TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
556 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de constitucionalidade, a saber, quanto ao sentido extraído do artigo 135.º, n.º 3, do CPP de que o segredo profissional prevalece sobre o interesse da descoberta da verdade e da defesa do arguido, sem que se conheça a razão da recusa do seu levantamento e, também, quanto à eventual inadmissibilidade do recurso interposto contra a decisão do Tribunal da Relação, na hipótese de se concluir que ela não constitui uma decisão proferida em 1.ª instância, à luz do artigo 432.º, n.º 1, alínea a) , do CPP face ao artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (conforme, efetivamente, sustentou o Ministério Público naquela sede). No julgamento, o STJ entendeu não se verificar qualquer inconstitucionalidade e, atendendo à questão prévia aventada pelo representante do Ministério Público, concluiu pela inadmissibilidade do recurso (fls. 174-193). Ainda inconformado, o recorrente apresentou reclamação para a conferência do STJ, na forma do artigo 417.º, n.º 8, do CPP, argumentando o seguinte (fls. 200-202): «1. O arguido, no recurso para este Supremo Tribunal, já se havia debruçado previamente sobre a admissibili- dade de recurso do acórdão proferido pela Relação de Évora, que julgou improcedente o incidente de quebra do segredo profissional. 2. Na sua peça recursória, o Arguido já havia justificado a razão pela qual entende que a decisão da Relação de Évora é recorrível, nos termos do art. 423.º, n.º 1, a) , do CPP, por ser uma decisão proferida em primeira instância. 3. Ao invés, na decisão sumária ora reclamada, sustenta a Senhora Juíza Conselheira Relatora que a questão controversa foi suscitada no âmbito do Tribunal da Comarca de Santarém, razão pela qual a Relação de Évora atuou como um verdadeiro tribunal de 2.ª instância. […] 6. Como decorre da jurisprudência divergente que tem vindo a ser produzida sobre esta matéria, a questão não é líquida. 7. Porém, salvo melhor opinião, não parece que assista razão à decisão sumária. 8. O tribunal da 1.ª instância, ou seja, o tribunal onde corre o processo, analisa e decide da (i) legitimidade da escusa; mas a quebra do segredo só foi analisada e decidida pela Relação de Évora. 9. Ou seja, o tribunal de 1.ª instância não julgou o incidente de quebra de segredo profissional oportunamente suscitado, quem o julgou foi o Tribunal da Relação, pelo que, independentemente da questão ter sido suscitada na 1.ª instância, a única decisão tomada foi aquela que foi objeto do acórdão do TRE, ora recorrido. 10. In casu , a Relação de Évora apreciou pela primeira vez a questão da quebra do segredo, a qual não foi apre- ciada pelo Tribunal da Comarca de Santarém, que se limitou a verificar a legitimidade da escusa. 11. Pelo exposto, a garantia constitucional do direito ao recurso só é assegurada se efetivamente o julgamento efetuado em 1.ª instância pelo Tribunal da Relação puder ser reapreciado, por via de recurso, pelo Supremo Tri- bunal de Justiça. 12. Como já se expendeu na motivação do recurso e na resposta ao Parecer do Ministério Público, entende-se que padece de inconstitucionalidade o entendimento normativo dado ao art. 432.º, n.º 1, al. a) , do CPP, no sen- tido de que não é recorrível para o STJ o acórdão da Relação que, em 1.ª instância, decide o incidente de levanta- mento do sigilo profissional previsto no art. 135.º, n.º 3, do CPP, por violação das garantias de defesa e do direito ao recurso, previsto no art. 32.º, n.º 1, da CRP. […] 20. Os arguidos são condenados ou absolvidos em função da prova produzida; se ao Arguido é cerceado o direito a produzir prova, pode de nada lhe servir ter direito ao recurso da decisão de mérito final. 21. Assim sendo, entendemos que o art. 432.º, n.º 1 do CPP não pode ser lido de forma restritiva, de forma a excluir do seu âmbito o recurso de uma decisão proferida pela Relação que decide em 1.ª instância o incidente de quebra do sigilo profissional previsto no art. 135.º, n.º 3 do CPP. 22. Neste quadro, renova-se a inconstitucionalidade arguida, relativamente ao entendimento normativo ado- tado à norma do art. 432.º, n.º 1 do CPP, devidamente conjugado com o art. 434.º do mesmo código, no sentido supra exposto.»
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