TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

557 acórdão n.º 163/21 Antes de mais, como é bom de ver desde logo, o recorrente, nesta que é a peça de suscitação prévia, no momento processualmente adequado, para efeitos do presente recurso de constitucionalidade e do preenchi- mento dos seus requisitos de admissibilidade, cinge-se a uma única questão jusconstitucional como objeto da sua pretensão submetido à apreciação, a saber, a dimensão normativa extraída da interpretação do artigo 432.º, n.º 1, alínea a), do CPP, no sentido de que não é recorrível para o STJ o acórdão da Relação que, em 1.ª instância, decide o incidente de levantamento do sigilo profissional previsto no artigo 135.º, n.º 3, do CPP, por violação das garantias de defesa e do direito ao recurso, previsto no artigo 32.º, n.º 1, da CRP. Desta forma, há que se constatar que o recorrente abandonou a anteriormente explicitada (vide ponto 3, supra ) questão quanto ao sentido extraído do artigo 135.º, n.º 3, do CPP, nos termos do qual o segredo profissional prevalece sobre o interesse da descoberta da verdade e da defesa do arguido, sem que se conheça a razão da recusa do seu levantamento. Nesta sequência, a conferência do STJ, em 21 de agosto de 2020, proferiu o acórdão ora atacado, em que decidiu indeferir a reclamação, tendo determinado, no essencial, que: «O Ministério Público junto deste STJ entende que o recurso, embora tendo sido tempestivamente interposto, não é admissível para o STJ, nos termos do artigo 432.º do CPP, não cabendo a decisão proferida pelo Tribunal da Relação, enquanto tribunal imediatamente superior aquele onde foi suscitada a quebra de segredo, no conceito de “decisão das relações proferidas em 1.ª instância” prevista no n.º 1, do artigo 432.º do CPP, pelo que deve ser rejeitado, por inadmissibilidade legal. O arguido vem defender e manter na reclamação, o contrário, ou seja, que a decisão do tribunal da Relação é uma decisão proferida em 1.ª instância, sendo, por isso, recorrível, nos termos do disposto no artigo 432.º, n.º 1, al. a) , do CPP. Como se disse na decisão reclamada, e transcreve-se: (…) a obtenção de prova sobre factos ou documentos abrangidos por segredo profissional, invocado como escusa a depor ou como recusa de apresentação, é suscetível de gerar um incidente processual com vista a obter a quebra do segredo mediante a intervenção do tribunal da 1.ª instância, destinada a verificar a legitimidade da recusa, e a intervenção do tribunal da Relação, destinada a decidir a quebra do segredo. Concluindo o tribunal da 1.ª instância que a escusa ou a recusa são legítimas, por estarem legalmente protegi- das por segredo, cabe ao “tribunal imediatamente superior” decidir da quebra do segredo. A decisão de quebra do segredo forma-se, assim, através da participação de tribunais de dois diferentes níveis de hierarquia no procedimento a ela destinado – o da 1.ª instância, onde corre o processo, que é, em regra, o tribunal de comarca – artigo 80.º, da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto –, e o da 2.ª instância, que é, em regra, o tribunal da Relação – artigo 67.º, n.º 1, do mesmo diploma. Trata-se de uma competência que é conferida ao tribunal da Relação pelo artigo 12.º, n.º 2, alínea e) , do CPP: “exercer as demais atribuições conferidas por lei”; e, pelo artigo 73.º, alínea h) , da Lei n.º 62/2013, a de “exercer as demais competências conferidas por lei”. Sendo, na hierarquia dos tribunais, o tribunal imediatamente superior àquele em que o incidente foi suscitado – artigos 31.º a 33.º da Lei n.º 62/2013 e 67.º a 69.º do Código de Processo Civil (CPC) – é este, tribunal da Relação, o competente para o efeito. A intervenção destes dois tribunais na decisão do incidente corresponde a duas fases processuais distintas. Numa primeira fase, a que se refere o n.º 2, do artigo 135.º do CPP, em que intervém o tribunal da 1.ª instân- cia, perante o qual corre o processo, trata-se de saber se a escusa ou a recusa são legítimas, isto é, se a pessoa se pode escusar a depor, ou se pode recusar fornecer documentos por estar vinculada a um dever de segredo profissional ou de funcionário. Esta questão – legitimidade da escusa ou recusa – deverá ser decidida após a realização das diligências necessárias. No caso de o tribunal de 1.ª instância concluir pela ilegitimidade da escusa ou da recusa, ordena a prestação do depoimento ou a apresentação dos documentos.

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