TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

437 acórdão n.º 115/21 está apenas vinculado a acautelar a confiança que inspirou nos cidadãos. Está também vinculado a inspirar essa confiança, o mesmo é dizer, a criar as condições possíveis e indispensáveis para que estes possam planear as suas vidas e realizar investimentos em segurança. Trata-se aqui da vertente prospetiva da segurança: a pre- visibilidade do comportamento estadual e a consequente determinabilidade das consequências jurídicas das decisões dos particulares». O controlo jurisprudencial das leis «novas» tem seguido uma metódica própria e reiterada, tal como assinalado no recente Acórdão n.º 477/20: «8. O princípio da proteção da confiança diz respeito à tutela das expectativas dos destinatários dos atos da autoridade pública. O Acórdão n.º 128/09, o  leading case na matéria, densificou-o do seguinte modo, em estreita articulação com a jurisprudência constitucional anterior: «No Acórdão n.º 287/90, de 30 de outubro, o Tribunal estabeleceu já os limites do princípio da proteção da confiança na ponderação da eventual inconstitucionalidade de normas dotadas de «retroatividade inautên- tica, retrospetiva». Neste caso, à semelhança do que sucede agora, tratava-se da aplicação de uma lei nova a fac- tos novos havendo, todavia, um contexto anterior à ocorrência do facto que criava, eventualmente, expectativas jurídicas. Foi neste aresto ainda que o Tribunal procedeu à distinção entre o tratamento que deveria ser dado aos casos de «retroatividade autêntica» e o tratamento a conferir aos casos de «retroatividade inautêntica» que seriam, disse-se, tutelados apenas à luz do princípio da confiança enquanto decorrência do princípio do Estado de direito consagrado no artigo 2.º da Constituição. De acordo com esta jurisprudência sobre o princípio da segurança jurídica na vertente material da con- fiança, para que esta última seja tutelada é necessário que se reúnam dois pressupostos essenciais: a) a afetação de expectativas, em sentido desfavorável, será inadmissível, quando constitua uma mutação da ordem jurídica com que, razoavelmente, os destinatários das normas dela constantes não possam contar; e ainda b) quando não for ditada pela necessidade de salvaguardar direitos ou interesses constitucionalmente protegidos que devam considerar-se prevalecentes (deve recorrer-se, aqui, ao princípio da proporciona- lidade, explicitamente consagrado, a propósito dos direitos, liberdades e garantias, no n.º 2 do artigo 18.º da Constituição). Os dois critérios enunciados (e que são igualmente expressos noutra jurisprudência do Tribunal) são, no fundo, reconduzíveis a quatro diferentes requisitos ou “testes”. Para que para haja lugar à tutela jurídico-consti- tucional da «confiança» é necessário, em primeiro lugar, que o Estado (mormente o legislador) tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos privados «expectativas» de continuidade; depois, devem tais expectativas ser legítimas, justificadas e fundadas em boas razões; em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de continuidade do «comportamento» estadual; por último, é ainda neces- sário que não ocorram razões de interesse público que justifiquem, em ponderação, a não continuidade do comportamento que gerou a situação de expectativa. Este princípio postula, pois, uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na estabili- dade da ordem jurídica e na constância da atuação do Estado. Todavia, a confiança, aqui, não é uma confiança qualquer: se ela não reunir os quatro requisitos que acima ficaram formulados a Constituição não lhe atribui proteção.» O controlo judicial baseado na proteção da confiança tem afinidades importantes, do ponto de vista metódico, com o que diz respeito às leis restritivas de direitos fundamentais. Os três primeiros testes – situação de confiança, legitimidade da confiança e investimento na confiança – consubstanciam as condições necessárias e suficientes da afirmação de um interesse que, por ser digno de tutela constitucional, é relativamente resistente ao legislador. O quarto e último teste consubstancia um juízo de proporcionalidade, nos termos do qual se exige:  (i)  a graduação da

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