TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
547 acórdão n.º 161/21 A verdade é que, estando cumprido o duplo grau de jurisdição, há fundamentos razoáveis para limitar a possi- bilidade de um triplo grau de jurisdição, mediante a atribuição de um direito de recorrer de decisões condenatórias. Tais fundamentos são a intenção de limitar em termos razoáveis o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, evi- tando a sua eventual paralização, e a circunstância de os crimes em causa terem uma gravidade não acentuada. Esta segunda justificação, aliás, explica a diferença entre as alíneas e) e f ) do n.º 1 do artigo 400.º do Código de Processo Penal; com efeito, se ao crime em causa for aplicável pena de prisão “não superior a oito anos” [alínea f ) ] – não sendo hipótese abrangida pela alínea e) , naturalmente –, só não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão condenatório proferido pela Relação se este confirmar “decisão de 1.ª instância”. Não se pode, assim, considerar infringido o n.º 1 do artigo 32.º da Constituição pela norma que constitui o objeto do presente recurso, já que a apreciação do caso por dois tribunais de grau distinto tutela de forma suficiente as garantias de defesa constitucionalmente consagradas.» Esse entendimento foi reafirmado, no domínio da mesma redação da alínea e) do n.º 1 do artigo 400.º do CPP, perante norma tendo como elemento a revogação de decisão absolutória e imposição de pena de multa, orientação jurisprudencial reiterada no Acórdão n.º 487/06 e, bem assim, nos Acórdãos n. os 255/05, 682/06, 353/10 e 778/13, que a consideraram inteiramente transponível para os casos em que a relação, revogando a decisão absolutória proferida em 1.ª instância, condena o arguido numa pena de substituição da prisão, designadamente numa pena de substituição de estrutura suspensiva, como é o caso da pena de suspensão de execução da prisão. 11. Em defesa do entendimento oposto, os recorrentes argumentam com a jurisprudência formada pelo Acórdão n.º 429/16. Porém, esse aresto, assim como o Acórdão n.º 595/18 (em sede de generalização), pronunciaram-se sobre dimensão normativa distinta, que tem em comum com aquela aqui em discussão a reversão de decisão absolutória, mas que se afasta do sentido normativo sindicado no presente recurso na imposição de uma pena privativa da liberdade, o que aqui não sucede. Em ambos os arestos, mas especial- mente no último proferido, que emitiu declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral, os juízos de ponderação da proporcionalidade da restrição ao direito ao recurso, no quadro das garantias de defesa asseguradas ao arguido, são estritamente indexadas ao valor axiológico-normativo do direito à liberdade, vincando-se as diferenças, no âmbito problemático em análise, entre as consequências jurídicas implicadas na condenação em recurso, com reversão de decisão absolutória, em pena de prisão ou em pena não privativa de liberdade. Esse distinguo encontra expressão em vários segmentos do Acórdão n.º 595/18, afastando-se da visão mais extensa do alcance da garantia do recurso contida na parte final do n.º 1 do artigo 32.º da Constitui- ção, que tenha como constitucionalmente proibida toda e qualquer restrição do acesso do arguido a um terceiro grau de jurisdição nos casos de primeira condenação em recurso, como invariavelmente sucede com a reversão de decisão absolutória (total ou parcial). Diz-se no referido aresto, relativamente ao argumento da inovação implicado na prolação de primeira decisão condenatória pelo tribunal de recurso relativamente à determinação da espécie e medida da pena: «22. Levado ao limite, este argumento poderia parecer impor a garantia da recorribilidade de qualquer decisão condenatória que se apresente como inovatória, independentemente da pena concretamente aplicada. Poder-se-ia argumentar que, num caso de condenação que reverte uma absolvição de 1.ª instância, o direito ao recurso é tão afetado com a aplicação de pena de multa como com a aplicação da pena máxima de 25 anos de prisão. Um tal raciocínio ad consequentiam (...) baseia-se, no entanto, num paralogismo inaceitável desde logo porque a restrição do direito ao recurso em ambos os casos não é equivalente. Existe, com efeito, uma diferença qualitativa entre a pena de prisão e todas as outras penas que deve ser relevada na verificação do respeito pelo direito ao recurso, enquanto garantia de defesa do arguido. Ignorar as particula- ridades da pena de prisão efetiva, é desprezar a correlação existente entre o direito fundamental ao recurso e os
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