TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
443 acórdão n.º 115/21 sacrifício imposto ao senhorio, cumprindo sublinhar o reduzido impacto na esfera jurídica do proprietário/ locador com a «espera» da decisão final do procedimento de reconhecimento, sendo a mesma justificada pelos interesses públicos tutelados pelo reconhecimento. Isto, já que, vindo a ser reconhecido o interesse histórico e cultural ou social local do estabelecimento ou entidade – e sendo o ato de reconhecimento diri- gido a um conjunto de características associadas à atividade do estabelecimento ou entidade concretamente desenvolvida e relacionada com o próprio espaço locado, sempre essas características se reportam a elementos pretéritos e duradouros, em qualquer caso pré-existentes ao ato de reconhecimento – afigura-se justificada a compressão do exercício da faculdade de oposição à renovação do contrato no momento em que alega- damente se constitui a expetativa de ver cessado o arrendamento, isto é, no momento do respetivo termo, pois os valores que vierem a ser supervenientemente reconhecidos já existem nesse momento. Tenha-se em conta o já referido elevado impacto social negativo, porventura irreversível, da cessação do arrendamento na possibilidade de aqueles valores virem a ser formalmente reconhecidos, como ocorreu in casu . Por outro lado, caso a distinção do estabelecimento ( in casu , como «Loja com História») não viesse a ser reconhecida pelo município, o efeito da medida legislativa sindicada esgotar-se-ia naquele tempo de espera, não subsistindo razões na lei para impedir, nesse caso, o exercício com sucesso da faculdade de oposição à renovação do arrendamento celebrado. Neste caso, a afetação das expetativas do locador – mínima nos seus efeitos de meramente protelar o exercício da faculdade de oposição à renovação do arrendamento – é ainda cautelarmente justificada, dificilmente se podendo desconsiderar ou afastar liminarmente, antes de terminada a avaliação da situação pelos competentes serviços e órgãos municipais, a hipótese de os interesses invocados pelo locatário requerente do procedimento de tal distinção se mostrarem efetivamente dignos do reconhecimento municipal da valia histórica e cultura ou social local. Em qualquer dos casos, o grau de afetação das expetativas invocadas é substancialmente menor do que o peso dos interesses e valores que se procuram proteger ou, ao menos, acautelar, não decorrendo da aplicação da norma um resultado não tole- rado pela tutela constitucional da confiança dos particulares. Com efeito, a solução de sacrifício adotada pelo critério normativo, fazendo prevalecer sobre a invocada expetativa do senhorio de ver cessado o arrendamento celebrado no termo do prazo, os objetivos de tutela da posição do inquilino, enquadrados e justificados no desiderato mais amplo de acautelar e preservar os bens e valores económicos, culturais e urbanísticos em presença, mostra-se suficientemente justificada por um fundamento objetivo e materialmente fundado, não assumindo tal opção normativa um carácter arbitrário nem se revelando a mesma desadequada, desnecessária ou excessivamente onerosa. 16.4. Conclui-se, assim, que a norma aplicada ao caso – mesmo na específica dimensão normativa con- ferida ao artigo 13.º, n.º 3, da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, por referência à circunstância a que alude o artigo 51.º, n.º 4, alínea d) , do NRAU, que entendeu incluir no regime transitório de proteção da citada Lei n.º 42/2017 as situações em que o ato de reconhecimento da valia histórica e cultural ou social local do estabelecimento ou entidade com atividade no locado vem a ocorrer após a data do termo do contrato de arrendamento em causa, não obstante o procedimento a tal conducente ter sido iniciado anteriormente – não constitui uma ofensa ao princípio da tutela da confiança dos particulares, decorrente do princípio do Estado de direito contido no artigo 2.º da Constituição. 17. No que respeita à alegação, pelo recorrente, da compressão da esfera jurídica do senhorio com base em «conceitos indeterminados e dificilmente determináveis» reportados ao prazo de decisão administra- tiva, aquele não identifica claramente o parâmetro constitucional alegadamente ofendido – e, se reportada tal alegação aos parâmetros constitucionais expressamente invocados (direito de propriedade e proteção da confiança), a conclusão que se alcançou quanto à não desconformidade constitucional do critério normativo aplicado preclude a utilidade da sua apreciação.
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