TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
396 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL entende-se, nos termos gerais do artigo 9.º, n.º 3, do Código Civil, reconstituindo o pensamento legislativo a partir das soluções substantivamente mais acertadas, lógicas, coerentes e equilibradas, por fielmente conformes aos princípios essenciais da tutela da confiança, da segurança jurídica e da boa-fé, em vez de abrir a porta a interpre- tações puramente formalistas, oportunísticas e meramente tabelares susceptíveis de ferir o sentido de equilíbrio e de provocar evidente irritabilidade no sistema jurídico, interpretar a expressão “os arrendatários de imóveis que se encontrem na circunstância prevista na alínea d) do n.º 4 do artigo 51.º da referida lei, na redação dada pela presente lei” como abrangendo na sua ratio legis , por um lado, a efetiva existência no locado de um estabelecimento comercial localmente histórico, reconhecido pelo município, por outro, a promoção pelo inquilino do processo administrativo próprio de candidatura a tal distinção dentro do prazo normal e expectável para possibilitar a deli- beração camarária antes do termo do contrato de arrendamento em vigor. Pelo que, concordando-se com a solução perfilhada em 1.ª instância, a presente apelação terá necessariamente que improceder. O que se decide. 3 – Pretensa violação do princípio constitucional da proibição da retroatividade, nos termos do artigo 18.º, n. os 2 e 3, da Constitu[i]ção da República Portuguesa, invocada pelo A. Sustenta o apelante nas suas alegações/conclusões de recurso que: A interpretação do artigo 13.º, n.º 3 da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, conjugado com a alínea d) do n.º 4 do artigo 51.º do NRAU no sentido de fazer retroagir à data de candidatura, os efeitos que a lei prevê para o reconhe- cimento, constituiu uma restrição (ilegítima e desproporcional) dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança na previsibilidade do Direito. Já de si, o art. 13.º, n.º 3 da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, deve ser considerado inconstitucional por cons- tituir uma restrição ilegítima ao direito de propriedade privada (art. 62.º da CRP) e uma norma restritiva proibida à luz do art. 18.º da CRP. Mas ainda que preceito não seja considerado inconstitucional, as restrições que o mesmo estabelece deve- rão limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos e não podem ter efeito retroativo, nem diminuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucio- nais – cfr. n. os 2 e 3 do artigo 18.º da CRP. Sendo, por conseguinte, inconstitucional a interpretação do citado artigo 13.º, n.º 3 da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, em conjugação com a alínea d) do n.º 4 do artigo 51.º NRAU no sentido de abranger no seu escopo estabelecimentos cujo processo de apreciação e qualificação como estabelecimento e entidades de interesse histó- rico e cultural ou social local não esteja concluída. Pois tal configuraria, inequivocamente, uma aplicação retroativa (proibida) do preceito que refere a existência, no locado, de “um estabelecimento ou uma entidade de interesse histórico e cultural ou social local reconhecidos pelo município, nos termos do respetivo regime jurídico”. Acresce que, no caso dos autos, em que se encontra esgotada toda a produção de efeitos contratuais relativa ao arrendamento, mais manifestamente contrária ao disposto no citado artigo 18.º da CRP seria uma interpretação do artigo 13.º da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, em conjugação com a alínea d) do n.º 4 do artigo 51.º do NRAU que abrangesse um estabelecimento ainda não classificado como estabelecimento ou uma entidade de interesse histórico e cultural ou social local quer à data da oposição à renovação deduzida pelo senhorio, quer à data devida pela desocupação. Apreciando: Entendemos não assistir razão ao apelante. O artigo 13.º, n.º 3, da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, com a interpretação, âmbito, sentido e alcance que lhe conferimos supra, não configura uma restrição ilegítima ou desproporcional ao seu direito de propriedade pri- vada (art. 62.º da CRP), não sendo proibida à luz do art. 18.º da Constituição da República Portuguesa. Do mesmo modo, a circunstância de o senhorio haver disposto da possibilidade de se opor à renovação do contrato de arrendamento no termo de prazo de cinco anos acordado com a inquilina, e ter deixado de o poder
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