TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 110.º Volume \ 2021
385 acórdão n.º 115/21 que os destinatários não pudessem contar com a possibilidade de o novo regime da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, se dirigir aos arrendamentos pretéritos; acresce que, no caso dos autos, a faculdade de oposição à renovação do contrato de arrendamento só veio a ser exercida pelo senhorio após a publi- cação e entrada em vigor do novo regime legal, pelo que não se conclui poder ficar suficientemente demonstrado que a confiança alegadamente defraudada encontra apoio inequívoco no comportamen- to do legislador. XIV– Quanto à alegada lesão da confiança devida não apenas à superveniência do regime de proteção dos estabelecimentos ou entidades com valor histórico e cultural ou social local estabelecido pela Lei n.º 42/2017, de 14 de junho – e dos arrendatários dos locados onde se inserem tais estabelecimentos ou entidades –, mas à específica interpretação normativa conferida pelas instâncias à norma contida no n.º 3 do artigo 13.º, da mesma Lei, no sentido de que aquela proteção (protelamento, por um período adicional de cinco anos, da faculdade de oposição à renovação do contrato de arrendamento pelo senhorio) incluir os estabelecimentos cujo reconhecimento formal vem a ocorrer em data pos- terior à do previsto termo do arrendamento, por facto não imputável ao arrendatário, não obstante o respetivo procedimento ter sido iniciado anteriormente, entende-se que na situação dos presentes autos, a norma sindicada não afronta expetativas solidamente consolidadas do recorrente, de modo a não poder antecipar a solução normativa encontrada pelas instâncias para a resolução do caso em litígio, tendo em conta três ordens de razões. XV – Em primeiro lugar, no momento do início da vigência da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, várias podiam ser as situações em que o termo dos contratos viesse a ocorrer ainda antes da decisão munici- pal dos procedimentos de reconhecimento em curso, os quais, em qualquer caso, só poderiam ter sido iniciados nos termos da regulamentação municipal da circunscrição respetiva – em Lisboa, no que releva para os presentes autos, a abertura de candidaturas apenas é possibilitada por via regulamentar a partir de 15 de maio de 2017; a possível e provável coincidência temporal do exercício da faculdade de oposição à renovação em face do termo previsto dos contratos em vigor e dos procedimentos já em curso (como in casu ) ou iniciados após a entrada em vigor da Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, constitui um elemento relevante para não se poder corroborar a expetativa de o regime de proteção, em qualquer caso e em quaisquer circunstâncias, apenas incluir as situações em que o procedimento de reconhecimento se mostrasse definitivo na data do termo do arrendamento. XVI – Em segundo lugar, o ato de reconhecimento municipal é sempre dirigido a uma situação pretérita e com algum grau de consolidação, atentos os critérios atinentes à atividade desenvolvida no locado e aos valores patrimoniais materiais e imateriais a observar, pela sua própria natureza impossíveis de concretizar se não por via de uma pré-existente e continuada atividade com relevância para a memó- ria, a História e a identidade do espaço urbano em que se integra; para a verificação da presença destes interesses, o exato momento do ato administrativo de reconhecimento não se afigura assumir a rele- vância decisiva que o recorrente lhe parece conferir. XVII–Em terceiro lugar, não pode deixar de ser assinalado um certo paralelismo entre o regime de proteção conferido pela Lei n.º 42/2017, de 14 de junho, e o regime de proteção do património cultural, desde logo incluído na respetiva Lei de Bases, aprovada pela Lei n.º 107/2001, de 7 de junho, por se tratar, num caso como noutro, de regimes de escopo garantístico, que procuram acautelar e preservar os valo- res patrimoniais na eventualidade de ações (ou omissões) danosas para os bens protegidos, assumindo, diversas vezes, uma natureza cautelar.
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