TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

511 acórdão n.º 145/21 delimitada de modo a não comprometer a faculdade de condução de categorias específicas de veículos, para as quais o condenado se encontre igualmente habilitado. É certo que a atribuição à pena acessória de proibição de condução de um conteúdo fixo, não modelável em função das necessidades concretas de cada agente, poderá originar, em determinadas situações, uma afe- tação, em maior ou menos grau, da liberdade de exercício da profissão. É o que tenderá a suceder não apenas na hipótese de o condenado exercer a profissão de motorista – esta será só a mais evidente –, como ainda com a generalidade das atividades profissionais itinerantes cuja efetiva possibilidade de desempenho pressuponha a conservação do nível de mobilidade só proporcionado pelo ato de condução. Simplesmente, impor nestes casos à pena acessória a contração necessária (ou na extensão necessária) a permitir a acomodação, durante o período temporal correspondente à sua medida, dos pressupostos necessá- rios ao exercício sem interrupções das tarefas que integram a profissão livremente escolhida pelo condenado é resultado que se não retira, nem dos princípios da necessidade e da proporcionalidade das sanções penais – que, como vimos, apenas permitem censurar sanções criminais manifestamente arbitrárias ou excessivas -, nem, em geral, dos limites a que, por força do disposto no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, se encontram sujeitas quaisquer leis restritivas de direitos, liberdades e garantias. Ainda que por referência ao crime de condução de veículo em estado de embriaguez, tal conclusão foi expressa no Acórdão n.º 440/02 nos termos que se seguem: «Mas, ainda que fosse demostrada aquela factualidade (ou seja, que o recorrente inelutavelmente necessitava de conduzir veículos automóveis para o exercício da sua profissão), adianta-se desde já que a objetiva «constrição» que porventura resultaria da aplicação da medida sancionatória em causa se apresenta, de um ponto de vista cons- titucional, como justificada. Efetivamente, uma tal justificação resulta das circunstâncias de a sanção de inibição temporária da faculdade de conduzir se apresentar como um meio de salvaguarda de outros interesses constitucionalmente protegidos, nomea- damente, quer, por um lado, na perspetiva do arguido recorrente a quem é imposta e destinada a pena aplicada, quer, por outro lado, na perspetiva da sociedade – a quem, reflexamente, se dirige também aquela medida, – na medida em que se visa proteger essa sociedade e, simultaneamente, compensá-la do risco a que os seus membros foram sujeitos com a prática de uma condução sob o efeito do álcool.» Tal juízo merece ser aqui reafirmado. Tendo em conta os elevados índices de sinistralidade rodoviária registados em território nacional, o risco para a vida e para a integridade física de condutores, passageiros e peões que lhes está inelutavelmente associado e o lugar de relevo que a condução sob efeito do álcool ocupa na explicação de ambos – de acordo com os dados recolhidos pela Prevenção Rodoviária Portuguesa, em 2015 foram registadas 142 vítimas mortais de acidentes de viação sob a influência do álcool ( https://prp.pt/prevencao-rodoviaria/fatores-de-risco/alcool/ ) -, não existem dúvidas de que, ao incluir no âmbito das sanções aplicáveis ao crime de recusa de submissão de condutor às provas legalmente estabelecidas para deteção de condução de veículo sob efeito de álcool e outras substâncias proibidas uma pena acessória integrada pela proibição temporária da faculdade de conduzir de veículos motori- zados de qualquer categoria, o legislador não só não desvirtuou a relação de proporcionalidade que deve existir entre a gravidade da infração e a gravidade da punição que abstratamente lhe corresponde, como não consagrou medida que se possa dizer inidónea ou desnecessária para enfrentar e inverter aquela realidade. É certo que, em todos os casos em que o exercício da atividade profissional escolhida pelo condenado pressuponha a sua habilitação para conduzir veículos motorizados de uma categoria específica, a impossibili- dade de excluir essa categoria do âmbito da proibição de condução originará uma afetação temporária – isto é, pelo tempo correspondente ao período fixado à proibição – da liberdade de exercício da profissão. Simplesmente, não se pode dizer que as vantagens que a comunidade retira da medida estadual em causa sejam desproporcionais às desvantagens com que tal medida atinge o «membro da comunidade jurídica» que a deverá suportar – no caso, o condenado pela prática do crime de desobediência por recusa de submissão

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