TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

515 acórdão n.º 147/21 Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional I - Relatório 1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo de Instrução Criminal de Lisboa, em que é recorrente o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do despacho daquele tribunal, de 8 de abril de 2020. 2. No âmbito de inquérito criminal, que corre os seus termos contra desconhecidos e que não tem argui- dos constituídos, o Ministério Público apresentou ao Juiz de Instrução Criminal um conjunto de suportes digitais contendo a gravação de escutas telefónicas em curso, com vista à respetiva validação, nos termos do artigo 188.º, n.º 4, do Código de Processo Penal. Nessa ocasião, requereu que fosse determinada a destruição imediata dos suportes técnicos relativos a determinadas sessões de conversação, devidamente identificadas, por dizerem respeito a terceiros não suspeitos, nos termos do artigo 188.º, n.º 6, alínea a) , do Código de Processo Penal. Sobre este requerimento recaiu o despacho de indeferimento, onde se pode ler o seguinte: «II – Promoção de fls. 1128, ponto II, primeiro parágrafo: Indefiro o promovido, porquanto, ainda que as gravações indicadas contenham conversações entre terceiros não suspeitos, é nosso entendimento, não obstante o teor do n.º 6 do art. 188.º, não dever ser ordenada a destrui- ção imediata dos suportes técnicos relativos a conversações manifestamente estranhas ao objeto do processo, sem que o arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua relevância. A defesa tem o direito constitucional de, findo o período de segredo interno, conhecer a totalidade das escutas telefónicas realizadas no processo, só assim assistindo ao arguido a possibilidade de contrariar a interpretação que o Ministério Público e o juiz fizeram das conversações gravadas, só assim o arguido podendo verdadeiramente contraditar a prova da acusação. A destruição imediata de elementos de prova obtidos mediante interceção de telecomunicações, que o órgão de polícia criminal e o Ministério Público conheceram e que são considerados irrelevantes pelo juiz de instrução, sem que o arguido deles tenha conhecimento e sem que se possa pronunciar sobre a sua relevância, viola as garantias de defesa previstas no art. 32.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, pelo que ordeno a sua manutenção, devendo ser guardadas em envelopes lacrados e à ordem do Tribunal.» 3. Desta decisão foi interposto o presente recurso obrigatório, para apreciação da constitucionalidade da norma do artigo 188.º, n.º 6, alínea a) , do Código de Processo Penal, na redação dada pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto. O Ministério Público produziu alegações, formulando, a final, as seguintes conclusões: «4. Em conclusão: 4.1. O regime jurídico relativo aos meios de obtenção de prova e valoração dos elementos de prova daí decor- rentes, principalmente no que concerne aos meios considerados mais invasivos como a interceção e a gravação de conversações ou comunicações telefónicas reveste-se, no ordenamento processual penal português, de especial rigor e cuidado, atendendo aos direitos fundamentais que aí podem conflituar. 4.2. Estes meios só são admissíveis na justa medida da sua necessidade para a investigação criminal, enquanto instrumento dos fins da ação penal, devendo obedecer ao princípio da proporcionalidade a contração de direitos fundamentais eventualmente atingidos, no respeito por uma verdadeira concordância de direitos.

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