TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
450 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL comprometer, em certas circunstâncias, o exercício, em condições de liberdade plena, de direitos fundamentais, para aqueles deveres mais notoriamente lesivos de direitos fundamentais a lei já prevê a intervenção obrigatória de um juiz; não o fez quanto ao ato de constituição de arguido, e não parece que a Constituição imponha o contrário, afigurando-se razoável e constitucionalmente aceitável que, em regra, o controlo pelo JIC da regularidade do ato de constituição de arguido – que não é, naturalmente, imune, a revisão jurisdicional – se faça, na fase de instrução e não durante o inquérito, o que não invalida que possam existir, num caso concreto, questões de direitos funda- mentais relacionadas com – mas não causadas pela – constituição de arguido que possam justificar apelo imediato para o JIC. XII – O ato de constituição de arguido em si mesmo e abstratamente considerado não comporta uma verda- deira restrição a direitos fundamentais, em termos tais que se possa afirmar dever a regularidade de tal ato, sempre e necessariamente, considerar-se dentro do âmbito de competência do JIC para, durante o inquérito, dela conhecer, não se tendo por violada, nem a reserva constitucional de função jurisdi- cional, nem as garantias de defesa do arguido em processo penal, nem mesmo o direito fundamental de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva. XIII – Quanto, especificamente, à imposição da medida de coação de TIR – consequência necessária e obri- gatória do ato de constituição de arguido, nos termos do artigo 196.º do CPP – compreende-se a finalidade das exigências que dele decorrem: para que o processo possa seguir o seu curso normal, e também para que possam ser respeitados todos os direitos do arguido, designadamente no que respeita ao princípio do contraditório, é imperioso que as autoridades judiciárias possam localizá-lo; o TIR não impede, no plano dos factos, quaisquer deslocações ou mudanças de domicílio, apenas exigindo a sua comunicação às autoridades; a imposição de termo de identidade e residência, abstratamente considerada, não comporta uma verdadeira restrição a direitos fundamentais, em termos tais que se possa afirmar que a Constituição imponha que a fiscalização da sua legalidade deve, sempre e neces- sariamente, considerar-se dentro do âmbito de competência do JIC para, durante o inquérito, dela conhecer, pelo que não se tem por violada, nem a reserva constitucional de função jurisdicional, nem as garantias de defesa do arguido em processo penal, nem mesmo o direito fundamental de acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva. XIV– Não existe fundamento bastante para julgar inconstitucional a norma questionada, nos termos da qual está subtraída ao JIC a competência para conhecer das invalidades processuais dos atos de constituição de arguido e aplicação de TIR, praticados pelo Ministério Público; tendo em consi- deração a arquitetura do sistema processual penal português, o lugar constitucional do Ministério Público e o alcance da reserva constitucionalmente garantida de função jurisdicional, a intervenção do JIC durante o inquérito, só é imposta pela Lei Fundamental em relação aos atos lesivos de direi- tos fundamentais; vários desses atos foram, a priori , listados pelo legislador, exigindo-se que sejam praticados pelo Juiz ou por ele ordenados ou autorizados; porém, o que está aqui verdadeiramente em causa é saber se os atos de constituição de arguido e consequente imposição de TIR serão, em abstrato, suscetíveis de uma afetação de direitos fundamentais que configure uma restrição mere- cedora da intervenção imediata, em qualquer caso, do JIC; há fundadas razões para considerar que assim não sucede, pelo que resta concluir no sentido da não inconstitucionalidade da norma objeto do presente recurso.
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