TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
44 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL em «documento escrito, datado e assinado pelo próprio ou pela pessoa por si designada» (artigo 3.º, n.º 1); segundo, após emissão de parecer fundamentado pelo médico orientador, através da decisão de manter e rei- terar a sua vontade, a qual deve ser registada por escrito, datada e assinada (artigo 4.º, n.º 1) e assinada tam- bém pelo médico orientador (vide o n.º 2 do mesmo preceito); terceiro, após emissão de parecer favorável pelo médico especialista, através da decisão de manter e reiterar a sua vontade, perante o médico orientador (que informa o doente do conteúdo daquele parecer), a qual deve ser registada por escrito, datada e assinada (artigo 5.º, n.º 1); quarto (eventualmente), após emissão de parecer favorável pelo médico especialista em psiquiatria, quando este deva intervir, através da decisão de manter e reiterar a sua vontade, após ser infor- mado pelo médico especialista em psiquiatria, acompanhado do médico orientador, do conteúdo daquele parecer – decisão que se qualifica como “consciente e expressa” –, a qual deve ser registada em documento escrito, datado e assinado (artigo 6.º, n.º 1); quinto, após emissão de parecer favorável da CVA, através da decisão de manter e reiterar a sua vontade, perante o médico orientador (que informa o doente do conteúdo daquele parecer) – decisão que se qualifica como “consciente e expressa” – a qual deve ser registada em docu- mento escrito, datado e assinado (artigo 7.º, n.º 4); sexto, na fase da concretização da decisão do doente, na qual o médico orientador informa e esclarece o doente sobre os métodos disponíveis para praticar a ante- cipação da morte, designadamente a autoadministração de fármacos letais ou a administração pelo médico ou profissional de saúde habilitado para o efeito mas sob supervisão médica – sendo a decisão nesta fase «da responsabilidade exclusiva do doente» e devendo a mesma ser consignada por escrito, datada e assinada (artigo 8.º, n. os 2, 3 e 4); por fim, sétimo, na fase de administração dos fármacos letais, na qual, «imediata- mente antes de se iniciar a administração ou a autoadministração» de tais fármacos, o doente deve confirmar perante o médico orientador se mantém a vontade de antecipar a sua morte – aqui já não por escrito, mas na presença de uma ou mais testemunhas, devidamente identificadas no RCE (artigo 9.º, n.º 3). Esta exigência de comunicação ao médico orientador – e, bem assim, de documentação num registo de natureza pública como o RCE – da vontade de manter a decisão inicial de antecipar a própria morte com- prova a interação necessária do interessado com os terceiros que intervêm, sempre numa base em que a respe- tiva consciência é salvaguardada por via do direito à objeção de consciência (cfr. o artigo 20.º), ativamente na antecipação da morte e com o próprio Estado. Este, por intermédio da CVA e da IGAS, assume uma função de garante de que todas e cada uma das condições previstas no artigo 2.º, n.º 1, do Decreto é respeitada, desde a formulação do pedido inicial até à prática do ato de antecipação da morte. Isto, naturalmente, sem prejuízo do Estado também poder desempenhar o papel de prestador de tal serviço no quadro do Serviço Nacional de Saúde, conforme previsto no artigo 12.º, n.º 2. 20. Numa tentativa de síntese expressiva, o Decreto n.º 109/XIV, através da projeção densificadora consequencial da realidade definida no respetivo artigo 2.º, n.º 1, compreendido este no contexto normativo completo anteriormente descrito, cria e enquadra – legaliza, para usar o conceito que enquadrou o debate público travado a este respeito –, organiza socialmente (para usar uma expressão de Gustavo Zagrebelsky – vide infra ), a prática da eutanásia e do suicídio assistido. Correspondendo qualquer das situações à cau- sação da morte a pedido do próprio, distinguem-se, como referido, pelo domínio sobre o ato que de forma imediata e irreversível produz a morte (cfr. supra o n.º 17, in fine ). Esta distinção materializa-se, no percurso conducente à morte estabelecido no Decreto n.º 109/XIV, no artigo 8.º, concretamente no seu n.º 2, que assim dispõe: «Artigo 8.º Concretização da decisão do doente 1 – Mediante parecer favorável da CVA, o médico orientador, de acordo com a vontade do doente, combina o dia, hora, local e método a utilizar para a antecipação da morte.
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