TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
555 acórdão n.º 163/21 levantamento de sigilo, é lícito afirmar que a solução que resulta da norma questionada, no sentido de que não é recorrível para o STJ o acórdão da Relação que decide o incidente de levantamento do sigilo profissional previsto no artigo 135.º, n.º 3, do CPP, permite ainda tutelar adequadamente os inte- resses e direitos fundamentais em conflito, designadamente o direito à produção de prova, enquanto garantia do arguido em processo penal, à luz do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. Acordam na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional: I. Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), em que é recorrente A. e recorri- dos o Ministério Público e o Município de Santarém, foi pelo primeiro interposto recurso de constituciona- lidade ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, adiante designada por LTC), do acórdão proferido por aquele Tribunal (fls. 212-235), em 21 de agosto de 2020, indicando, no requerimento de interposição, como objeto “o entendimento normativo dado pelo Supremo Tribunal de Justiça ao artigo 432.º, n.º 1, a) do CPP, segundo o qual o acórdão do Tribunal da Relação proferido ao abrigo do n.º 3, do artigo 135.º, do CPP, não constitui uma decisão proferida em 1.ª instância, é inconstitucional, por violação das garantias de defesa e do direito ao recurso, previsto no artigo 32.º, n.º 1 da CRP” (fls. 246). 2. No curso do processo a quo, o ora recorrente teve intentado contra si despacho de acusação pela prá- tica, em coautoria material e em concurso real, de três crimes de prevaricação e de dois crimes de participação económica em negócio. O arguido-recorrente requereu a abertura da instrução e solicitou a prestação de depoimento de uma testemunha que, à data dos factos, era o advogado da sociedade de construções envol- vida no diferendo com a Câmara Municipal de Santarém, a respeito de obras públicas, que deu origem ao processo penal. Neste contexto, aberta a instrução, o referido advogado comunicou nos autos o seu pedido de dispensa do segredo profissional, apresentado ao Conselho Regional do Porto da Ordem dos Advogados. Em seguida, ele próprio, sem intervenção judicial, veio informar que tal dispensa havia sido indeferida, impedindo-o, assim, de depor relativamente aos factos relevantes. Importa notar que a informação dada pelo advogado ao juízo contém apenas o ofício expedido pela Ordem dos Advogados, no sentido do indeferi- mento da dispensa requerida, sem que, no entanto, constem dos autos os fundamentos e razões que culmi- naram nessa decisão (cfr. fls. 227). Com isso, o arguido-recorrente suscitou perante o Juiz de Instrução Criminal o incidente processual de levantamento do sigilo profissional, na forma do artigo 135.º do Código de Processo Penal (CPP), a ser trami- tado junto do Tribunal da Relação de Évora. Esse tribunal apreciou, então, o incidente da quebra de segredo devido pelo advogado (fls. 84-101), tendo considerado que o seu depoimento “não se mostra, no caso concreto, imprescindível à descoberta da verdade material, que se pretende alcançar e, na perspetiva da defesa do arguido, ora requerente, não se vislumbra que sem esse depoimento, fique inviabilizada a possibilidade de fazer prova da matéria que alegou”. Desta forma, o TRE julgou improcedente o incidente de quebra do segredo profissional. 3. Inconformado, o ora recorrente interpôs recurso para o STJ (fls. 109-116), alegando que a gravidade do crime em causa justificaria a relevância do depoimento para a defesa, como interesse preponderante no litígio. Nesse aspeto, a par da argumentação sobre o direito infraconstitucional, formula, inicialmente, duas questões
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