TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
394 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (abrangendo a ideia de proteção de confiança) pode formular-se do seguinte modo: o indivíduo têm o direito de poder confiar em que aos seus atos ou às decisões públicas incidentes sobre os seus direitos, posições ou relações jurídicas alicerçadas em normas jurídicas vigentes e válidas se ligam os efeitos jurídicos previstos e prescritos no ordenamento jurídico. Apontam-se como suas refracções mais importantes, seguindo o mesmo Autor, as seguintes: (1) relativa- mente a atos normativos, a proibição de normas retroativas restritivas de direitos e interesses juridicamente protegidos; (2) relativamente a atos jurisdicionais, a inalterabilidade do caso julgado; (3) em relação a atos da administração, a tendencial estabilidade dos casos decididos através de atos administrativos constitutivos de direitos. OTribunal Constitucional tem reiteradamente afirmado, em inúmeros acórdãos, que o princípio do Estado de direito democrático (consagrado no artigo 2.º da Constituição) postula “uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas”, razão pela qual “a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiada opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do Estado de direito democrático, terá de ser entendida como não consentida pela lei básica” (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 303/90, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 17.º vol., pág. 65). (...) A expressão “segurança jurídica” é utilizada em vários sentidos para designar um dos fins ou valores do Direito, dos quais podem destacar-se os seguintes (Mario Bigotte Chorão, Polis-Enciclopédia Verbo da Sociedade e do Estado, Vol. V, pág. 646): a) a ordem emanente à existência e funcionamento do sistema jurídico (segu- rança pelo ou através do Direito); b) situação de cognoscibilidade, estabilidade e previsibilidade do Direito, de modo a poder cada um saber aquilo a que deve ater-se na ordem jurídica (segurança do Direito ou certeza do Direito); c) salvaguarda dos cidadãos perante o poder do Estado (segurança perante o Direito).”. Ora, seguindo rigorosa e escrupulosamente tais princípios gerais orientadores e diretamente vinculativos, abso- lutamente essenciais e enformadores do ordenamento jurídico, cumprirá, a nosso ver, interpretar o n.º 3 do artigo 13.º da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, no sentido que se demonstre mais curial, equilibrado e correspondente à vontade do legislador ordinário, tanto quanto seja possível prescrutá-la. Assim sendo, a correta interpretação da expressão “os arrendatários de imóveis que se encontrem na circuns- tância prevista na alínea d) do n.º 4 do artigo 51.º da referida lei, na redação dada pela presente lei” deverá tomar em consideração na sua ratio legis: 1.º – a efetiva e real existência no locado de um estabelecimento comercial com significado histórico local, a reconhecer pelo Município, o qual, antes desse formal reconhecimento, já revestia obviamente tais características objetivas e intrínsecas, facilmente apreensíveis por todos os munícipes e pelo público em geral. Ou seja, do que se trata essencialmente é de reconhecer uma realidade pretérita largamente consolidada no tempo e na história da cidade, de carácter público, pelo menos no plano local; 2.º – a promoção pelo inquilino do processo administrativo próprio com vista à sua candidatura a tal distinção dentro do prazo normal e expectável que possibilite a deliberação camarária antes do termo do contrato de arren- damento em vigor. A atribuição de um direito a um sujeito, por ditame da lei, tem que necessariamente pressupor que se encon- tram inerentemente associados os meios processuais idóneos a torná-lo real e efetivo, sem que o anómalo desenvol- vimento dos meios, só por si, possa tornar inapta e inconsequente a legítima pretensão do beneficiário. Note-se que, nos termos gerais do artigo 128.º do Código do Procedimento Administrativo: “1 – Os procedimentos de iniciativa particular devem ser decididos no prazo de 90 dias, salvo se outro prazo decorrer da lei, podendo o prazo, em circunstâncias excecionais, ser prorrogado pelo responsável pela direção do procedimento, por um ou mais períodos, até ao limite máximo de 90 dias, mediante autorização do órgão competente para a decisão final, quando as duas funções não coincidam no mesmo órgão.
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