TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021

431 acórdão n.º 115/21 A proteção das «Lojas com História» ilustra de forma exemplar, a confluência dos interesses patrimo- niais e urbanísticos em presença e assim também esta forte implicação dos interesses públicos envolvidos e a necessidade de conjugação e articulação das políticas públicas nestes domínios se revela com evidência no regime normativo de onde deriva a norma agora posta em crise. Neste enquadramento, não pode deixar de ser convocado o artigo 65.º da Constituição, em especial o seu número 4, enquanto concretização das tarefas fundamentais enunciadas na alínea e) do artigo 9.º. Assim, o Acórdão n.º 421/09 deste Tribunal: «O preceito constitucional não pode ser lido fora do contexto em que se insere. E próprio desse contexto é todo o domínio relativo à habitação e urbanismo, domínio esse onde se articulam, enquanto expressão do cumprimento de tarefas fundamentais do Estado (artigo 9.º), políticas públicas tendentes a assegurar o planeamento e a orde- nação do território; a defesa do ambiente e da qualidade de vida; a preservação do património urbano, enquanto parte do património cultural português.». A medida legislativa sindicada, não deixa de corresponder ainda aos interesses públicos protegidos pelo artigo 66.º, n.º 2, alínea e) , da Constituição que, no quadro da consagração do direito ao ambiente e qua- lidade de vida, comete ao Estado a tarefa de, entre outras, «Promover, em colaboração com as autarquias locais, a qualidade ambiental das povoações e da vida urbana, designadamente no plano arquitetónico e da proteção das zonas históricas » (itálicos acrescentados). 14.7. Identificadas as razões de interesse público – em consonância com a Exposição de motivos do Projeto de Lei n.º 155/XIII (1.ª) – , que terão fundado a medida adotada pelo legislador e encontrando as mesmas respaldo na Lei Fundamental, cabe primeiramente ponderar se o peso daquelas razões pode justificar o sacrifício imposto ao proprietário, ao ver protelado o momento de efetivação da faculdade de oposição à renovação do contrato de arrendamento, a qual se mostra vedada nos cinco anos subsequentes, invocando aquele ocorrer uma restrição ilegítima ao seu direito de propriedade. Cabe ainda ponderar se o critério normativo adoptado pelas instâncias e que constitui a «norma do caso» determina um grau de sacrifício dos direitos do proprietário não consentido por um juízo de ponderação informado pelos princípios constitu- cionais também convocados pelo recorrente, como é o caso do princípio da confiança, no quadro do Estado de Direito que nos rege. Deste modo, as respostas às questões de constitucionalidade colocadas nos autos devem ser encontradas no regime material específico das restrições aos direitos, liberdades e garantias consubstanciado no artigo 18.º da Constituição – cuja aplicação ao caso dos autos é permitida por via do disposto no artigo 17.º, ao estender aquela tutela aos direitos fundamentais de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, como se afigura ser o caso da impugnada compressão do direito de propriedade – e, bem assim, no quadro mais vasto do princípio do Estado de direito consagrado no artigo 2.º da Constituição. Num caso como noutro, cumpre determinar em que medida se mostra afetada a esfera jurídica do pro- prietário/locador e avaliar, em ponderação, de que forma é – ou não – constitucionalmente justificada a afe- tação dos direitos e expetativas do proprietário por via da norma em causa, na dimensão normativa aplicada. 14.8. Invocado o desrespeito pelas garantias e limitações à intervenção (restritiva) do legislador enun- ciadas no artigo 18.º da Constituição, por referência à salvaguarda do direito de propriedade do locador, decorrem dos n. os 2 e 3 do preceito constitucional com particular interesse para a situação dos autos sub judice as vertentes da proporcionalidade e da proibição do efeito retroativo. Isto já que o limitado alcance da medida – atingindo temporariamente a liberdade negocial do proprietário que vê apenas protelado por um único período adicional de 5 anos o exercício da faculdade de se opor à renovação do contrato e, assim, à sua caducidade no termo do prazo ( in casu de cinco anos) anteriormente determinado – não tem segu- ramente a virtualidade afetar substancialmente o conteúdo essencial do direito de propriedade do locador (com previsão no artigo 18.º, n.º 3, in fine ), mesmo que se faça corresponder aquela faculdade aos poderes

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