TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
433 acórdão n.º 115/21 excessivamente gravosa em face dos interesses prosseguidos – mesmo tendo em conta o alcance da aplicação da norma transitória ínsito no critério normativo aplicado pela decisão recorrida. Tenha-se aqui em conta, ao invés, o possível impacto social negativo da imediata extinção ou caducidade dos arrendamentos em causa, por vontade do senhorio, de que decorreria o fim ou a deslocalização da atividade desenvolvida no locado, com muito grave ou mesmo irreversível prejuízo dos valores patrimoniais, históricos e identitários que jus- tificaram a distinção do próprio estabelecimento ou entidade, sem paralelo no mero condicionamento da faculdade do proprietário de se opor à renovação do contrato de arrendamento por um período adicional de cinco anos, continuando, todavia, a poder dispor e fruir o bem locado, na modalidade de proprietário-loca- dor, cedendo o gozo do bem mediante a perceção de um rendimento periódico e sistemático – a renda. Deste modo, também não se afigura evidente que a norma sindicada afronte o princípio de proibição do excesso ínsito nesta última vertente do princípio da proporcionalidade. Há que concluir, pois, que a norma sindicada nos presentes autos, não viola o princípio da proporcio- nalidade aferido nos termos do artigo 18.º, n.º 2, da Constituição. 14.8.2. No que respeita ao regime material de tutela dos direitos, liberdades e garantias contido no artigo 18.º da Constituição (e dos direitos de natureza análoga, por via do disposto no artigo 17.º), do mesmo resulta ainda a proibição de leis restritivas com efeito retroativo. Isto, tal como expressamente pre- visto no n.º 3 do citado artigo 18.º. A este propósito, o Acórdão n.º 575/14: «O Estado de direito é um estado de segurança jurídica. E a segurança exige que os cidadãos saibam com o que podem contar, sobretudo nas suas relações com os poderes públicos. Saber com o que se pode contar em relação aos atos da função legislativa do Estado é coisa incerta ou vaga, precisamente porque o que é conatural a essa função é a possibilidade, que detém o legislador, de rever ou alterar, de acordo com as diferentes exigências históricas, opções outrora tomadas. Contudo, a possibilidade de alteração dessas opções, se é irrestrita (uma vez cumpridas as demais normas constitucionais que sejam aplicáveis) quando as novas soluções legislativas são pensadas para valer apenas para o futuro, não pode deixar de ter limites sempre que o legislador decide que os efeitos das suas escolhas hão de ter, por alguma forma, certa repercussão sobre o passado. A Constituição não proíbe, em geral, que as novas escolhas legislativas – tomadas pelo legislador ordinário no quadro da sua estrutural habilitação para rever opções antes tomadas por outros legisladores históricos – façam repercutir os seus efeitos sobre o passado. Mas, para além disso, não proíbe nem pode proibir genericamente que o legislador recorra a uma “técnica” de modelação da repercussão dos efeitos das suas escolhas em face da varia- bilidade dos graus de intensidade de que ela pode revestir. Na verdade, a repercussão sobre o passado das novas escolhas legislativas pode assumir uma intensidade forte ou máxima, sempre que a lei nova faça repercutir os seus efeitos sobre factos pretéritos, praticados ao abrigo de lei anterior, redefinindo assim a sua disciplina jurídica. Mas pode também assumir uma intensidade fraca, mínima ou de grau intermédio, sempre que a lei nova, pretendendo embora valer sobre o futuro, redefina a disciplina de relações jurídicas constituídas ao abrigo de um (diverso) Direito anterior. Neste último caso, designa-se este especial grau de repercussão dos efeitos das novas decisões legis- lativas como sendo de «retroatividade fraca, imprópria ou inautêntica», ou ainda, mais simplesmente, de «retros- petividade». Como quer que seja, e não sendo o recurso por parte do legislador a qualquer uma destas formas de retroação da eficácia dos seus atos genericamente proibida pela Constituição, a convocação legislativa de qualquer uma destas técnicas não deixa de colocar problemas constitucionais, face justamente ao imperativo de segurança jurídica que decorre do princípio do Estado de direito. É, com efeito, evidente que a repercussão sobre o passado das novas escolhas legislativas, qualquer que seja a forma ou o grau de que se revista, diminui ou fragiliza a faculdade, que os cidadãos de um Estado de direito devem ter, de poder saber com o que contam, nas relações que estabelecem com os órgãos de poder estadual. Precisamente por isso, a Constituição proibiu expressamente o recurso, por parte do legislador, à retroatividade forte, sempre que a medida legislativa que a ela recorre implicar intervenções gravosas na liberdade e (ou) no património das pessoas,
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