TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
554 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL sigilo profissional mostra uma vontade efetiva de tutelar, adequadamente, todos os direitos e interesses em causa; ainda que devam ser consideradas, neste caso específico, as exigências reforçadas decorrentes do facto de nos situarmos no âmbito do processo penal [e não de processo cível, como acontecia no Acórdão n.º 740/20 – em que o Tribunal, num problema paralelo ao analisado no presente processo, não julgou inconstitucional a interpretação normativa segundo a qual a decisão do Tribunal da Rela- ção que se pronuncia, nos termos do artigo 135.º, n.º 3, do Código de Processo Penal (CPP), sobre a quebra do sigilo bancário, na sequência de uma decisão de primeira instância que afere da legitimi- dade da escusa ao abrigo do artigo 135.º, n.º 2, do CPP, não constitui uma decisão proferida em pri- meira instância, para efeitos do disposto no artigo 644.º, n.º 1, alínea a) , do Código de Processo Civil (CPC), nem decisão proferida sobre decisão da primeira instância, para efeitos do disposto no artigo 671.º, n.º 1, do CPC] –, também aqui, o sistema de proteção reforçada gizado pelo legislador parece situá-lo dentro da margem de liberdade de conformação que lhe é reconhecida pela Constituição. IV – Por um lado, por não estar aqui em causa uma decisão condenatória, mas sim uma mera decisão incidental, no quadro de um sistema que tutela, de forma mais intensa, certo tipo de provas a pro- duzir no processo, tendo em consideração os direitos e interesses constitucionalmente protegidos em tensão, em situações determinadas; tratando-se, no presente caso, de matéria penal, estamos no âmbito de aplicação de um direito subjetivo ao recurso – isto é, que de um direito subjetivo espe- cífico, e não uma mera exigência decorrente da ideia de tutela jurisdicional efetiva –, envolvendo a garantia de um duplo grau de jurisdição, que a jurisprudência constitucional tem reconhecido, em determinados casos, em processo penal, embora sem reconhecer, em caso algum, um direito geral e indiscriminado ao recurso de todas e quaisquer decisões judiciais, mesmo em matéria penal; atenta a necessidade de encontrar um ponto de concordância prática entre os direitos de defesa do arguido e os valores da celeridade e segurança na administração da justiça penal, não se afigura, desta perspetiva, que a interpretação normativa questionada possa ser considerada desconforme à Lei Fundamental. V – Ainda que se subscrevesse a alegação do recorrente de que está aqui em causa um direito fundamental de defesa do arguido em processo penal, protegido pela norma do n.º 1 do artigo 32.º da Consti- tuição – o direito a produzir prova – sempre se afigura que é de aplicar a esta situação o critério e o fundamento mobilizados na decisão do Acórdão n.º 740/20, pois também aqui se crê justificar-se “um desvio à jurisprudência consagrada pelo Acórdão n.º 40/08”. VI – Em primeiro lugar, a quebra de sigilo profissional aqui em causa cobre, na situação analisada, uma zona de segredo sujeita a intensa atividade de concordância prática com outros direitos e valores constitucionalmente protegidos; a decisão de sacrifício do direito à produção de prova, em função da prevalência de outros bens constitucionalmente protegidos, entre os quais releva a reserva de inti- midade da vida privada das pessoas envolvidas ou potencialmente mencionadas no testemunho em causa, resulta de uma escolha legislativa no sentido de conferir ao tribunal, em cada caso concreto, a faculdade de avaliação da imprescindibilidade do testemunho abrangido por sigilo profissional. VII – Em segundo lugar, e como também se afirmou no Acórdão n.º 740/20, “há que ter em consideração que não nos encontramos, de facto, perante uma simples decisão em primeira instância do Tribunal da Relação. (…) configurando a intervenção – meramente incidental – daquele tribunal como a de um elemento imparcial, porque alheio à resolução do processo principal”; face a esta ideia de prote- ção equivalente à conferida por um recurso, e atendendo a todas as especificidades do incidente de
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=