TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

541 acórdão n.º 161/21 q) O direito ao recurso não se encontra suficientemente protegido pela norma em análise, porquanto habilita a imediata execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado, sem que elementos decisivos da condenação que o priva da liberdade possam ser sindicados, deixando-os à margem de qualquer impugna- ção ou mesmo alheados do simples exercício basilar do contraditório. r) O artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, quando interpretado no sentido conducente à inadmissibilidade de recurso nas situações de condenação em segunda instância em pena de prisão suspensa na sua execução mediante o pagamento de uma prestação pecuniária fixada sem contraditório do arguido, depois de expe- rimentar sentido dispositivo absolutório em primeira instância, representa, portanto, uma concretização insuficiente das garantias de defesa do arguido consubstanciadas no direito ao recurso, conotada com a ablação total desse direito do arguido, em violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP, por não lhe permitir sindicar a condenação proferida na Relação, depois de lhe ser naturalmente vedado, por falta de interesse ou legitimidade, recorrer da decisão de primeira instância. s) Ao permitir-se a imediata execução da pena de prisão em que o arguido foi condenado, sem que elementos decisivos da condenação que o priva da liberdade possam ser sindicados, como é evidente não está a ser garantido o seu direito de defesa, primordialmente, o direito ao recurso, assistindo-se à, vincada, violação do n.º 1 do artigo 32.º da CRP, uma vez que lhe é completamente vedada a possibilidade de reagir contra a condenação proferida na Relação. t) A prolação do douto Acórdão n.º 31/20, proferido no Processo n.º 258/19, por esta Digníssima 2.ª Secção do Tribunal Constitucional, veio conceder um novo fulgor à interpretação normativa aqui em causa ao “Julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação dos artigos 432.º, n.º 1, alínea b) e 400.º, n.º 1, alínea e) , ambos do Código de Processo Penal, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual não é admissível recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, de acórdãos proferidos em recurso, pelas Relações, que condenem os arguidos em pena de multa, ainda que as decisões recorridas da 1.ª Instância sejam absolutórias, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da Constituição.” u) O referido douto acórdão, usufruindo do argumento de maioria de razão, congrega um contributo insofis- mável para o juízo de inconstitucionalidade que se entende deve ser sufragado na situação sub judice , como indelével concretização da tutela jurisdicional efetiva dos direitos fundamentais do arguido. v) Tendo o referenciado aresto como premissa fundacional, é inarredável a conclusão da inconstitucionalidade do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, por violação do direito ao recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP, conjugado com o artigo 18.º, n.º 2, também da CRP, na presença do recorte normativo que ab initio neste recurso se isolou. w) Ou seja: o recorrente reputa inconstitucional a norma resultante do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP (conjugado com o artigo 432.º, n.º 1, alínea b) , também do CPP), na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, na interpretação segundo a qual não é admissível recurso, para o Supremo Tribunal de Justiça, de acórdãos proferidos em recurso, pelas Relações, que condenem os arguidos em pena de prisão suspensa na execução mediante condição de pagamento aprazado de uma determinada prestação pecuniária. Essa interpretação restritiva do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, à luz dos ditames herme- nêuticos perfilados nos artigos 9.º e 10.º do Código Civil, é materialmente inconstitucional, traduzindo-se numa restrição desnecessária, desproporcional e desadequada dos direitos fundamentais do arguido e da tutela efetiva dos mesmos. x) Em síntese, e sem se prescindir do disposto no artigo 79.º-C da LTC (que estipula o princípio iura novit curia ), pretende-se ver apreciada a constitucionalidade material: · da norma constante do artigo 400.º, n.º 1, alínea e) , do CPP, quando interpretada no sentido de esta- belecer a irrecorribilidade para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal da Relação que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em primeira instância, em recurso condena o arguido em pena de prisão não superior a cinco anos, suspensa na sua execução mas condicionada ao pagamento de uma quantia dentro de determinado prazo, ainda que a decisão recorrida da primeira Instância seja absolutória, por violação do artigo 32.º, n.º 1, da CRP;

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