TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

492 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL determinável em face dos específicos contornos de cada processo, estando fora das hipóteses normativas típicas e, portanto, da competência deste Tribunal. Cabe, pois, concluir, que o ato de constituição de arguido em si mesmo e abstratamente considerado não comporta uma verdadeira restrição a direitos fundamentais, em termos tais que se possa afirmar dever a regularidade de tal ato, sempre e necessariamente, considerar-se dentro do âmbito de competência do Juiz de Instrução Criminal para, durante o inquérito, dela conhecer. Não se tem, assim, por violada, nem a reserva constitucional de função jurisdicional, nem as garantias de defesa do arguido em processo penal (designada- mente, o disposto no artigo 32.º, n.º 4, da CRP), nem mesmo o direito fundamental de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva (artigo 20.º da CRP). 18. Cabe, agora, colocar questão idêntica à anterior, mas respeitante, especificamente, à imposição da medida de coação de termo de identidade e residência (TIR), consequência necessária e obrigatória do ato de constituição de arguido, nos termos do artigo 196.º do CPP. 18.1. A este propósito, sustenta o recorrente A. que o TIR “implica uma restrição de direitos funda- mentais, mormente, a liberdade de deslocação, a que se pode acrescentar a privacidade”, já que a “decisão de deslocação ou de mudança de residência fica, desde logo, condicionada pelo facto de ter que se comunicar para onde se vai ou onde se está”. Acrescenta ainda que o “dever de comunicação interfere no processo deci- sório do arguido, de forma dissuasora ou inibidora e, por essa razão, o arguido não é totalmente livre na sua decisão sobre se, quando e como deslocar-se, pelo que o arguido não pode exercer plenamente os seus direitos à liberdade e de deslocação, constitucionalmente protegidos”. Na mesma linha se pronuncia o recorrente B., sustentando que ainda que seja verdade, como se afirma na decisão recorrida, que o TIR não impede o direito de deslocação “ninguém poderá negar que o condi- ciona, uma vez que obriga o arguido, quando a ausência for superior a 5 dias, a partilhar com as autoridades o local para onde vai e a forma como pode ser contactado, o que, ademais em relação a períodos tão curtos, pode constranger o arguido, levando-o a adoptar uma conduta diferente daquela que teria se pudesse livre- mente circular sem ter que dar satisfação a ninguém”. Acresce ainda, acrescenta o recorrente, que o “TIR pode manter-se durante anos, condicionando a liberdade de opção do arguido quanto às deslocações que quer fazer, (...) o que, atentas as repercussões no direito à deslocação do arguido (e, nessa medida, do seu direito à liberdade), há de poder ser sindicado judicialmente”. Por seu turno, o Ministério Público alega que os constrangimentos potencialmente resultantes da impo- sição do TIR “embora relacionados com uma ampla e não jurídica concepção do ideal de liberdade absoluta, não constituem verdadeiras restrições, limitações ou sequer compressões dos direitos fundamentais previstos nos artigos 27.º ou 44.º da Constituição da República Portuguesa, uma vez que não contendem com qual- quer das faculdades integrantes dos direitos de liberdade constitucionalmente consagrados e que corporizam os valores cruciais protegidos por tais consagrações”. Mais ainda, explica o recorrido, a “sujeição da decisão de aplicação da medida de prestação de termo de identidade e residência à imediata apreciação (ou reapreciação) do Juiz de Instrução Criminal revelar-se-ia, pelo contrário, indubitavelmente violadora dos princípios do acusatório e da autonomia do Ministério Público”. 18.2. O ato de constituição de arguido e a imposição do TIR estão umbilicalmente ligados. Efetiva- mente, esta imposição a todo aquele que for constituído é obrigatória, nos termos do artigo 196.º, n.º 1, do CPP. A pessoa sujeita a TIR deve indicar a sua residência, o local de trabalho ou outro domicílio à sua escolha, para efeitos de notificação mediante via postal simples, e fica obrigada a comparecer perante a auto- ridade competente ou a manter-se à sua disposição sempre que a lei o obrigar ou para tal for devidamente notificado; bem como a não mudar de residência nem dela se ausentar por mais de cinco dias sem comu- nicar a nova residência ou o lugar onde possa ser encontrado [artigo 196.º, n.º 2 e n.º 3, alíneas a) e b) , do Código de Processo Penal]. A finalidade destas exigências compreende-se: para que o processo possa seguir o

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