do texto da lei podemos extrair três corolários, que serão relevantes para o caso, nomeada- mente por revelarem o espírito da lei (scl., as suas valorações). 9.ª) Quanto à competência material e funcional: o regime legal em causa consagra uma garantia objetiva e adequada à boa administração da justiça penal e da realização do direito, com caráter orgânico, pois a competência para resolver sobre a “quebra do segredo profissional” é sempre de um tribunal, que é superior ou supremo, e que delibera em formação colegial. 10.ª) Quanto ao procedimento: não é uma decisão final, nomeadamente sobre a responsabilidade penal do arguido, mas antes um incidente, sobre a produção de um único e específico meio de prova (um testemunho), entre todos os que podem concorrer para a descoberta da verdade. 11.ª) Também não é uma decisão final, no sentido em que não produz um efeito típico de caso julgado, em razão do seu conteúdo “discricionário”. 12.ª) Ao invés, tal decisão está sujeita a uma cláusula geral rebus sic stantibus , pelo que a denegação da prestação do testemunho, com quebra do segredo, pode eventualmente vir a ser a ser alterada, em razão de ulterior circuns- tancialismo, decorrente do ulterior desenrolar do processo penal. 13.ª) Finalmente, não é uma decisão que resolva sobre a liberdade do arguido. 14.ª) Depois, quanto aos interesses relevantes, é de notar que é necessariamente ouvido o organismo represen- tativo da profissão relacionada com o segredo profissional em causa, o que assegura uma consideração igualmente desse interesse institucional, no quadro da ponderação integrada de todos os interesses relevantes (“necessidade de proteção de bens jurídicos”) que a decisão em causa legalmente tem que realizar (n.º 3). 15.ª) Ou seja, na decisão do incidente em causa, como denota a própria epígrafe legal (Quebra do segredo profissional), não pode curar somente dos interesses do arguido, mas deve considerar, justa e equilibradamente, todos os interesses relevantes na situação, nomeadamente no caso a proteção do segredo profissional do advogado, que é um valor “constitucional” da profissão de advogado. 16.ª) Não menos importante, a decisão proferida no exercício da habilitação legal constante do n.º 3 do artigo 135.º do CPP, nos seus expressos termos, tem uma estrutura de “ponderação de interesses” (em sentido estrito) consubstanciando o exercício de “discricionariedade judicial”, “na medida em que a lei confere ao juiz uma ou mais
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