TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
487 acórdão n.º 121/21 inconstitucionalidade da limitação de competência do Juiz de Instrução Criminal para, durante o inquérito, controlar atos praticados pelo Ministério Público, se estes forem restritivos de direitos fundamentais. Aliás, de acordo com esta posição, o próprio CPP atribui ao Juiz de Instrução Criminal competência para a tomada de decisões sobre atos processuais praticados pelo Ministério Público ou por um órgão de polí- cia criminal que se situam fora dos casos previstos nos artigos 268.º e 269.º do CPP; este facto demonstraria que o papel daquele Juiz no quadro do processo penal português vai bem além das fronteiras estabelecidas por tais normas, sendo decisiva, apenas, a circunstância de se estar perante um ato que afete direitos funda- mentais, caso no qual sempre estará legitimada a intervenção do Juiz de Instrução Criminal. Nas palavras de J. Figueiredo Dias e Nuno Brandão “o regime legal engloba, desta forma, três categorias de atos do juiz de instrução no inquérito, que se diferenciam em função do envolvimento do juiz na produção dos atos de inquérito e no controlo da projeção dos seus efeitos e do momento – anterior, contemporâneo ou posterior à sua realização – em que exerce o seu poder jurisdicional: os atos a praticar pelo juiz de instrução (art. 268.º do CPP); os atos a ordenar ou autorizar pelo juiz de instrução (art. 269.º do CPP); e os atos de controlo de atos já praticados por outros sujeitos ou participantes processuais” (cfr. J. Figueiredo Dias e Nuno Brandão, “O controlo pelo juiz de instrução das invalidades e proibições de prova durante a fase de inquérito”, in J. Lobo Moutinho et al. ( orgs.), in Homenagem ao Professor Doutor Germano Marques da Silva, II, 2020, p. 1160). 15.2. Sobre a questão da necessidade de intervenção de Juiz quando se trate da prática de atos lesivos de direitos fundamentais, no quadro do processo penal, a posição deste Tribunal é clara, desde o Acórdão n.º 7/87, que acima parcialmente se transcreveu: “a intervenção do juiz (...) justifica-se “para salvaguardar a liberdade e a segurança dos cidadãos no decurso do processo-crime e para garantir que a prova canalizada para o processo foi obtida com respeito pelos direitos fundamentais”. A exigência de intervenção judicial no inquérito em relação a atos que afetem direitos fundamentais institui-se, pois, como pilar da arquitetura sistémica que se foi construindo para o processo penal português. Na doutrina, esta posição ecoa nas palavras de Figueiredo Dias, segundo o qual os “atos processuais singulares que, na sua pura objetividade externa, se traduzem a ataques a direitos, liberdades e garantias das pessoas constitucionalmente protegidos” devem inscrever-se na competência do Juiz de Instrução Criminal durante o inquérito (cfr. J. Figueiredo Dias, “Sobre os sujeitos processuais no novo Código de Processo Penal”, in O Novo Código de Processo Penal, Almedina, Coimbra, 1988, p. 16, e ainda Nuno Brandão, “O controlo de proibições de prova pelo juiz de instrução no decurso do inquérito”, in Revista Portuguesa de Ciência Criminal , ano 29, n.º 1, janeiro-abril de 2019, p. 50). Todavia, daqui nada decorre sobre que atos concretos, no curso do processo, afetam, potencialmente, direitos fundamentais, com uma intensidade tal que se justifique a intervenção imediata do Juiz de Instrução Criminal. Nesse conjunto contar-se-ão, em quaisquer circunstâncias, os atos previstos nos artigos 268.º e 269.º do CPP, em relação aos quais essa avaliação foi feita, a priori , pelo legislador. Todavia, no caso de se determinar haver um outro ato abstratamente passível de forte lesão dos direitos fundamentais, o problema de constitucionalidade vê os seus contornos ligeiramente alterados, consoante a tese, de entre as acima des- critas, que se entenda sufragar. Se nos inclinarmos no sentido da primeira tese, o Juiz de Instrução Criminal não pode intervir, durante o inquérito, fora dos casos taxativamente previstos nos artigos 268.º e 269.º do CPP. Contudo, tendo como ponto de partida a posição do Tribunal Constitucional, afigura-se que, sendo praticados, no processo, atos restritivos de direitos fundamentais não contidos naquele catálogo, será obviamente inconstitucional a even- tual limitação de competência do Juiz de Instrução Criminal. Se, pelo contrário, se entender dever proceder a segunda tese que acima se apresentou, admitir-se-á que o Juiz de Instrução Criminal possa intervir em todos os casos em que se demonstre haver afetação grave de direitos fundamentais, em virtude de atos praticados durante o inquérito. Esta tese é, pois, a mais consentâ- nea com a posição deste Tribunal em matéria de recurso de atos lesivos de direitos fundamentais.
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